Neste Dia das Mães, que tal esterilizar mães de bandidos?

Por Leonardo Sakamoto

Passei, nesta manhã, na frente de um Centro de Detenção Provisória aqui na capital paulista e me lembrei de um texto que já escrevi e pelo qual fui devidamente criticado. Não vou dizer que fui mal compreendido porque seria um misto de arrogância e inocência. Sim, boa parte dos leitores que xingaram a minha progenitora entenderam bem o que quis dizer – o que assusta ainda ainda. Mas gostaria de resgatar o tema neste Dia das Mães como uma dedicatória ao nobre senhor – provavelmente pertencente a algum movimento de limpeza social que ronda São Paulo – que, num comentário em fúria, defendeu que “mãe de bandido deveria ser esterilizada”.

Por trás de quem mata e quem morre, há outras pessoas que sofrem junto. Quando um crime acontece, lembramos primeiro – com toda a razão – da dor de quem perdeu o ente querido nas mãos de uma ação violenta. Mas há duas famílias envolvidas, sendo que a do outro lado, por ter “gerado a causa do sofrimento” nunca é lembrada. Pelo contrário, torna-se responsável. E por mais que nenhum juiz declare pena para a mãe do meliante, ela vai para o inferno com ele.

Quando alguém é preso, geralmente não vai para a cadeia sozinho pagar pelo crime que cometeu. Vão também mães, irmãs, esposas, filhas, avós que, religiosamente, fazem filas nas portas dos centros de detenção e presídios, desde as primeiras horas nos dias de visita.

Muitos leitores dizem que a culpa também foi delas por terem criado seus homens assim. Bem, talvez. Talvez não. Talvez de nossa ação e nossa inação também. Quem sabe?

Um lanche, um bolo de fubá, revistas, pilhas para o radinho, uma muda de roupa, pacotes de cigarros – que servem de moeda e diversão. No final, a pena de muitas dessas mulheres termina no dia em que seus filhos, maridos, pais, irmãos deixam a cadeia. Quando deixam. Quando não as deixam. Quando conseguem sair sem carregar a cadeia em suas almas.

É triste que as mesmas filas que se formam nas portas de um depósito de gente masculino não se formem do lado de fora dos presídios femininos. A quantidade de pais, irmãos, maridos, filhos, avôs que vão visitar mulheres encarceradas são, proporcionalmente, em número vergonhosamente menor do que a quantidade de visitantes mulheres de homens encarcerados. Muitas acabam abandonadas pelos homens de suas vidas.

Nesse meio tempo, o telefone encurta a distância, mas nem sempre. E o peito começa a apertar quando o número de ligações vai escasseando, a freqüência diminuindo. Quando a saudade falada já não convence. O coração fica mirradinho, mirradinho. Incerteza, às vezes, é pior do que a morte, doença ruim que não é causada pelo ar ou água e sim pela distância. Não raro os maridos encontram outras mulheres. E as novidades não ficam apenas em um novo travesseiro na cama. Às vezes, se estendem também para uma nova casa, novos filhos. Enfim, uma nova vida.

O padrão em nossa sociedade é que mulheres sejam educadas para acompanhar e servir, aceitando serem repostas, quando necessário. E homens para serem idiotas e egoístas. Na ausência de um dia de visitas em uma cadeia à solidão em uma casa nos Jardins ou no Cosme Velho.

É doloroso viver com uma parte de você em outro lugar. Uma perda que não se completa, sobre a qual não se chora o luto, mas se sente a dor da distância e da saudade.

Enfim, tudo isso para dizer que senhoras de cabelos brancos não deveriam tomar chuva e passar frio para visitar seus filhos. E mulheres não deveriam ser abandonadas à sua própria sorte e tristeza.

Comments (4)

  1. Parece que se trata a família de bandidos, como bandidos também. Não se considera a vergonha dessas mães, filhas e esposas por terem um bandido ligados à elas, o sofrimento é imenso, a culpa as acompanha junto com a vergonha. Fica a pergunta onde errei? O que eu fiz. Não se pode comparar dores, cada uma é única, mas é sempre uma dor. Mas vale destacar, se por um lado as famílias das vítmas recebem solidariedade, o que é correto e justo, a família dos algozes são segregadas socialmente, o que é injusto e acaba que o único lugar onde recebem solidariedade e uma dor identidária são nas longas filas das prisões.

  2. Vc já viu dizer que amor de P……….é aquele que fica.Muitas mulheres caem na ilusão do amor bandido. Mas logo, logo se arrependem. Estes homens não são dificeis, são desajustados e fazem um mal enorme para a familia. Mas mesmo assim tem muitas que preferem “homens dificeis”. Mas muito raramente são felizes. Bjus.

  3. Acredito que é menos doloroso para uma mãe enfrentar o frio e a chuva numa visita a cadeia, do que visitar o filho numa tumba de cemitério.

  4. O livro Freakonomics – O lado oculto e inesperado de tudo que nos afeta é uma coletânea de estudos do economista Steven Levitt, Ph.D. pelo MIT, em parceria com o jornalista Stephen J. Dubner. A obra defende teses polêmicas, entre elas a de que a legalização do aborto seria a grande responsável pela redução das taxas de criminalidade nos Estados Unidos. O autor, matematicamente, demonstra como a criminalidade diminuiu numa época porque, com o aborto legalizado vinte anos antes, aquela geração de marginais não existiu duas décadas depois… Muito interessante!

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