Em junho, geraizeiros interromperam uma greve de fome, diante do compromisso do MMA e do ICMBio de avançar com a proposta, o que não acabou não acontecendo
O Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF/MG), em conjunto com o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, recomendou ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) a criação imediata da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Nascentes dos Gerais.
A RDS Nascentes dos Gerais deve abranger áreas dos municípios de Montezuma, Rio Pardo de Minas e Vargem Grande do Rio Pardo, no Norte de Minas Gerais, onde vivem comunidades geraizeiras, povos tradicionais que exercem atividades extrativistas em regiões de cerrado.
Os geraizeiros são assim chamados porque habitam os gerais – planaltos, encostas e vales das regiões de cerrado. Bons conhecedores desse bioma e de suas espécies, eles se adaptaram com sabedoria às características do cerrado e às suas possibilidades de produção, fazendo uso sustentável do ambiente em que vivem. Na verdade, a presença dessas comunidades tradicionais do cerrado tem sido fator decisivo na proteção do meio ambiente onde exercem suas atividades.
Há cerca de 12 anos, essas comunidades lutam pela criação de uma unidade de conservação que possa garantir sua sobrevivência e impedir a deterioração do espaço em que vivem e, em consequência, de seus modos de viver, criar e fazer, direito que lhes é garantido pela constituição brasileira e por tratados internacionais, entre eles, a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho, segundo a qual, os países signatários “devem adotar as medidas necessárias para identificar os territórios tradicionalmente ocupados pelos povos e comunidades tradicionais, bem como para garantir seu acesso aos recursos naturais existentes nas terras onde vivam”.
Em julho de 2005, o procedimento para a criação da RDS foi instaurado no âmbito do ICMBio, órgão responsável pela criação e gestão das unidades de conservação federais.
Nove anos depois, a RDS Nascentes dos Gerais ainda não saiu do papel, apesar do agravamento, ao longo dos anos, das condições ambientais e de vida das comunidades.
Greve de fome – Diante da ausência de medidas efetivas, no último mês de junho, os gerazeiros iniciaram uma greve de fome e sede, suspensa 36 horas depois, após compromisso assumido pela ministra do Meio Ambiente e pelo secretário geral da Presidência da República, em reunião com a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal e com integrantes do movimento geraizeiro, de concluir o processo de criação da reserva, enviando a proposta à Casa Civil até o dia 21 seguinte.
Acontece que, novamente, a promessa não foi cumprida.
No dia 29 de julho, outra reunião foi realizada, com a presença dos Ministérios Públicos Federal e Estadual, desta vez na sede administrativa do governo mineiro, em Belo Horizonte/MG.
Na ocasião, o ICMBio reconheceu que havia sinalizado ao movimento geraizeiro que a Reserva de Desenvolvimento Sustentável seria a modalidade de unidade de conservação mais adequada às finalidades pretendidas por aquelas comunidades tradicionais. No entanto, segundo a recomendação, deu-se início a uma rediscussão acerca da natureza da unidade de conservação, o que, na prática, “procrastina sua implantação e frustra os princípios da boa-fé objetiva e da confiança legítima na ação estatal”.
Na semana passada, em 11 de agosto, o governo mineiro apresentou levantamento fundiário da área de 38 mil hectares prevista para a implantação da RDS. Para os Ministérios Públicos Federal e Estadual, esse levantamento “ainda depende de melhor detalhamento, processo que demandará longo tempo, o que evidencia a necessidade de decretar-se desde logo a criação da RDS para, em seguida, serem finalizados os estudos fundiários, única maneira de evitar danos irreparáveis às comunidades tradicionais que pleiteiam a implementação da unidade de conservação”.
O ICMBio terá prazo de 10 dias para enviar relatório documentado sobre as providências adotadas para dar cumprimento à recomendação.
Assinam a recomendação os procuradores da República Edmundo Antônio Dias e Marcelo Malheiros Cerqueira e os promotores de Justiça Paulo César Vicente de Lima, Carolina Cerigatto, Daniel Castro e Melo, Daniel Oliveira de Ornelas e Carlos Eduardo Ferreira Pinto.
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