Tania Pacheco – Combate Racismo Ambiental
Ruralistas do estado que anos após ano detém os recordes de violência e assassinatos de indígenas estão se preparando cuidadosamente para a Audiência Pública – que em Mato Grosso do Sul recebeu o nome muito mais coerente de Conferência Estadual – que segundo eles terá por objetivo debater com autoridades e a sociedade “subsídios para aprimorar” a inconstitucional PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 215.
A maioria absoluta dos participantes está ligada diretamente ou indiretamente ao agronegócio, começando pela própria Famasul (Federação de Agricultura e Pecuária de MS), Acrissul (Associação dos Criadores de MS), Sindicatos Rurais (leia-se ruralistas), Assomasul (Associação dos Municípios de MS) e “proprietários rurais das áreas em conflito”. Em termos oficiais, anunciam a presença Governo do Estado, da Assembleia Legislativa e da Superintendência da Policia Federal. Por outro lado, estão também convidados o Ministério Público Federal, a OAB/MS (que esperamos seja representada pela sua Comissão Permanente de Assuntos Indígenas, COPAI), a Funai e, finalmente – única entidade da sociedade civil não ruralista -, o Cimi.
Em mais essa pseudo audiência para discutir como desrespeitar a Constituição brasileira (elas estão acontecendo nos principais estados marcados por ruralistas e seus jagunços, num total de 12), não sei bem como o Cimi irá se portar. Com certeza não será fácil aturar as sandices e falácias que ali serão ditas e acontecerão, mesmo que haja a expectativa de ter ao seu lado, caso compareça, a Funai e o MPF, inegáveis defensores dos povos indígenas de MS, e, tudo correndo bem, a COPAI.
Organizando o circo (no sentido romano da palavra), estão os deputados federais Luiz Henrique Mandetta (do DEM, óbvio) e Reinaldo Azambuja (do PSDB, óbvio também). No dia 9, a eles se juntarão outros dois: Afonso Florence (PT-BA) e Osmar Serraglio (PMDB-PR), respectivamente presidente e relator da famigerada Comissão da PEC 215.
Arregimentando a claque
Nos municípios de MS, os preparativos andam a mil. Em Amambaí, por exemplo, o Sindicato Rural se reuniu com parceiros como a Cooperativa Agroindustrial local, no dia 23 de abril, para discutir as estratégias a serem seguidas. Sairão na madruga do dia 8 para o dia 9, às 3 horas da madrugada, em ônibus contratados a partir de inscrições prévias. E nem é preciso ser ruralista para se candidatar ao passeio a Campo Grande. Segundo o Amabai Notícias, o presidente do Sindicato, Diogo Peixoto, magnanimamente convida todo o município (exceto os indígenas, suponho) a participar da festa:
“Quanto mais pessoas se mostrarem a favor da instalação desta PEC é melhor para todos nós. O Sindicato convoca toda a população, não só produtores rurais, mas todos os cidadãos que simpatizam com a nossa causa e que entendem a importância dessa mudança, para participar desta Assembléia” [sic]!
E também nisso tem total apoio do gerente da Cooperativa Agroindustrial Amambai, Marco Antonio Crispim:
“Eu falo como agricultor [sic], nós temos que nos comprometer de levar muitas pessoas a esta assembléia. Nós precisamos mostrar nossa força e lutar pelos nossos direitos”.
E o movimento indígena?
Sabiamente, a meu ver, os povos indígenas vêm se negando a participar dessas falsas Audiências, como forma inclusive de não legitimar o debate sobre algo que tanto o Ministério da Justiça como a própria AGU (apesar da Porcaria 303) já afirmaram reiteradamente ser uma total inconstitucionalidade. Preferem, isso sim, organizar protestos na frente do local onde está acontecendo o evento, contando para isso com o apoio de entidades, estudantes, militantes.
Espero que o CONDEPI (Comitê Nacional de Defesa dos Povos Indígenas de Mato Grosso do Sul) esteja atento e também se organizando, de sua parte, para apoiar os povos indígenas nesse dia 9 de maio. Com certeza isso será de grande importância.
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Sobre o CONDEPI, leia: