Moradores fazem cerco internacional a siderúrgica no Rio

DENISE MENCHEN

Moradores de Santa Cruz foram buscar ajuda de ONGs com atuação internacional para tentar barrar as atividades da CSA (Companhia Siderúrgica do Atlântico), inaugurada em junho no bairro da zona oeste do Rio.

As queixas contra a siderúrgica chegaram à Europa, sede da ThyssenKrupp. A empresa alemã é dona de 73% do empreendimento de cerca de R$ 14 bilhões. A Vale, com 27%, é parceira.

As reclamações vão desde o suposto envolvimento da siderúrgica com milicianos que atuam na região até danos à pesca local e a emissão no ar de um pó brilhante. Apesar de negar, a empresa não conseguiu evitar que esses assuntos chegassem aos tribunais brasileiros e a organismos internacionais.

Os principais críticos são os pescadores, que responsabilizam a dragagem da baía de Sepetiba, para a construção do porto da companhia, pela redução da pesca local. Segundo eles, metais pesados, que no passado vazaram da falida companhia Ingá, foram trazidos à tona.

“Meu ganho foi reduzido a 20% do que era”, afirma Marcos Garcia, da Confapesca (Confederação das Federações de Pesca do Brasil). A empresa nega e diz que adotou práticas que evitaram a dispersão dos poluentes. Em nota, diz que foi autorizada por órgãos ambientais.

Na Justiça, ao menos sete ações de associações de pescadores pedem indenização de quase R$ 300 mil para cada um dos 5.763 associados. Os protestos também estão no cerne da acusação de envolvimento com milicianos.

Um pescador, que está em um programa de proteção da Secretaria Especial de Direitos Humanos, diz ter sido ameaçado de morte por se opor ao empreendimento.

Segundo o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), o pescador reconheceu o chefe da segurança da CSA como o autor das ameaças. A siderúrgica diz que as acusações são caluniosas. “O serviço de segurança da empresa é realizado por empresas legalmente estabelecidas e licenciadas por órgãos públicos competentes.”

Parlamento Europeu

Em 2009, o caso foi exposto ao Parlamento Europeu. Em janeiro, o pescador ameaçado falou perante os acionistas da Thyssen. Em maio, o caso foi parar em Madri, no Tribunal Permanente dos Povos, que pediu a interrupção do projeto.

O processo culminou com a visita, em setembro, da eurodeputada Gabriele Zimmer, do partido alemão Die Linke (A Esquerda). Ela chegou pouco após a CSA ser multada em R$ 1,8 milhão pela emissão de material particulado na atmosfera.

A empresa diz que o material não oferece riscos à saúde. Os moradores discordam. Zimmer prometeu pedir à bancada de seu partido, no Parlamento alemão, que faça um pedido de explicações ao governo. “Eles podem não estar tão preocupados que a imagem deles seja prejudicada no Brasil, mas certamente ficarão se isso ocorrer na Europa”, diz a eurodeputada.


Sociedade civil e intelectuais denunciam siderúrgica no RJ

No dia 17/9, foi realizada a Missão de Solidariedade e Investigação de Denúncias em Santa Cruz/RJ, tendo em vista o início do funcionamento da ThyssenKrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA).

A TKCSA, inaugurada em 18/7 deste ano, é uma indústria siderúrgica que produzirá 5,5 milhões de toneladas de placas de aço por ano, utilizando uma termoelétrica que queimará cerca de 4 milhões de toneladas de carvão mineral por ano dentro da cidade do Rio de Janeiro. Inúmeras são as denúncias contra a empresa de violações de direitos humanos e de impactos socioambientais. Tudo isso financiado pelo BNDES e contando com elevadasisenções fiscais. Trata-se de um dos maiores investimentos privados recentes do Brasil. Na semana de 23/8, a TKCSA foi multada em R$ 1,8 milhões pela poluição causada em Santa Cruz e pela omissão de informações sobre o assunto por parte da empresa aos órgãos ambientais estaduais.

Em Santa Cruz, muitas são as denúncias de que as poeiras e os gases emitidos pela siderúrgica causam doenças respiratórias, dermatológicas e neurológicas (que atingem mais acentuadamente crianças e idosos, podendo evoluir para câncer) em cerca de onze comunidades da região, que sofrem diariamente os impactos do constante tráfego de trens de carga para abastecer a siderúrgica. Além disso, diversos habitantes tiveram suas casas vulnerabilizadas com rachaduras e infiltrações provocadas pelos impactos das obras. Moradores doentorno estão indignados. São mais de sete conjuntos habitacionais que reúnem mais de 200 mil pessoas. Os pescadores também têm visto muitapoeira no mar.

Siderúrgicas desse porte não são mais autorizadas a funcionar em cidades e aglomerações urbanas nos países de capitalismo avançado, devido aos enormes impactos que causam na saúde. Esses impactos sobre a saúde já vinham
sendo previstos e denunciados desde o ano passado.

A Fiocruz fez um estudo em cima do relatório de impacto ambiental da TKCSA e tinha levantado esses riscos, e também as imprecisões dos estudos efetuados pela empresa antes de se instalar.

O projeto desrespeita o princípio da precaução, proposto na ECO 92, em que a existência de risco de um dano sério ou irreversível ao meio ambiente requer a implementação de medidas que possam prever este dano. A Baía de Sepetiba é uma área que concentra manguezais e Mata Atlântica. É também uma área com problemas ambientais passados,
como a contaminação com metais pesados.

A TKCSA representa o risco de acentuar a contaminação daquele ecossistema com mais metais pesados. Pode ainda originar um acidente ambiental gravíssimo.

A empresa não respeita a isonomia tecnológica que deveria ser aplicada em investimentos desse  tipo. Sindicalistas de Duisburg, cidade alemã onde a ThyssenKrupp produz aço, confirmaram que a empresa não está utilizando no Brasil a mesma tecnologia que deveria utilizar na Alemanha. Não utiliza porque representa uma tecnologia que, ainda que reduza em até 90% a poluição do processo produtivo, seria mais cara e encareceria o aço aqui produzido.

A Missão de Solidariedade e Investigação de Denúncias foi organizada pelos seguintes organismos:

Rede Jubileu Sul, PACS (Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul), Justiça Global, Rede Brasileira de Justiça Ambiental, Comitê Baía de Sepetiba pede Socorro e Comissão de Direitos Humanos da ALERJ.

Contou também com a presença dos professores do DLCS/ICHS/UFRRJ Flavia Braga Vieira, Janaína Tude Sevá e Marco Antonio Perruso; professores da Fiocruz, UFRJ e UFF; do deputado federal Chico Alencar; da deputada do Parlamento Europeu Gabriele Zimmer; das organizações Rede Brasileira de Justiça Ambiental, CUT, CONLUTAS, associações de pescadores; além de vários ativistas ambientais.

A cobertura jornalística foi realizada por TV Brasil e Folha de São Paulo.

Durante a Missão, os participantes puderam verificar, inclusive, a presença de pessoas que tentaram a todo custo atrapalhar – felizmente, sem sucesso – a visita de solidariedade e denúncia.

Algumas dessas pessoas posteriormente foram vistas no interior das instalações da TKCSA, configurando claramente a intimidação imposta pela empresa às comunidades locais e suas lideranças que, contudo, resistem.

A Missão agora está preparando um relatóriodenúncia a ser divulgado à sociedade e autoridades responsáveis, e acompanhando a assistência médica e jurídica às vítimas.

Marco Antonio Perruso, Prof. Adjunto de Ciências Sociais (ICHS/UFRRJ)

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