Thais Leitão, Enviada Especial da Agência Brasil/EBC
Manaus – “Isso aqui não é vida não, minha irmã. Tenho fé em Deus que vou sair daqui com os meus filhos”. A frase da dona de casa Maria Márcia Gonçalves, 38 anos, dá a dimensão da total precariedade em que vivem as famílias moradoras da comunidade Igarapé do 40, na zona sul de Manaus.
No local, crianças brincam em meio ao lixo acumulado sob as palafitas e à água poluída, decorrente também do esgoto lançado no igarapé. Vidros de pimenta, garrafas PET, pedaços de madeira, restos de comida, potes de margarina e latas de cerveja lotam a área onde proliferam insetos e animais, colocando em risco a saúde da população.
“Aqui é cobra, rato, barata, mosquito. Tudo de ruim. Além do mau cheiro que, quando chove, fica ainda pior, ainda tem a água que, quando o rio enche entra nas casas. As crianças ficam doentes, têm diarreia, febre, vômito, dengue, malária. A gente sofre, ainda mais quando tem filho pequeno”, disse Maria Márcia, equilibrando-se em tiras irregulares de madeira que formam uma estreita ponte improvisada em frente à sua casa. “Balança mas não cai. Por enquanto”, brincou diante da miséria na qual vive.
A moradia, feita de madeira sobre o igarapé tem aproximadamente 40 metros quadrados e nenhuma janela. Os três cômodos abrigam duas famílias, a de Maria Márcia, que vive com três filhos, e a da irmã dela, que também tem três crianças.
“A sala e a cozinha ficaram para ela, e eu e meus meninos nos apertamos no vão que sobrou. É o jeito”, acrescentou Márcia, que tem esperança de ser transferida, por meio de programas governamentais, para um dos conjuntos habitacionais que estão sendo construídos em regiões próximas. “Muitas famílias já foram tiradas daqui, estou esperando a minha vez”, contou, lembrando que há cerca de uma semana a palafita vizinha, onde funcionava uma igreja evangélica, foi removida.
A empregada doméstica Aldriana Baraúna, 24 anos, tem duas filhas e também reclama das doenças frequentes. Ela disse que já perdeu a conta das vezes que precisou correr para um dos postos de saúde da região porque as meninas estavam com febre ou diarreia. Segundo Aldriana, sempre foi bem atendida nas unidades próximas.
“A sorte é que elas nunca tiveram dengue, mas vômito e diarreia sempre têm. É muito perigoso viver aqui com elas, mas não tive escolha. O problema é que o povo também não tem educação e joga lixo em qualquer lugar”, disse, enquanto atravessava uma ponte improvisada com pedaços de madeira, onde funciona uma peixaria que divide o espaço com o lixo, a água poluída e os insetos.
Situação semelhante é encontrada nos arredores da comunidade ribeirinha do bairro Educandos, na zona sul da capital do Amazonas. No local, parte dos moradores vive em palafitas sobre o Rio Negro, bem próximo a áreas onde também há acúmulo de lixo e proliferação principalmente de insetos. Segundo moradores, quando o nível do rio sobe, aumenta o risco de inundação das casas.
A prefeitura de Manaus informou que o Igarapé do 40 está sendo atendido com obras de revitalização pelo Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus (Prosamim), do governo do estado. Já a assessoria do governo do Amazonas informou que mais de 20 igarapés da cidade estão recebendo obras e ações socioambientais, por meio do Prosamin, entre eles o Igarapé do 40, que integra a Bacia de Educandos. Com curso d´água de 8 quilômetros de extensão, trata-se de um dos mais importantes igarapés que compõem a rede hidrográfica da capital amazonense.
Desde o início das ações, financiadas com recursos do governo estadual e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), cerca de 13 mil pessoas do Igarapé do 40 foram reassentadas. Elas receberam indenizações, bônus moradia ou foram contempladas com unidades de um dos seis conjuntos habitacionais construídos na própria região – zona sul de Manaus – e na zona norte da cidade. Também foram recuperados mais de 15 mil metros lineares de igarapés e implantados 140 quilômetros de rede de esgoto sanitário em cinco bairros da região.
Edição: Marcos Chagas