Governo do AM pode reconsiderar uso do mercúrio em garimpo após mobilização de ambientalistas e cientistas

SDS e cooperativas ainda vão avaliar se substituição do cadinho por equipamento mais moderno é viável economicamente [!!! Todos os destaques são deste Blog. TP.]

Elaíze Farias

Alvo de ataque e de uma intensa mobilização contrária por parte de cientistas e ambientalistas desde que seu uso foi permitido pelo governo do Estado há quase três meses, o mercúrio nos garimpos pode ser retirado das normas de procedimento da Resolução 011/2012 aprovada pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente do Amazonas (Cemaam).

O mercúrio é um metal natural que assume diferentes formas químicas. Sua forma metálica, utilizada para amalgamar o mercúrio do ouro líquido, tem efeito altamente tóxico e danoso à saúde do ser humano e do meio ambiente.

Níveis elevados de mercúrio causam danos no cérebro, no coração, nos ruins e nos pulmões, segundo relatório do Ministério do Meio Ambiente. No Amazonas, as conseqüências para a saúde humana são graves devido à ingestão prolongada de peixes contaminados por mercúrio devido à sua cadeia alimentar, conforme alerta o cientista Ennio Candotti.

Para descartar o uso do mercúrio, contudo, as quatro cooperativas que operam no Amazonas (todas na calha do rio Madeira) precisarão receber financiamento estadual que lhes permitem adquirir um equipamento que substitua o cadinho (condensador), instrumento responsável pelo amálgama que solidifica o ouro líquido e separa o metal. O equipamento alternativo é a mesa vibratória, cujo valor é considerado elevado.

Financiamento

Nesta segunda-feira (06), representantes das cooperativas participam de uma reunião com a titular da Secretária Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SDS), Nádia Ferreira e a direção da Agência de Fomento do Amazonas (Afeam). Nádia afirmou que também convidaria o superintendente do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Marco Antônio Oliveira.

Em entrevista ao jornal A CRÍTICA, Nádia Ferreira admitiu que, “em função de toda a discussão” gerada sobre o mercúrio, a autorização pode ser reconsiderada, desde que as cooperativas tenham condições viáveis social e econômica de utilizar a mesa.

Ela esclareceu, porém, que a proposta será discutida em reunião para analisar a necessidade de ajustes que acontece no próximo dia 14 com membros do Cemaam e pesquisadores e representantes de instituições convidadas, como Conselho de Geodiversidade, Fórum Amazonense de Mudanças Climáticas e Ministério Público Federal do Amazonas. “Entendo que ela pode ser melhorada. Leis são alteradas, decretos são alterados. Nada impede que a resolução seja aperfeiçoada. O ideal é não ter mercúrio”, disse Nádia.

Mobilização

A liberação do uso do mercúrio no Amazonas gerou uma intensa polêmica no meio científico de Manaus, tendo à frente o diretor do Museu da Amazônia (Musa), Ennio Candotti, e teve repercussão nacional. Um dos questionamentos é que cientistas não foram consultados para dar clareza às consequências nocivas do metal. Outra crítica referiu-se a pouca informação sobre como se dará a fiscalização e o monitoramento de seu uso nos garimpos.

No último dia 31, o MPF/AM recomendou à SDS que o órgão não autorize o mercúrio na atividade garimpeira antes que o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) e à 4ª Câmara de Coordenação e Revisão (CCR) do MPF envie parecer técnico e jurídico sobre a resolução. Para o MPF, a medida não adotou os meios adequados de mecanismos de controle.

Nádia Ferreira disse que a Resolução é um “avanço”, pois regulamenta uma atividade tradicional no Amazonas que até então não estava subordinada a procedimentos e ordenamentos. Ela disse ainda que o governo, por meio da Secretaria Estadual da Geodiversidade e Recursos Hídricos, vai realizar um mapeamento sobre a realidade da atividade garimpeira do Estado e sobre os próprios garimpeiros.

Inviável 

A tentativa de minimizar os impactos da atividade garimpeira sem o uso do mercúrio pode ser inviável economicamente para as cooperativas por se tratar de associações pequenas e familiares, diferentes de empresas que operam em grande escala por meio de dragas nos rios. A avaliação é do superintendente da CPRM, Marco Antônio Oliveira. Ele diz que a tecnologia fornecida pela mesa vibratória é mais utilizada por empresas por meio de dragas modernas.

“A maioria dos garimpeiros que atua no rio Madeira é composta por pequenos balseiros (referente às balsas). É preciso avaliar se é viável para eles. Se eles terão condições de comprar um equipamento caro. Se for numa escala maior, industrial, compensa, porque é um investimento muito alto. Uma produção menor, feita pelas cooperativas, não se paga”, disse Oliveira, que participou dos debates sobre a Resolução 011/2012 e é favorável ao uso do mercúrio, desde que seja controlado e haja fiscalização.

