Política de ação afirmativa é um tema recorrente nas universidades brasileiras, especialmente a partir da década de 1990, quando debates sobre o assunto passaram a ser mais frequentes e a ter mais visibilidade dentro e fora da academia. Está relacionada a medidas especiais para a correção de desigualdades constituídas historicamente, resultado de descriminação, marginalização, exploração, preconceito e outras formas conhecidas para o estabelecimento de assimetrias entre pessoas e grupos humanos na sociedade nacional.
Muitas vezes, essas desigualdades foram naturalizadas e por isso mesmo não despertam a atenção de parte da população. Por este motivo, ações afirmativas, como as chamadas cotas sociais e etnicorraciais, têm sido adotadas em universidades estabelecidas em todas as regiões do país. Geralmente estão voltadas ao acesso e permanência de estudantes negros e indígenas em cursos de graduação, mas aos poucos começam a ser implementadas em cursos de mestrado e doutorado, isto é, na pós-graduação stricto sensu.
Seguindo esta perspectiva e de acordo com a tradição de trabalhar com diferenças socioculturais, no ano de 2013 o Programa de Pós-Graduação em Antropologia do Instituto de Ciências Humanas da UFPel (Universidade Federal de Pelotas), lançou edital de seleção para a turma 2014 de mestrandos. Ver aqui.
Com esta medida, somou a outros casos para uma política de acesso afirmativo na pós-graduação brasileira. Foram abertas 24 (vinte e quatro) novas vagas, sendo que deste total pelo menos 4 (quatro) estão destinadas a candidatos indígenas e negros que optarem por participar do processo seletivo nesta condição. As inscrições para o exame de seleção estão abertas para o período de 21 de outubro a 13 de dezembro de 2013 e as repercussões iniciais sobre o assunto têm sido positivas nas redes sociais.
Trata-se de um Programa inserido em um movimento de (re) aproximação estratégica, oportuna e inovadora dos campos da Antropologia Sociocultural e da Arqueologia no Brasil. Por isso possui duas áreas de concentração, uma em Antropologia Social e Cultural e outra em Arqueologia, as quais também estão presentes como linhas de formação na graduação em Antropologia da instituição. Uma proposta assim segue conhecidas tradições nas Américas e em outras partes do mundo e vai ao encontro de demandas consolidadas no Brasil e em outros países do MERCOSUL.
Para tanto, em conformidade com discussões sobre identidade étnica e etnicidade, bem como de acordo com orientações contidas na Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), o Programa adotou o critério da autodeclaração como indígena ou negro para a inscrição. Além disso, candidatos residentes em outras regiões do país poderão fazer a prova escrita em programas de pós-graduação em Antropologia ou Arqueologia ou Ciências Sociais mais próximos do lugar onde residem, tendo ainda a opção de fazer a entrevista via Skype. Candidatos estrangeiros, por sua vez, também poderão participar do processo seletivo de maneira menos burocratizada, o que também é outra novidade no edital deste ano.
Iniciativas desse tipo vão ao encontro de um conjunto de mudanças positivas verificadas na UFPel e em tantas outras universidades. Chamam ainda à atenção para uma maior democratização do acesso de indígenas e negros a instituições de ensino superior e apontam para novos desafios às universidades públicas brasileiras.
Oxalá que esta seja uma experiência exitosa e possa cumprir a seus propósitos.
(*) Doutor em História/Arqueologia pela PUCRS e professor do Departamento de Antropologia e Arqueologia do Instituto de Ciências Humanas da UFPel. Antropologia – UFPel – Pelotas RS
obrigado por esta publicação!!