“Apagaram tudo; Pintaram tudo de cinza; A palavra no muro; Ficou coberta de tinta”.
Canção Gentileza, Marisa Monte
*Nei Alberto Pies – Sul 21
Mulheres da Paz deixou de ser apenas uma marca, ou simplesmente nome de um Projeto, pelo menos para as Mulheres que dele participam há mais de um ano em nossa cidade Passo Fundo. Para estas mulheres, as Mulheres da Paz, o Projeto constituiu-se numa identidade, a partir da qual desejam continuar seu trabalho nas comunidades: defensoras de direitos humanos ou articuladoras sociais de cidadania (como são definidas pelo Ministério da Justiça). O reconhecimento de seu trabalho pelas entidades dos bairros, pelas famílias visitadas e pelas mulheres que são orientadas e encorajadas a enfrentar a violência da qual são vítimas motiva-as pela continuidade do trabalho social. As mulheres nutrem um grande desejo de compartilhar conhecimentos, experiências de vida e cidadania. Descobriram, sobretudo que, ao compartilhar parte de sua vida e de seu tempo aos outros, são imensamente recompensadas por sorrisos, agradecimentos e reconhecimentos de muita gente humilde e desamparada.
As Mulheres da Paz deram-se conta de que são, elas mesmas, sujeitas de direitos e de que tem direito a ter direitos. Durante o processo de capacitação cidadã e o desenvolvimento do trabalho social nas suas comunidades, foram desafiadas a viver uma cidadania ativa. Ao apreenderem para si este reconhecimento, sentem-se capazes e motivadas para estimular e orientar para a cidadania ativa de outros homens e de outras mulheres. Deste modo, desafiam-se agora para o exercício de sujeitas sociais, capazes de buscar soluções para si e para os outros de forma coletiva e organizada.
O conhecimento, a valorização e a participação na vida social sempre foram poderosas ferramentas para acabar com a discriminação e a violência contra as mulheres. Ao conviverem com outras mulheres e novos conhecimentos, cada uma reinventou-se a si mesma, passando a conceber o mundo de formas e visões diferentes. O “empoderamento” para a cidadania ativa deu-se, principalmente, quando as mulheres saíram do seu “mundo privado” da família e passaram a viver e conviver em diferentes espaços sociais e coletivos.
Por onde passam ou falam, nas atividades ou eventos que promovem ou são convidadas, as Mulheres orgulham-se de sua identidade: MULHERES DA PAZ. Vestem, com orgulho, a sua identidade de promotoras de uma cultura de paz e de direitos humanos. Sentem-se cidadãs de nossa cidade, valorizadas, reconhecidas e com voz ativa no combate à violência contra as mulheres. E se perguntam se tudo isto vai acabar dentro em breve, desconstruindo sua identidade e seu poder coletivo de cidadania.
Os altos índices de violência contra a mulher, o bom trabalho social desenvolvido pelas Mulheres da Paz, o assassinato de Silvia Aparecida de Miranda (Mulher da Paz morta ao defender sua filha de violência doméstica), o prêmio Nacional do Curta “Sílvia” concedido pelo Congresso Nacional e a importância da orientação e combate à violência contra a mulher são razões suficientes para justificar o apoio e o incentivo do Poder Público Municipal para a continuidade do trabalho das Mulheres da Paz em nossa cidade. O trabalho social de orientar a cidadania e defender e promover os direitos humanos, que não é realizado de forma satisfatória pelo Estado, não deve ser realizado de graça e nem de forma totalmente voluntária. As Mulheres da Paz esperam por este reconhecimento, para que “a palavra no muro, não seja coberta de tinta”.
*Professor e ativista de direitos humanos.
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Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.