CIMI – O objetivo deste texto é apresentar algumas das contradições que envolvem a prisão de cinco indígenas Kaingang, no estado do Rio Grande do Sul, procedida após o conflito em Faxinalzinho, que lamentavelmente resultou na morte de duas pessoas. Antes, porém, tomo a liberdade de transcrever parte do que ouvimos dos Kaingang, durante as visitas que realizamos aos líderes indígenas no presídio:
“Aqui nós somos muito bem tratados pelos presos. Nós fomos trazidos pra cá e ficamos muitas horas de pé, algemados e com o rosto na parede. De vez em quando um policial federal passava e torcia os nossos dedos e dizia que a gente ia pagar por tudo o que fizemos. Eu nem sei porque fui preso, não fiz nada. No dia do conflito eu estava com meu pai em Nonoaí, no banco, na Caixa Econômica Federal, ele foi sacar o dinheiro da aposentadoria. Eu estava com muito medo e não sabia o que ia acontecer aqui dentro do presídio. Eu estava com muita fome e sede. Ficamos muito tempo sem comer e sem beber água. Eles nos separaram em dois grupos, eu (Celinho), o Nelson e o Romildo fomos levados para a galeria dos trabalhadores do presídio e o Deoclides e o Daniel foram pra ala dos evangélicos. Quando nos levavam lá pra galeria o medo aumentou. Mas ali fomos bem recebidos. Os presos perguntaram se a gente queria café e depois mandaram esquentar a comida e nos disseram para comer. Depois nos deram roupa, a nossa roupa estava toda suja. Aqui dentro nos trataram com dignidade”. (Celinho de Oliveira)
“O pessoal aqui nos acolheu muito bem. Tudo o que sofremos lá fora, da polícia, aqui foi o contrário. A gente estava só com a roupa do corpo. Aqui, quando chegamos, os presos procuraram roupa que poderia nos servir. Ganhamos calça, camisa, blusa, é que está ficando frio. Eles nos deram comida, nos trataram com respeito. Pode dizer lá para as nossas esposas que estamos bem. A gente sabe que eles estão sofrendo lá, que não sabem o que está acontecendo, mas diz pra eles que a gente está bem. Que se mantenham firmes, isso aqui vai passar. A gente sabe que eles queriam prender qualquer um da nossa comunidade, eles precisavam prestar conta pra sociedade. Nós caímos numa emboscada porque confiamos nas autoridades. Mas agora eles precisam se unir (os Kaingang) ainda mais. Não podem aceitar negociação. Se precisar ficar aqui 30 anos a gente fica. Eu suporto o peso da injustiça, suporto a prisão, nem que seja por 30 anos, se as nossas terras forem demarcadas”. (Deoclides de Paula)
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