Controle

Um dos opositores do uso do mercúrio, Carlos Durigan, coordenador-geral da Fundação Vitória Amazônica (FVA), defende a “total proibição” do metal e mostra-se relutante quanto à adoção de alternativas. “Elas são muito paliativas. Não dá para permitir pelo simples fato de gerar um benefício econômico”, afirma Durigan.

Segundo Durigan, a Resolução não detalha os mecanismos de controle sobre o mercúrio e deveria ser mais rígida sobre todas as etapas que envolvem a cadeia comercial e de seu uso, bem como da sua manipulação pelos trabalhadores do setor.

“Não há nenhuma menção sobre os impactos mecânicos da atividade e possíveis formas de mitigar estes impactos, uma vez que o uso de dragas em rios, igarapés e lagos na Amazônia geram profundas mudanças nas dinâmicas destes corpos d’água e afetam sua biodiversidade. E por fim, não há nenhum controle especial sobre a possibilidade deste tipo de atividade ocorrer em Unidades de Conservação e Terras Indígenas”, disse

Fiscalização

O pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Bruce Forsberg, que tem entre suas especialidades a biogeoquíca do mercúrio e carbono em ecossistemas fluviais, afirma que uma de suas maiores preocupações com a permissão do uso do mercúrio é quanto à adoção e à capacidade do Estado de realizar uma ação eficaz de fiscalização e monitoramento rigorosos da atividade e de seu impacto.

“Na minha experiência em pesquisa, nunca vi uma ação forte no interior onde esses processos (garimpo) estão acontecendo. A fiscalização de garimpo é mais complexa. Tem que ter gente no campo sempre”, disse Forsberg, que participou de uma reunião na última sexta-feira com Nádia Ferreira.

O cientista também disse que embora seja importante o governo fazer um ordenamento da atividade garimpeira, é preciso consultar não apenas “o pessoal da área de geologia”, mas especialistas em impactos para elaborar uma resolução sob a perspectiva científica. Ele contemporizou a polêmica, contudo, e disse que “ainda é cedo para condenar” a medida. “Acho que é possível, desde que seja controlado”, disse.

Bruce Forsberg destacou ainda que o metal deve ser totalmente proibido em áreas de águas pretas, como é o caso do Alto Rio Negro, onde há um forte potencial de mineração, incluindo a exploração do ouro.

“Já existe uma concentração muito alta de mercúrio natural nas águas pretas, como o rio Negro. Por isso que é preciso fazer um zoneamento da atividade. É importante ter uma visão geográfica, saber em quais sistemas é mais perigoso. O problema não é apenas o mercúrio. O garimpo causa assoreamento e erosão. É preciso restringir. Não pode trabalhar em terra ou pequenos igarapés. Tem que especificar mais claramente as limitações”, explica.

Ipaam

O diretor-presidente do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), Ademir Stroski, disse que o órgão vai lançar uma seleção para contratar servidores que atuarão na fiscalização da atividade garimpeira. Outra iniciativa é a criação de um escritório no município de Humaitá.

A titular da SDS, Nádia Ferreira, afirmou que as sugestões de Bruce Forsberg serão apresentadas na reunião do próximo dia 14. Ela contou que a ação de fiscalização pode ser adicionada nos ajustes que serão incorporados à Resolução 011/2012.

Petição

A Resolução 011/2012 do Cemaam foi emitida no dia 09 de maio de 2012. No início de junho, após ser tornada pública, a medida provocou uma mobilização pedindo a retirada do uso do mercúrio.

Uma das iniciativas foi uma petição online contra a resolução. Ela chegou a alcançar quase 700 mil assinaturas pedindo a proibição. Outra manifestação foi uma carta aberta divulgada no dia 2 de junho pelo Museu da Amazônia na qual a instituição alertava para os perigos do mercúrio.

O Amazonas é uma das maiores fontes de ouro do país. Segundo a CPRM, há ocorrência do minério na calha do rio Madeira, no sul do Amazonas próximo da divisa com o Pará, na região do Alto Solimões, no rio Japurá e no Alto Rio Negro.

Conforme a CPRM, a valorização do ouro continua elevada e estimulando mais pessoas a atuar na atividade garimpeira.

A legislação brasileira que dispõe sobre o uso do mercúrio metálico na extração de ouro é o Decreto 97.597 de 13 de fevereiro de 1989. O decreto veda o uso de mercúrio na atividade de extração de ouro, exceto em atividade licenciada pelo órgão ambiental competente.

http://acritica.uol.com.br/amazonia/Governo-AM-reconsiderar-mobilizacao-ambientalistas_0_749925018.html#.UB8s5vAqMB0.gmail.

Enviada por José Carlos.

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