Assessores do governo divulgaram que o ritual era a “dança dos guerreiros”. O líder Arimatéia Xavante deu uma versão diferente: “Essa é a dança da cura. Quando tem uma pessoa doente na aldeia, a gente bota ela pra dançar. É a dança do doente mesmo”
Leonencio Nossa, Agência Estado
Brasília, 19 – Em pé de guerra com os políticos, índios xavantes conseguiram que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, participasse da dança do doente. A performance de Cardozo, que fazia gestos com as mãos no estilo discoteca, aconteceu no final da manhã desta sexta-feira, após uma cerimônia do Dia do Índio, no prédio do Ministério da Justiça, em que lideranças reclamaram da inércia do governo na defesa das aldeias e acusaram a Polícia Federal de matar e desrespeitar índios.
Assessores do governo divulgaram que o ritual era a “dança dos guerreiros”. O líder Arimatéia Xavante deu uma versão diferente: “Essa é a dança da cura. Quando tem uma pessoa doente na aldeia, a gente bota ela pra dançar. É a dança do doente mesmo”. Em entrevista, o ministro foi questionado se passava por algum problema de saúde ou se o governo estava doente. Cardozo respondeu que tinha recebido a informação que o sentido da dança era outro. “Estamos tratando de todos os males que afligem os povos indígenas. Pelo menos foi esse o sentido da dança que os índios disseram para mim”, afirmou.
As ministras Izabella Teixeira (Meio Ambiente) e Maria do Rosário (Direitos Humanos) evitaram passar pela “dancinha”. Antes, porém, elas não escaparam de ouvir uma série de críticas e cobranças. O cacique Raoni Metuktire, liderança dos txucarramães, reclamou da Polícia Federal e da Força Nacional. “Ministro (Cardozo), tem que falar com a Polícia Federal e com a Força Nacional para não matarem meu pessoal. Isso eu não gosto”, disse Raoni. “Vocês têm que falar para respeitarem nossos parentes.”
Raoni referia-se ao assassinato do índio Adenilson Kirixi Munduruku durante a Operação Eldorado, da Polícia Federal, na aldeia Teles Pires, na divisa do Estados do Pará e de Mato Grosso. A operação foi deflagrada para combater um garimpo ilegal. Os ministros Maria do Rosário e José Eduardo Cardozo responderam que não compactuam com ações de violência contra aldeias. O ministro da Justiça afirmou, sem uma referência direta ao caso de Adenilson, que índios estão sendo usados por organizações criminosas que agem na área da mineração.
Contra os ruralistas
Cardozo disse que não aceitava a “opinião” de alguns de que os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff nunca tiveram compromisso com a causa indígena. Foi uma resposta ao cacique Damião Paridzané, da etnia xavante, que, na solenidade, pediu a manutenção da Fundação Nacional do Índio (Funai) e uma “postura” do governo contra a bancada ruralista no Congresso. “Eu respeito a presidente Dilma, mas ela tem que ter postura contra os ruralistas. Eu não aceito que os ruralistas aprovem o projeto que passa para o Congresso a decisão de demarcar terras indígenas”, disse. “Eu não confio no Congresso, pois os deputados não vão na aldeia saber o que está acontecendo.”
Durante a solenidade, o ministro disse que o governo defende os índios, não acabará com a Funai e se posicionará contra a Proposta de Emenda Constitucional 215 que transfere do Executivo para o Legislativo a prerrogativa de homologar terras indígenas. Em entrevista, ele admitiu, porém, que o governo estuda “mudanças estruturais” na área. Lideranças indígenas temem que essas mudanças reduzam ainda mais o poder da Funai nas discussões sobre projetos de infraestrutura na Amazônia. Decisões na área seriam tomadas em grupos envolvendo outros setores do governo.
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Enviada por José Carlos para Combate Racismo Ambiental.