Sob o tema da Romaria da Lapa: “Bom Jesus, Rosto Humano de Deus e Rosto Divino do Homem!”, membros da Comissão Pastoral da Terra/Bahia, representante do Conselho Indigenista Missionário e voluntários desenvolveram no período do novenário dedicado ao Bom Jesus (28 de julho a 06 de agosto), uma intensa campanha de divulgação, esclarecimento e coletas de assinaturas, sobre a prevenção ao combate do trabalho escravo. Com uma barraca montada na esplanada da Gruta do Bom Jesus foram distribuídos milhares de folders, contendo informações importantes sobre esta prática nefasta ainda existente no País. Foram também distribuídos cartilhas, panfletos e outros materiais contendo outras informações importantes e os telefones para denunciar a prática do trabalho escravo. Toda esta ação foi realizada no período de 30 de julho a 03 de agosto.
Na noite do dia 30/06, durante o novenário, que refletia o tema: “O Batismo de Jesus”, o Bispo da Diocese de Floriano, no Piauí, Dom Valdemir Ferreira dos Santos. Chamava atenção de todos os presentes para esta situação degradante do trafico humano e do trabalho escravo, e que todos os cristãos tinham a obrigação de denunciar esta pratica. Lembrou que a Campanha da Fraternidade deste ano convoca a todos e todas a assumirmos esta luta, que fere a dignidade de todos os batizados. Ainda chamou a atenção para o período eleitoral que se aproxima, para que todos tem muito cuidado com o seu voto, que não se pode e nem deve se “vender nem comprar votos”, pois o voto não tem preço, tem consequência.
Segundo os organizadores da atividade, a mesma faz parte dos gestos concretos da Campanha da Fraternidade 2014, e vem sendo desenvolvida pela Comissão Pastoral da Terra em todo o Brasil. De 1995 até o ano passado em um ultimo levantamento feito, mais de 49 mil pessoas, foram libertadas, principalmente no campo, nas atividades de pecuária, desmatamento, grandes lavouras, carvoarias, todas geralmente ligadas ao agronegócio. Mas, atualmente a libertação de trabalhadores em obras de construção civil, frigoríficos, nas grandes redes de lojas tem aumentado significativamente.
A Bahia está em quarto lugar no ranking nacional, com mais de três mil trabalhadores libertados em situação análoga ao trabalho escravo. Existem casos de trabalho escravo, degradante e super exploração na fruticultura irrigada no Vale do São Francisco, nas carvoarias, e nas grandes fazendas do Oeste, na lavoura do algodão, na colheita do café no sudoeste, nas madeireiras e empresas de camarão no extremo sul e no litoral. Todos estes casos confirmados pelas pessoas que iam sendo abordados pelos agentes na esplanada, citando casos de pessoas conhecidas ou situação que elas conheciam, mas não sabiam como denunciar. Agradeciam e parabenizavam pelo trabalho, tão importante para libertar estas pessoas. Outras desconheciam e achavam que a prática da escravidão, não existia mais, mas aos poucos percebiam que infelizmente ainda existe e bem próximas a elas.
Tão preocupante quanto à exploração do trabalho escravo é a tentativa da Bancada Ruralista no Congresso Nacional de alterar o conceito legal que define o crime de trabalho escravo no Brasil. Tudo isto em troca da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que determina o confisco de propriedade flagradas com exploração de trabalho escravo, os ruralistas querem de todo o jeito retirar da definição do trabalho escravo, estabelecidas no artigo 149, do Código Penal aprovado em 2003, elementos essências na caracterização contemporânea deste crime. O objetivo é claro: eliminar do texto legal o que se pratica na realidade, a violação brutal e criminosa da dignidade dos trabalhadores (as) e tornar inviável o confisco da propriedade.
A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a relação de empregadores flagrados com trabalho escravo mantido pela Portaria Interministerial N.º 2/2011, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e da Secretaria de Direitos Humanos – a chamada “lista suja” da escravidão. A Adin 5115. O cadastro oficial serve de base para as empresas signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, que se comprometem a não travar relações comerciais com empregadores flagrados com escravos, e também para bancos públicos, que usam a tabela como referência para concessão de créditos.
A tentativa de anular a “lista suja” está sendo criticada por autoridades envolvidas no combate à escravidão e representantes de organizações, empresas e movimentos sociais. A CNA é presidida pela senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), que é integrante da Frente Parlamentar de Agropecuária, a Bancada Ruralista, e tem interesse direto na questão. Seus dois irmãos, André Luiz Abreu e Luiz Alfredo de Feresin Abreu, tiveram seus nomes envolvidos em flagrantes de escravidão em 2012 e 2013, respectivamente.
Você também pode ajudar na prevenção e no combate ao trabalho escravo, conheça mais um pouco da campanha e faça a sua parte. Acesse AQUI.
Aproveitou-se o momento da Romaria para fortalecer a campanha pela regularização do Território Pesqueiro, que foi lançada em Brasília/DF, em Junho/2012 e busca a assinatura 1% do eleitorado brasileiro (equivalentes a 1.406.466 assinaturas), para uma lei de iniciativa popular que propõe a regularização do território das comunidades tradicionais pesqueiras.
Defender o direito de pescadores e pescadoras artesanais é garantir na mesa da população brasileira o peixe natural e saudável, ameaçado de extinção devido ao processo de privatização das águas e dos territórios pesqueiros.
Contamos com o apoio para este mutirão pelas comunidades pesqueiras: pela biodiversidade, cultura e soberania alimentar do povo brasileiro! Acesse o AQUI e ajude a coletar assinaturas e a divulgar a Campanha.
Vale ressaltar que o objetivo da Romaria da Lapa 2014, é levar os peregrinos, romeiros (as) a refletirem, rezarem e resgatarem à imagem da pessoa humana, tão desfigurada, maltratada e vulnerável, em nosso dias, pelo tráfico de pessoas e órgãos humanos, pela violência e desrespeito à dignidade, pelas estruturas de escravidão e trabalhos forçados, conforme apontou à Campanha da Fraternidade, desse ano.
Quem dera se ouvisse o grito de Deus, perguntando a todos nós: “Onde está o teu irmão?” (Gn 4,9). Onde está teu irmão escravo? Onde está teu irmão pescador? Onde está o teu irmão que está morrendo cada dia na pequena fábrica clandestina, na rede da prostituição, nas crianças usadas para a mendicidade, naquela que tem de trabalhar às escondidas porque não foi regularizado? Não nos façamos de distraídos! Há muita cumplicidade… A pergunta é para todos… (Evangelii Gaudium, p.172).
Haroldo Heleno
03 de agosto de 2014.