Akemi Nitahara, Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – O Ministério Público Estadual (MP) considera ilegal a remoção compulsória de pessoas em situação de rua sendo elas usuárias de drogas ou não. O posicionamento do MP se deu em função do anúncio do prefeito do Rio, Eduardo Paes, de implantar a internação compulsória de adultos dependentes químicos, principalmente de crack.
A promotora de Justiça de Tutela Coletiva da Saúde, Anabelle Macedo, concorda que a questão do crack é uma situação complexa e lembra que o MP tem atuado na área. “O Ministério Público já vem desenvolvendo um trabalho nessa área de população de rua e também na área do combate, prevenção e cuidados dos usuários de crack”, disse.
Ela também informou que já foi instaurado um inquérito civil público para apurar as deficiências no atendimento aos dependentes químicos objetivando melhorar o sistema. “O inquérito tem como objetivo ampliar a rede de atendimento pública aos usuários de crack, garantindo assistência e resgate dos usuários de crack em situação de rua, no âmbito da rede de saúde mental. Também na assistência integral no tratamento aos dependentes, com unidades de saúde especializadas, recursos humanos, assistência farmacêutica, atividades terapêuticas e práticas integrativas de promoção à saúde”, declarou, ressaltando que o dependente químico tem os mesmos direitos de atendimento previstos na Lei nº 10.216/01 que trata da saúde mental, com prioridade para o atendimento extra-hospitalar.
O promotor de Justiça de Defesa da Cidadania, Rogério Pacheco, entende que a internação involuntária de adultos não encontra respaldo legal. Ele lembra também que já foi firmado, em maio deste ano, um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o município sobre a questão da remoção involuntária.
“O TAC prevê uma série de providências que o município precisa implementar, de modo que haja no Rio de Janeiro, verdadeiramente, uma política para a população em situação de rua. Por exemplo, o termo prevê que os abrigos devem contar com pessoal especializado na abordagem dessa população: psicólogos, assistentes sociais. Enfim, o TAC prevê a necessidade do município criar um programa específico de moradia para a população de rua, um programa específico para qualificação profissional”, disse.
Para Pacheco, as operações da Secretaria de Ordem Pública foram encaradas mais pela perspectiva da segurança pública do que pela de assistência social, “que seria a correta”. “São operações de enxugar gelo, porque as pessoas são recolhidas aos abrigos do município e lá não permanecem, porque esses abrigos ainda carecem de uma estrutura adequadas e por conta da falta de uma política no município pro atendimento dessas pessoas”, declarou o promotor.
Anabelle reitera que o objetivo de qualquer ação com usuários de droga é sempre o retorno da dele à família ou à sociedade a qual pertence. O Ministério Publico marcou para 11 de dezembro uma audiência pública para discutir o assunto e as melhores formas de encarar o problema.
O médico Jorge Jaber, psiquiatra especialista em dependência química, acha o tratamento dos usuários de droga não tem sido feito corretamente. “Os pacientes usuários de drogas não estão sendo tratados como enfermos”, disse. Jaber, que é presidente da Associação Brasileira de Alcoolismo e Drogas (Abrad), explicou que a dependência química é uma doença fruto de uma alteração fisiológica no funcionamento do cérebro. Com isso, a pessoa perde o discernimento e precisa de tratamento.
“Na minha estatística, dos serviços que eu dirijo, o paciente se recupera em poucos dias do comprometimento físico e passa querer alta. Ele não percebe que vai precisar de um tratamento psicológico para conseguir dizer não ao uso de drogas. Ele confunde o bem-estar com a cura. Normalmente, nós temos conseguido resultados em torno de 90 dias de internação, depois passamos para o regime ambulatorial”, declarou o médico.
De acordo com a Secretaria Municipal de Assistência Social, que faz operações conjuntas com os órgãos de segurança para o enfrentamento do crack desde março de 2011, nas 106 ações feitas até hoje nas principais regiões de consumo da droga na cidade, foram feitos 5.141 acolhimentos, sendo 4.468 adultos e 693 crianças e adolescentes. Só este ano, foram 2.227 acolhimentos, sendo 1.981 adultos e 246 crianças e adolescentes, em 42 operações. Os principais pontos de atuação foram na Favela do Jacarezinho, com 30 operações; centro do Rio, com 20 operações; Favela Parque União, com 18 operações; e Manguinhos, com dez ações no total.
A secretaria informou que o abrigamento é compulsório para crianças e adolescentes com alto grau de dependência química, situação verificada após triagem inicial. Nos casos mais graves, elas são encaminhadas para unidades especializadas e passam por uma avaliação psicológica e clínica. As crianças e os adolescentes abrigados compulsoriamente podem receber visitas semanais dos parentes e passam ir a suas casas nos fins de semana, até a reinserção na sociedade depois de comprovada matrícula na escola e em atividade complementar no turno contrário.
O município tem seis centros especializados de atendimento à dependência química. Atualmente, são 123 crianças e adolescentes abrigadas compulsoriamente nesses centros. No caso de adultos, a internação compulsória só é possível após decisão judicial.
A secretaria inaugurou, no ano passado, a primeira unidade municipal de reinserção social do Programa Rio Acolhedor, com 422 vagas para acolhimento e atendimento especializado de pessoas em situação de rua e usuários de drogas. O local oferece curso de alfabetização para jovens e adultos, capacitação profissional, esportes e apoio à dependentes químicos.
Edição: Aécio Amado
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