O grito da mulher

mulhergritoEustáquio José – Um Brasil de Fato

O que comemorar? O que festejar? Num mundo machista, sexista, desigual, que homens ainda tratam as mulheres como objeto sexual, propriedades e títulos de posse. Nada a comemorar. Há sim o que lutar.

As estatísticas assombram. Eu darei apenas os dados do Brasil para se ter uma ideia do assombro e da impunidade. Em setembro de 2013 uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) que foi divulgada na Revista Fórum registrou um número de 5,82 femicídios (acostumem-se com essa palavra, pois ela indica o homicídio cometido contra a mulher) para cada 100 mil mulheres no país. Mesmo com a lei Maria da Penha (lei n 11.340/2006) o número assustadoramente aumentou e a violência continuou a crescer – mesmo que a mesma lei n 11.340/2006 tenha sofrido uma série de alterações para torná-la mais eficaz, o caso de denúncias diminuiu justamente porque entre deixar uma lesão corporal e matar os homens femicidas preferem a segunda opção e engrossam a estatística medonha que cerca esse número. Ainda temos os dados que cerca de 15 mulheres morrem por dia por conta de agressões e violência doméstica cometidas por companheiros, maridos, namorados que se apossam da mulher como mercadoria sua numa abusiva relação de exploração. O único tipo de exploração e escravidão social que não parece ter fim nem mesmo com os arroubos iluministas e com as falácias contadas pelo mundo capitalista que se diz cioso do papel social da mulher em tempos de consumo.

Há ainda a segunda violência contra a mulher que é tomar o seu corpo como sendo desfrutável a qualquer momento. Nesse caso eu coloco o link de pesquisa realizada pela Unicamp em casos de violência sexual no Brasil. Mulheres casadas, menores de idade, filhas, irmãs, enteadas e parentes próximas são as principais vítimas de homens que se acham no direito de abusar e usar das mulheres para obter prazer sexual. Crime hediondo e irreparável para a mulher que acontece a torto e a direito e é tratado como menor por uma sociedade hipócrita e preconceituosa. É preferível condenar uma mulher que aborta após ser estuprada do que se ir atrás do estuprador que cometeu essa monstruosidade com ela. Nada mal para a radicalidade dessa hipocrisia brasileira…

Dia 08 de março não é dia de comemorar de acordo com os dados acima, mas é o dia do grito da mulher, da luta, do movimento e da ação. E nunca deixou de ser. Desde os primórdios essa data marca uma reivindicação, uma luta, uma greve geral de mulheres operárias numa fábrica de tecidos em Nova Iorque que exigiam melhores condições de trabalho – visto que desde a Revolução Industrial em idos do Reino Unido, mulheres e crianças eram obrigados a jornadas de mais de 10 horas diárias para poder dar conta da produção e tendo em compensação quase nenhum direito respeitado, além do salário de miséria, todavia a remuneração auxiliou a organização das mulheres que começaram a formar grupos e a lutar unidas sem que precisassem pedir ajuda aos operários homens devido ao preconceito entranhado da época – isso em 08 de março de 1857, portanto em pleno domínio da mentalidade industrial a qual aludimos (conferir mais da história aqui).

Assim o dia 08 de março não é dia de presentes ou data comercial. O dia 08 de março é lembrança de luta e de se quebrar as correntes que prendem ainda hoje a mulher à condição de “segundo sexo” (parafraseando o famoso livro de Simone de Beauvoir). Nisso as estatísticas do começo do post, para o Brasil, indicam que estamos longe de uma melhora. Mas hoje em dia as mulheres lutam com gana e devem lutar pelo seu espaço. Enquanto um homem feminista que sou defendo arduamente o direito de ser todo o tempo defensor da luta das mulheres e que de minhas limitações tento fazer algo que melhore essa situação de uma vez por todas. Entretanto a luta é da mulher e que ela consiga cada vez mais espaço e mais profundidade em sua luta. Que existam cada vez mais grupos feministas sérios Brasil e mundo afora e que as amarras sejam desfeitas para que tenhamos enfim um mundo menos desigual e desonesto.

Eu não darei parabéns esse ano, mas eu me comprometerei a lutar no que me for possível para que a luta da mulher frutifique e floresça, afinal merece e não estão pedindo nada demais a não ser o espaço que já por si só é delas e sempre foi. Portanto vamos à luta e façamos eco ao grito e não abafemos em nada o grito da mulher, o grito das mulheres.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Tato Silva.

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