“A balas tentam calar a voz dos excluídos da terra e da vida”

Tania Pacheco

Vai terminar o 7 de setembro da Independência às margens do Ipiranga, salve, salve. Faz tempo o casal global – “normal” ou substituto, n’importa – já deu seu boa noite, após o coquetel de pretensas notícias displicente mas eficientemente arrumadas para os olhos e ouvidos da chamada classe média. A novela das oito/nove terminou. Na sobremesa, futebol, com direito a abertura com hino legendado. Amanhã será outro dia normal. Para a maioria, mas não para todos.

De Senhor do Bonfim, Bahia, a notícia que evidentemente não esteve entre as selecionadas pelo casal global continuava a repicar na internet, levada a novos grupos e com outras palavras. No texto e já a partir do título, que me permito utilizar acima, a revolta partilhada de Maria Aparecida de Jesus Silva:

Na noite de ontem, por volta das 21h, Leonardo de Jesus foi tirado de casa e brutalmente assassinado em Monte Santo/BA. Aos 37 anos, deixando 2 filhos.

Ele só queria ver a terra repartida! O direito de trabalhar e viver na terra com dignidade. Porém, o latifúndio, a impunidade e a omissão do Estado fizeram mais uma vítima… Do ano passado até ontem, já foram 5 assassinatos de camponeses em Monte Santo; destes, 3 jovens.

O sangue de Leo e de tantos outros mártires ecoa da terra, junto ao grito de tantos(as) excluídos(as) neste 7 de setembro de luto.

É hora de se solidarizar a família de Leo e também denunciar este atentado à vida do povo! Chega de impunidade!!!

A mensagem de Maria Aparecida me chega repassada por um amigo da CPT, que aparentemente dela ainda não tinha conhecimento. Seu comentário foi bem mais curto:

“merda de pátria! nem madrasta é!
até quando, brasil?”

“Até quando…?” havia sido exatamente parte da minha resposta a Juliana Barros, horas mais cedo, após receber e postar a informação neste blog. E eu terminara com um “vamos adiante”, que levara a um comentário por parte dela:

Terrível, Tania, é a 2a perda nossa nessa semana, somada a tantas outras… mortes matadas e mortes morridas que de tão presentes nos roubam os sentidos do adiante… mas seguimos, do jeito e na luta que escolhemos…

Ruben Siqueira encerrara seu curto comentário com uma assinatura que às vezes também uso, mas que, no seu caso, dificilmente não antecede seu nome: “na luta”.

Faço uma rápida busca no Google: às 8:30 do dia 8, exceto pela notícia de ontem deste Blog, Monte Santo está presente associada a um outro assassinato, noticiado há quase exatos nove meses, no dia 7 de janeiro de 2011. Mais um trabalhador rural é assassinado em área de Fundo de Pasto*, diz a manchete sobre a morte de Antônio do Plínio. E continua:

O início de 2011 já ficou marcado por mais um ato de injustiça e atentado à vida, sobretudo das famílias que vivem no campo. A comunidade de Serra do Bode, município de Monte Santo (BA), vive hoje tristeza e revolta pelo assassinato do trabalhador rural Antônio do Plínio, como era conhecido. Antônio do Plínio se destacava como liderança no Movimento pela regularização fundiária na região, nas chamadas áreas de Fundo de Pasto.

Não há menção, sequer, a investigações posteriores, prisões ou julgamentos. Maria Aparecida citou cinco mortes em um ano; Juliana falou de duas em uma semana (provavelmente a outra “morrida”). As balas tentam calar; os meios de comunicação tentam invisibilizar; a justiça se mantém cega, surda e muda…

Exceto para as famílias, amigos e companheiros dos Leos, dos Plínios e de tantos outros e outras, o dia 8 chegou e, para a maioria, será um dia absolutamente normal.

Até quando?

*http://www.irpaa.org/noticias/245/mais-um-trabalhador-rural-e-assassinado-em-area-de-fundo-de-pasto

 

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