Cimi – O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, manifestou a sua convicção de que agora o governo encontrou o caminho da roça, do diálogo. São as mesas. Mesas de negociação. Amplas e irrestritas, na medida do possível. E quando uma liderança Pataxó interveio, dizendo “Direitos não se negocia. Cumpra-se a lei”. O ministro teve que aliviar: “É, mas o direito no papel é uma coisa e, na prática, a realidade é outra”.
Todos que têm o mínimo conhecimento sobre os povos indígenas sabem que eles nunca se negaram ao diálogo. Esta é uma prática milenar nas comunidades. No entanto, nelas, os diálogos vão, sempre, na direção das soluções. Não são, nunca, diálogos de enrolações.
A PEC e as pegadas
Finalmente! Conforme prometido várias vezes, o governo começa a se manifestar publicamente contra a avalanche de projetos de lei e emendas constitucionais que rondam no Congresso, tentando subtrair direitos indígenas da Constituição.
Após afirmar “O governo é contra essa proposta (PEC 215). Juridicamente e no mérito. É inconstitucional e fere o princípio da separação dos poderes”, o ministro da Justiça afirma que disse ao presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves: “Sou contra esta PEC. Isso vai aumentar a pressão e vai transformar a demarcação em disputa política. Vocês estão errando. Estão radicalizando e jogando fogo. E perdendo a oportunidade de resolver pacificamente. Se é que querem resolver pacificamente”. Cardozo não garantiu a rejeição dessa PEC no Congresso” (O Globo, 22/08/2013).
Mas, senhor ministro, o governo tem que ser contra também a Portaria 303, que é contra a Convenção 169, da OIT, e a própria Constituição do país; e ser contra o PLP 227, que é inconstitucional e contra as normas internacionais (OIT, ONU…) E, principalmente, se posicionar contra a instalação da Comissão Especial da PEC 215, anunciada pelo presidente da Câmara para o dia 4 de setembro.
Recentemente, governo inaugurou mais uma mesa. A mesa da Dilma. Ou melhor, sugerida pela Presidente, por ocasião de seu primeiro encontro oficial com os povos indígenas, depois de dois anos e meio de governo. Será que o governo está mesmo disposto a descolonizar sua visão e prática com relação aos povos indígenas? Será que o Estado brasileiro está disposto a fazer uma inflexão em sua política indigenista, tão marcada pelo preconceito e pela repressão, heranças da ditadura militar? Ou será que está ganhando tempo, tentando agradar a todos até as eleições?
É tempo de despir-se da colonialidade, como está acontecendo em vários países da América Latina! Reconhecer a plurinacionalidade dos países, colocar o Bem Viver como escopo do Estado, reconhecer os direitos da Natureza, da Pacha Mama-Mãe Terra, é colocar-se no caminho do futuro, e não no caminho do mercado e dos privilégios de minorias.
A mesa do Henrique Alves, presidente do Congresso já acabou. Quando os índios ocuparam o plenário da Câmara, em abril, provocaram uma situação de pânico e correria, ganharam uma mesa, um espaço de diálogo, uma comissão de conversação. Umas poucas reuniões aconteceram e a mesa acabou. Agora, para serem ouvidos, somente se fizerem outra ação forte como foi a ocupação.
Outras mesas, comissões e fóruns estão encerrando suas atividades, sem sinalização de vontade política das mudanças exigidas. A Comissão do Conselho Nacional de Justiça já entregou seu relatório ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa. Com 127 páginas de informações, debates, fotos, mapas, listagens de terras indígenas no Mato Grosso do Sul, e a situação destas terras na justiça e no executivo, é, sem dúvida, um instrumento que exige decisão e ação dos responsáveis pela regularização destas terras indígenas e pela solução dos conflitos e violências que marcam esse processo.
A Comissão exorta à União “a conclusão definitiva do processo administrativo demarcatório com indenização das benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa fé.” Sugere ainda saídas já anunciadas à exaustão, como “a desapropriação de áreas por interesse social, aquisição direta de terras, o assentamento de pequenos proprietários rurais, a transação judicial e a indenização do produtor rural por ato ilícito do Estado decorrente da titulação considerada posteriormente ilegítima”.
Dentre outras medidas, faz um apelo “aos juízes de todo o país para a adoção de absoluta prioridade nos processos judiciais envolvendo a demarcação das terras indígenas”.
A Comissão Especial Guarani, criada no âmbito da Secretaria de Direito Humanos, também deliberou pela visita da ministra Maria do Rosário ao presidente do STF, Joaquim Barbosa, para solicitar urgência no julgamento das ações relacionadas aos direitos indígenas.
Assembleia da Coiab
Começa hoje, na aldeia Umutina, no município de Barra do Bugre (MT), a 10a Assembleia Geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). Ela acontece em um momento histórico da luta dos povos indígenas contra a supressão de seus direitos na Constituição. Em pauta, além das questões nacionais, a reestruturação da organização e eleição da nova coordenação. Enquanto organização aglutinadora dos povos e do movimento indígena na Amazônia, esta articulação das lutas em nível regional e nacional é fundamental.