Um jornal que acusa, em seus editoriais, as redes sociais de serem histéricas e irresponsáveis, foi ontem refém de seu próprio moralismo. Agiu como o Rei do Camarote: “é preciso agregar valor. Tem de ter Instagram, álbum no Facebook”
Por Fábio Malini em Labic
Nenhuma loja depredada no Shoping Vitória. Nenhum registro de qualquer tipo de violência ou crime. Nada. E a Polícia Militar do ES manda os meninos tirarem a camisa e sentarem no chão da Praça de Alimentação do shopping, para simular a estética do cárcere, quando presos são deixados nus expressando o êxito do “Estado de Direito” em arrancá-los a liberdade em nome da santa propriedade. Depois dessa humilhação, registrada no Instagram dos “micro reis dos camarotes”, a PM levou todos eles em fila indiana para, como Tiradentes, terem suas cabeças jogadas ao racismo inacreditável dessa gente cuja cultura se resume à casquinha do Bob’s, jóias da Vivara e à massa vagabunda da Spoletto, feita do trigo da elite capixaba, expropriadora e selvagem, cujo sobrenome é Buaiz.
Mas, em grande parte, o racismo foi potencializado pelas reportagens do jornalismo de Vitorinha. A “abordagem policial” do jornalismo online foi do mesmo nível do que a do Batalhão de Missões Especiais. O jornalismo online local fez o serviço de colocar, para o “respeitável público”, a farsa espetacularizada da PM.
Consumidores de casquinha de Bob’s e jóias da Vivara aplaudem ação da PM dentro do Shopping Vitória. Racismo nosso de cada dia.
As reportagens (http://migre.me/gPx0L) de A Gazeta e de A Tribuna NÃO ESCUTARAM nenhum daqueles jovens que foram humilhados pela PM. Isso porque o jornalismo, cada vez mais, se faz sem rua. A escuta é telefônica ou via email. Contudo, a cobertura online do Gazeta Online se superou na audácia conservadora, praticando a facebookização do jornalismo online, se comportando igual a um dos trolls contidos na caixa de comentário de suas notícias.
A reportagem, preguiçosa, assinada por Jaider Miranda, diz: “durante uma briga, um tiro teria sido disparado”. Teria sido? Foi ou Não? Que raios é esse tempo verbal no jornalismo? Que raios de editora, de nome Andreia Pirajá, é essa que deixou passar essa imprecisão, essa versão da Polícia? Continua a matéria: “a polícia foi chamada ao local para tentar conter um suposto arrastão”. Suposto????? Eu fico me perguntando: o jornalista fez a reportagem de onde? do telefone? Do chat do Facebook? Olhando a sua timeline comovida. Há passagens ainda mais surreais de total falta de clareza e retidão informativa: “Policiais armados entraram no shopping e fizeram várias abordagens”. Quais? Como? Por quê? O que encontraram?
Para coroar esse abordagem jornalística, criada para dar buzz aos trolls, o Gazeta Online cometeu, antes de qualquer checagem dos fatos, um ato de pura covardia. Criou um álbum de fotos no Facebook chamado Confusão no Shopping. Por que isso é covarde? Porque um álbum, desse jeito, sem contexto informativo algum, é apenas upado para que as pessoas compartilhem as imagens com suas “perspectivas”. É o estilo editorial cuja máxima é “o que rolou nas redes sociais”; e cuja mínima social se traduz em : ˜Toma aí as imagens, façam o que vocês quiserem com elas. Linchem quem vocês acharem cool. Bora curtir!”.
O jornal fica omisso, jogando, de novo, para a plateia fascista fazer seus comments livremente. Um jornal que acusa, em seus editoriais, as redes sociais de serem histéricas e irresponsáveis, foi ontem refém de seu próprio moralismo. Agiu como o Rei do Camarote: “é preciso agregar valor. Tem de ter Instagram, álbum no Facebook”. Como um jornal de 70 anos publica imagens, sem NENHUMA informação, numa fanpage com 121 mil curtidas? Que nível de responsabilidade vocês possuem com essa fanpage? Nenhuma?
Um salve – apesar dos pesares – para o repórter Giordany Bossato, de A Tribuna, que foi mais rápido, arrancando a confissão do secretário de segurança de Segurança Pública André “Batia”, que de modo silógico afirmou: “Durante uma abordagem houve um estampido, possivelmente provocado por uma bombinha”. Isso teria sido a causa da correria.
E o funk continua sendo criminalizado tal como o samba era, nos anos 30, na Praça Onze.
Um bombinha. E um espetáculo racista.