Me rendo ou luto contra o preconceito?

Esq / dir: Eduarda Tuxá (Direito), Renira Tuxá (Biologia), Bruna Tuxá (Administração), Lívia (Odontologia), Mayane Tuxá (Enfermagem), Maryane Tuxá (Odontologia)

do blog Tatu Tatu Xamaraka

Esta é a dúvida que persegue os indígenas universitários diariamente, seja nas salas de aula, nos corredores da instituição ou pelas ruas, quando são alvos da discriminação e do “preconceito de olhos azuis”.

Ontem, na Universidade Estadual de Feira de Santana deu-se início ao 2º Seminário de Afro-Brasileiros e Indígenas (8 a 10 de maio, Módulo 7, Auditório 5), um evento de grande importância para ambos os povos em questão. O pequeno auditório esteve lotado durante todo o dia, sendo palco de um momento único, onde estudantes indígenas, negros e simpatizantes puderam discutir questões sociais, políticas afirmativas e bolsas auxílios, se abrindo de coração para expressar o seu sentimento quanto estudante “diferente”, relatando os preconceitos vividos dentro da comunidade acadêmica, mostrando a decepção de encontrar neste ambiente, que no mínimo deveria ter uma maior compreensão quanto às singularidades e à diversidade cultural, o mesmo preconceito enraizado que se encontra nas ruas.

Depois das falas da mesa e dos debates no período da manhã, alguns estudantes indígenas Tuxá da UEFS fizeram o seu tradicional ritual de dança, O TORÉ, passando a todos uma energia positiva e a certeza de que, embora haja diversos problemas, a cultura indígena e do povo Tuxá se mantém viva e expressa na garra e coragem destes universitários.

Durante a tarde, necessariamente às 17h , dá-se início a mesa 4, com o tema COTIDIANO DE DISCRIMINAÇÕES DAS IDENTIDADES NEGRA E INDÍGENA, com coordenação da Professora Patrícia Navarro, formada pelos Estudantes Indígenas Josevan Tuxá, Fabinho Arfer Juntá Tuxá e da Quilombola Luciene Paulo Cruz, além da presença ilustre da Professora Maria Rosário Gonçalves de Carvalho (Etinóloga  e Coordenadora do PINEB/UFBA).

O Estudante Fabinho Tuxá apresentou os bordões mais conhecidos, que têm como escopo minimizar o Indígena, entre eles:

“Porque não está pelado? Cadê sua oca? Você fala Tupi? Porque você tem pelos? Porque seu cabelo não é liso? Porque não volta pro mato? Lá vocês ficam pelados? O que é isso? É tatuagem? Lá as índias ficam peladas..? hum… Índio com celular, face…?”

Relatou também casos que ocorrem, desde o princípio, dentro da cidade onde se localiza a aldeia Tuxá, Rodelas – BA; casos dentro das escolas, onde os estudantes indígenas tinham de levar sua própria cadeira, pois na instituição as cadeiras eram apenas para os filhos de brancos, caso o índio se sentasse era imediatamente retirado do assento; a mesma ordem permanecia com a merenda escolar, os índios não podiam comer.

O estudante conta também uma situação constrangedora que viveu dentro da UEFS com o estudante recém formado em história, Junior Tuxá: eles haviam recentemente participado de um evento com temática indígena, e estavam pintados de Jenipapo, quando foram jantar no Restaurante Universitário, vulgo Bandejão; quando se sentaram ao lado de uma estudante esta mudou sua feição ao vê-los, mostrou-se meio que enojada e/ou ameaçada, se levantou imediatamente e foi sentar-se em outro lugar.

O estudante conta este episódio com um nó na garganta, ressentido. Fábio levanta um acontecimento muito comum a todos os estudantes indígenas, a falta de companheiros em sala de aula na construção de trabalhos ou seminários, fala que não entende se isto se deve ao fato de nos julgarem menos inteligentes ou incapazes ou pelo fato de nos verem como intrusos neste “mundo” elitista e muito “igual”; o próprio estudante fala que, de fato, se sente um intruso dentro deste espaço (“A universidade abriu suas portas, contudo, a forma como a comunidade acadêmica nos trata é como se fôssemos intrusos,diz ele), como um peixe fora da água, e termina brincando com a situação e se mostrando indiferente às discriminações, pois reconhece-se autossuficiente e diz: “Trabalho de grupo, ou se for de dupla, é TUPÃ E EU” .

O Jovem universitário Josevan Tuxá dá inicio à sua fala perguntando aos presentes qual deles nunca foi pintado e enfeitado por penas de cartolina no dia do índio: todos (óbvio) levantam a mão e afirmam já ter vivenciado isso.

Josevan entra no assunto de Educação e faz um apelo para que estas coisas mudem, que a história dos indígenas seja mais bem vista e explorada nas aulas das escolas em geral, pois considera que esta é a única forma de dar fim à discriminação, ou seja, se as pessoas tivessem um melhor conhecimento sobre os indígenas e afrodescendentes, o respeito existiria. O estudante conta também um caso que viveu dentro da Universidade, quando o professor durante a chamada, no lugar de chamar o seu nome se direcionou a ela fazendo o famoso “uh- uh- uh- uh”.

Existem diversos casos que comprovam o teor Elitista desta Universidade e do desrespeito que existe às diferenças, vindo dos estudantes e dos próprios professores, assim como conta a estudante indígena de Enfermagem, Leidiane Atikun, que presenciou sua professora de Anatomia falar que “Depois que se iniciou  a política de cotas, o nível da Universidade caiu bastante”; uma situação parecida aconteceu com a estudante Brenda Tuxá, também estudante de enfermagem, quando seu professor falou que “A Universidade Estadual de Feira de Santana só prestou enquanto não havia a política de Cotas”.

Tal tema foi bem apresentado também pela Quilombola Luciene, que conta as dificuldades dos jovens da sua comunidade em ingressarem na Universidade e da dificuldade de permanecerem aqui dentro; a mesma apresenta uma reflexão interessante: “A universidade diz: Venham, vocês são bem-vindos, mas depois, quando estamos aqui dentro, a fala é: A porta da rua é a serventia da casa”. Por último a fala da professora Rosário, que reafirma muito bem tudo o que foi dito pelos estudantes, afirmando que é preciso o respeito e uma melhor compreensão quanto à diversidade cultural e suas singularidades.

De toda forma, as lutas e enfrentamentos continuam, é preciso moldar a imagem nublada que a grande totalidade tem sobre as minorias, inclusive dos homossexuais, como sugere Jackson, negro e homossexual: “Toda discriminação é injusta e sem fundamento, e só vai ter fim quando se tiver um maior conhecimento do outrem e consequentemente, o respeito”.

Concluo aqui, e acredito que cada estudante indígena que ingressa neste meio universitário é uma nova oportunidade para romper com estas falsas ideias de que índio bom é o índio distante, índio enfeitado na estante ou preso nas telas de um belo quadro, pois índio bom é aquele que luta e se mostra presente!

Eduarda Arfer Juntá Tuxá

9 de maio, 2012

Feira de Santana- BA

Me rendo ou Luto contra o preconceito?

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