Tey Ikuê – Alegria de Viver

Por Egon Heck

“Apesar desse senso comum estigmatizante e preconceituoso, colocando em processo de dizimação os indígenas, nas terras indígenas recentemente recuperadas, é notável que a maioria dos indígenas sobreviventes se auto-reconhecem etnicamente, tentam realizar o seu modo de ser e de viver diferenciados harmoniosamente, pregando religiosamente sua cultura tradicional da paz, mesmo em um contexto de contato interétnico adverso e violento em que sobrevivem. Deste modo, eles demonstram claramente que nas áreas tradicionais recuperadas, eles revitalizam as boas ações culturais para a vida em paz e sem violência que são redefinidas a partir de sua organização social, política e religiosa. Características que, inclusive, mereceriam também ser entendidas e comentadas por todos os cidadão sul-mato-grossense. (Tonico Benites, Kaiowá- mestre e doutorando em Antropologia Social da UFRJ.)

Fomos chegando cedo à aldeia Tey Ikuê, município de Caarapó, há 290 km de Campo Grande. De longe ouvimos uma grande algazarra. Lá chegando vimos o campo de futebol agitado com centenas de crianças e jovens Kaiowá Guarani. Estavam realizando a gincana ambiental, em comemoração à Semana do Meio Ambiente. Alegria contagiante naqueles rostos faceiros, em corpos ligeiros, saltitantes. Que belo espetáculo sem expectadores, apenas participantes!

“Registrem esses rostos sorridentes, pois quero levá-los comigo para quando a saudade bater…”, disse irmã Anari, que por 14 anos trabalha na escola da aldeia Tey Ikue, e agora está deixando esse trabalho na comunidade para assumir uma responsabilidade na congregação, indo residir no Rio Grande do Sul. Nesse período, ela não apenas ajudou na construção diária da escola indígena, diferenciada e de qualidade, mas construiu um compromisso e uma amizade profunda com as crianças e a comunidade. Ela leva e deixa saudade. Apesar de Anari se afastar da Escola Ñandejara, na qual batalhou com carinho, respeito e eficiência durante mais de uma década, ela certamente continuará acompanhando e apoiando esses rostos e mentes sorridentes de impressionante vivacidade. O regional  Cimi Mato Grosso do Sul, da qual ela participou durante esse  período deseja a Anari, êxito nesse novo espaço de luta e trabalho, na esperança de que para cá volte.

Campeões estaduais

As escolas da Terra Indígena Caarapó, aldeia Tey Ikuê tem se notabilizado por inúmeras iniciativas e atividades na área acadêmica e ambiental, na recuperação da autoestima, na afirmação dos valores de seu povo e no diálogo de saberes. O tradicional e o novo dialogam para construir novas sínteses que fortaleçam o presente e o futuro da comunidade enquanto povo Guarani Kaiowá.

Porém, o que tem projetado a comunidade em nível regional é a grande habilidade no esporte. Há duas semanas os alunos da escola conquistaram o título estadual em futsal masculino. Competiram e venceram conceituadas escolas da capital e do interior do Mato Grosso do Sul.  Com orgulho ostentam o título e irão participar da etapa nacional em João Pessoa, Paraiba, em setembro deste ano.

“Mostre para o Brasil e o mundo, que aqui na aldeia e entre os Kaowá Guarani acontecem coisas boas também”, diz com emoção o diretor da escola, o professor indígena Lidio Cavagna. “Com esse entusiasmo pelo esporte conseguimos tirar muitos jovens da violência”, complementou o professor.

Pela conquista conseguiram um churrasco para os atletas e lideranças da comunidade, patrocinado pela prefeitura de Caarapó.

Visita à mata e fontes

Apesar da área pequena, apenas3.600 hectarespara mais de 5 mil indígenas, ela é rica em nascentes de água. Estão cuidando dessas nascentes de maneira especial, com a recuperação ambiental, reconstituindo a mata ciliar. Ao visitar um desses locais, onde a mata está se reconstituindo, os alunos e professores da escola Paí Chiquito de Panambizinho, que estavam realizando um intercâmbio de conhecimentos e experiências, ficaram entusiasmados para fazer o mesmo em sua área.

Ao visitar a área de plantio de pomar e horta, o professor Eliel contou ao grupo a filosofia que orienta a presença dos alunos no trabalho de plantio e cuidado da terra. ”Aqui os alunos aprendem a sentir a terra integralmente, física e espiritualmente. O tempo da natureza não é o nosso tempo. Temos que nos adequar ao tempo da natureza. A terra está desnutrida. Temos que  ter a espiritualidade da terra e juntar os conhecimentos para construí a sustentabilidade”.

 

http://www.cimi.org.br/?system=news&action=read&id=5639&eid=352

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