A pobreza é um dos principais fatores para vulnerabilidade a qualquer tipo de exploração. No caso do tráfico de mulheres, esse fato adquire um valor particular, vez que muitos estudos concordam que a pobreza é mais recorrente em mulheres.
Larissa Ramina*
As comemorações do Dia Internacional da Mulher servem também para alertar que, em pleno século XXI, a histórica vulnerabilidade da mulher persiste com contornos alarmantes, e na forma mais primitiva que se possa imaginar: a da escravidão sexual.
Situações de tráfico de pessoas e trabalho escravo não remetem a um passado distante, casos isolados de violações em lugares remotos e a um problema superado pela humanidade. Ao contrário, trata-se de questão que figura como tema central na agenda política internacional.
Atualmente, o tráfico de pessoas é uma das atividades mais lucrativas do crime organizado no mundo, sendo a terceira mais rentável atividade desse tipo de crime transnacional, ficando atrás somente do tráfico de drogas e de armas. O tráfico de mulheres para exploração sexual figura como espécie do tráfico de pessoas. Estima-se que da totalidade de vítimas do tráfico de pessoas, quase a metade seja subjugada para exploração sexual, a qual inclui turismo sexual, prostituição forçada, escravidão sexual e casamento forçado. Entre as principais vítimas, estão as mulheres.
No Brasil, o tráfico de mulheres não era considerado um problema relevante até que pesquisas incluíram o país nas rotas internacionais de tráfico de seres humanos e exploração sexual, evidenciando também a existência de rotas nacionais por todo o território.
Na seara das dificuldades conceituais em torno do crime de tráfico sexual de mulheres, um dos pontos mais complexos é o consentimento das vítimas ou seu grau de vitimização. É comum pensar que existe distinção entre a mulher que escolhe por um trabalho na indústria do sexo, e a outra que é forçada a isso. Em termos práticos, porém, é difícil avaliar qual é o grau de vontade própria do sujeito. Ainda que a pessoa tenha consentido com atividades relacionadas à indústria do sexo, indaga-se se teria ela se sujeitado à situação de exploração na qual foi inserida. De mais a mais, ainda que houvesse o referido consentimento à exploração, não parece razoável entender que a vítima poderia dispor de seus direitos fundamentais.
Logo, o consentimento dado pela mulher deve ser considerado como irrelevante para a configuração do tráfico, pois ninguém pode escolher voluntariamente ser traficada, explorada ou escravizada. Além dos fatores já expostos, há pesquisas que salientam o fato de que as mulheres e adolescentes em situação de tráfico sexual comumente já sofreram algum tipo de violência intrafamiliar ou extrafamiliar como abuso sexual, estupro, abandono, negligência, maus-tratos, ou outros tipos de violência em escolas, abrigos ou outros.
Por outro lado, a pobreza é um dos principais fatores para vulnerabilidade a qualquer tipo de exploração. No caso do tráfico de mulheres, esse fato adquire um valor particular, vez que muitos estudos concordam que a pobreza no mundo é mais recorrente em mulheres, e inclusive atribuem a este fenômeno o nome de “feminilização da pobreza”.
O século XXI vê-se diante de um velho problema, que ressurge com novos contornos, porém caracterizado pelas mesmas violações aos direitos humanos. O tráfico de mulheres para exploração sexual é um fenômeno impulsionado pela globalização, expressão da escravidão moderna e que ascende como nova modalidade do crime organizado internacional. É alarmante saber que pesquisas apontam para a existência, hoje, de mais mulheres escravizadas sexualmente do que em qualquer outro período da história.
(*) Professora de Direito Internacional da UFPR e da UniBrasil.
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Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.
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