Raquel Rolnik*
Segunda-feira, meio-dia, em Nova Iorque a paisagem é insólita: ruas desertas, lojas fechadas, sacos de areia protegendo a entrada de edifícios, vitrines protegidas por fitas… E uma grande expectativa no ar. As filas nos supermercados, normalmente já enlouquecidamente grandes, durante todo o domingo estavam gigantes. A cidade espera o furacão Sandy, que deve chegar a qualquer momento entre hoje e amanhã, mas ninguém sabe exatamente quando, nem se, nem com que intensidade ele vai atingir a cidade.
Além da paisagem muito estranha – afinal, Nova Iorque é a cidade que nunca dorme, que compra e vende o tempo todo, em todas as ruas – impressiona sua preparação para o desastre. Áreas baixas, sujeitas a inundação, foram evacuadas desde ontem. Da mesma forma, a rede de transporte público foi interrompida e todas as atividades públicas foram suspensas. Além disso, foram colocados avisos em toda a parte alertando as pessoas para que façam suas provisões.
São milhares os funcionários da prefeitura – bombeiros, empregados das empresas de transporte, do serviço de drenagem e coleta de lixo, entre outros – trabalhando intensamente, pelo menos desde sábado, selando estações, montando barricadas, disseminando informação. Várias escolas públicas foram transformadas em centros de evacuação, indicadas em mapas postados em toda a parte, preparadas para receber as pessoas que saírem das áreas evacuadas (inclusive com seus pets!).
Parece realmente que, inspirados pelos filmes de desastre que Hollywood adora produzir, todos se preparam para viver estas cenas. É impressionante também a indústria imediata do desastre – os kits desastre que apareceram nas lojas, incluindo de pilhas até geradores elétricos; a propaganda de aplicativos especiais para celular, como o “find your friends”… O sensacionalismo também se aproveita da situação – a imprensa produz edições especiais sobre o furacão Sandy, com instruções e previsões “precisas” que não batem uma com a outra…
Há uma espécie de excitação coletiva diante do desastre iminente, um misto de medo e entretenimento que os meios de comunicação exacerbam ao extremo. Mas para a administração da cidade, o furação e sua ameaça não têm nada a ver com show…
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Furacão Sandy em Nova Iorque: a realidade imita a ficção
*Urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e relatora especial da Organização das Nações Unidas para o direito à moradia adequada.