Por Dirceu Benincá, Revista Missões
Durante o Fórum Social Temático (FST) Energia, realizado neste final de semana, dias 7 a 10, na Universidade de Brasília (UnB), representantes de diversas organizações da sociedade civil, movimentos socioambientais e pesquisadores relataram experiências, apresentaram dados e debateram as consequências, perigos e ameaças oriundos da utilização da energia nuclear.
Depois reafirmaram a posição de exigir do Governo a desativação das usinas Angra 1 e 2, além da suspensão da construção de Angra 3. As obras de Angra 3, que iniciaram em 1984 e mais tarde permaneceram interrompidas por duas décadas, foram retomadas em 2010. Conforme a Revista Exame, até agora foram gastos 3,2 bilhões de reais. Seu custo total está orçado em 14,8 bilhões de reais.
O Plano Nacional de Energia prevê até 2030 a instalação de mais 4 usinas nucleares, duas das quais na Região Nordeste e outras duas na Região Sul e Sudeste. Os participantes do FST, no entanto, manifestaram-se contrários a esses projetos e insistiram na necessidade de maior investimento do governo para a geração de energia a partir de fontes mais limpas, como a eólica, solar e biomassa. Além disso, defenderam a democratização na produção da energia e a sua distribuição de maneira justa para todos.
Para Emico Okuno, professora de Física do Instituto de Física da USP, o principal perigo das usinas nucleares se verifica quando ocorre algum acidente. “O acidente nuclear é diferente de qualquer outro. Enquanto outros acontecem e terminam, o efeito do acidente numa usina nuclear se prolonga por muito tempo. O local fica contaminado por até 300 anos e as consequências são devastadoras. Fora isso, a energia nuclear é muito cara e o Brasil não precisa dela para fazer frente às suas demandas”, afirma. Okuno explica que doses altas de radiação nuclear causam a morte em pouco tempo e doses baixas provocam efeitos tardios, entre os quais o câncer, que é o mais temido.
“Além dos perigos com a contaminação nuclear, há também o problema dos resíduos. Até hoje não se sabe o que fazer com esse material”, informa Heitor Scalambrini Costa, professor da Universidade Federal de Pernambuco e membro da Articulação Antinuclear Brasileira. Segundo ele, é comum ouvir que a energia nuclear não gera gás de efeito estufa, mas isso é meia verdade, pois para que uma central nuclear funcione, ela precisa de combustível nuclear e, para obtê-lo, as indústrias emitem gases. Scalambrini alerta ainda para o fato de que a energia nuclear pode desembocar na fabricação da bomba atômica. Conclui dizendo que a energia nuclear não é nem barata, nem limpa e nem segura.
Marcelo de Souza Porto, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz e membro da Rede Brasileira de Justiça Ambiental, chama atenção para as injustiças ambientais que se verificam nos processos de geração de energia. “A injustiça ambiental é consequência de um modelo de desenvolvimento e de uma lógica político-econômica que faz com que os benefícios e o poder se concentrem nas mãos de poucos e muitas cargas recaiam sobre as populações mais vulneráveis”. Significa dizer que os impactos ambientais são distribuídos de modo desigual na sociedade, com os maiores benefícios para os mais abastados e, por outro lado, os maiores riscos, perigos e impactos para os tradicionalmente mais desfavorecidos. Entre eles, estão agricultores familiares, quilombolas, indígenas, trabalhadores em mineração, atingidos por barragens e outros.
A auditora fiscal do Ministério do Trabalho, Fernanda Giannasi, ao acompanhar graves situações geradas pelo manuseio e pelo contato com produtos perigosos, tornou-se uma militante de movimentos sociais que lutam contra o uso do mercúrio, do amianto e do urânio. Ela explica que depois da invenção da bomba atômica, a indústria bélica começou a fazer uso comercial dessa arma. “Os EUA doaram reatores nucleares, inclusive ao Brasil, para serem usados na medicina. Daí adveio o desenvolvimento industrial da energia nuclear para a área médica, para a engenharia, para a prospecção de petróleo, etc”. Giannasi afirma ainda que a energia nuclear sempre esteve envolvida num grande segredo. “Discutir energia nuclear não é somente discutir geração núcleo-elétrica, mas a geração de todos os problemas que estão relacionados com essa tecnologia”.
Giannasi define a gestão da energia nuclear no país como um desastre. Isso pelo descumprimento de normas de segurança e pela falta de informações adequadas às pessoas que trabalham nesses empreendimentos e à população do entorno. “Não aprendemos nada com os grandes acidentes que tivemos, como o da Pensilvânia (Estados Unidos), de Chernobyl (Ucrânia) e de Fukushima (Japão)”.
A auditora Giannasi alerta para o fato de que as usinas nucleares hoje não são mais seguras do que em outras épocas e acrescenta que a vida útil do reator de Angra 1 já venceu. Compreende, assim, que a tecnologia nuclear tem que ser repensada em todo o seu campo de produção e utilização. Segundo ela, para alguns usos da área médica ainda não há substituto, mas no restante pode-se e deve-se substitui-la.
—
Enviada por Zoraide Vilasboas.