Nota: segundo a informação recebida, Isabel Cristina e as outras três pessoas continuavam presas ontem, sábado, 24 de março. TP.
Hoje [quinta-feira, 22] pela manhã, numa operação da Polícia Militar nos prédios do PAC que foram construídos junto à favela de Manguinhos, policiais agiram mais uma vez com truculência e desrespeito ao abordarem moradores, tratando-os de antemão como criminosos (sem provas e evidências), realizando ofensas e intimidações. A companheira da Rede contra a Violência Isabel Cristina, que foi durante muitos anos moradora de Manguinhos e estava visitando o filho que mora num dos apartamentos dos blocos, interviu exigindo que os policiais agissem com respeito e como manda a lei, tal qual fazem quando estão atuando em bairros de classe média ou burguesa, de população preponderantemente branca e rica.
Um tenente da PM, que comandava a ação, irritou-se com a atitude de Isabel e lhe deu voz de prisão pois ela estaria incorrendo no crime de “desacato à autoridade”. Isabel e mais três moradores envolvidos no incidente foram levados detidos à 21a DP (Bonsucesso) e depois à 37a DP (Ilha do Governador), onde se encontram até o momento.
“Desacato à autoridade” é uma figura do código penal (artigo 331) diretamente herdada dos tempos do arbítrio e do autoritarismo, pois o servidor público (na maior parte das vezes policiais) julga-o e aplica-o sem depender de testemunhas e praticamente sem dar oportunidade de defesa ao acusado, o que dá margem a subsequentes e graves atos violadores dos direitos. Foi alegando desacato, por exemplo, que os militares que na época ocupavam a favela da Providência prenderam três jovens e os entregaram a traficantes de uma outra favela, em junho de 2008, levando ao assassinato dos jovens após sessão de torturas.
Esses e outros casos de arbitrariedades e violência têm levado juristas, defensores de direitos humanos e outros setores a proporem a extinção do crime de desacato. O próprio Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Humana pronunciou-se neste sentido após o crime na Providência e até um projeto de lei extinguindo o artigo 331 do CP já foi apresentado ao Congresso Nacional, porém o dispositivo legal continua em vigor e permitindo abusos em massa, principalmente contra moradores de favelas e movimentos sociais em todo o país.
Na ocupação militar dos Complexos da Penha e do Alemão, por exemplo, uma reportagem do jornal EXTRA de julho de 2011 publicou levantamento feito nos autos de prisão em flagrante (APFs) do Exército, realizados entre abril e maio do ano passado, que revelou que de 75 detidos, 53 foram enquadrados só no desacato, ou neste crime junto com outros. Isso representa 60% da quantidade de presos por desacato (88) pelas polícias Militar e Civil em todo o estado entre dezembro de 2010 e abril de 2011, de acordo com o Instituto de Segurança Pública (ISP).
Isabel, nossa companheira que foi presa, foi aliás uma das mais ativas nas denúncias que fizemos desde o início da operação militar e policial nas favelas dos Complexos do Alemão e da Penha em novembro de 2010. Pedimos a todas e todos que solidarizem-se com Isabel e pressionem para que ela seja libertada e para que a acusação de “desacato” seja retirada. O telefone da 37a DP é 2334-6308.
Comissão de Comunicação da Rede contra a Violência.
Enviada por Mônica Lima.