Vida de sacrifício e frustração à sombra do poder e opulência

Vizinhos à Cidade Administrativa, que completa dois anos em março, ainda reclamam da falta de infraestrutura

Ernesto Braga – Do Hoje em Dia

No piso e paredes do barraco da auxiliar de serviços gerais Valdivina de Aguiar Rocha, de 43 anos, na favela Tijolinho, em Vespasiano, Região Metropolitana de Belo Horizonte, há rachaduras que, segundo ela, foram provocadas pelo bate-estaca usado para fincar no solo as estruturas das torres de energia elétrica que alimentam a vizinha Cidade Administrativa Presidente Tancredo Neves.

Para que uma subestação fosse construída ao lado da vila, 26 famílias foram desapropriadas. Quem permaneceu na comunidade, como Valdivina, esperava melhorias na infraestrutura urbana, devido à proximidade com a nova sede do governo de Minas, localizada a menos de um quilômetro de distância.

“Por ironia do destino, mesmo com a construção da subestação, todas as casas do Tijolinho só são iluminadas graças aos gatos (ligações clandestinas). A água foi regularizada, mas não conseguimos o mesmo com a energia elétrica. A única rua da vila não foi asfaltada. Só fizeram a rede de esgoto. Por causa da dificuldade de acesso, as correspondências não chegam”, lamenta Valdivina.

Em 6 de março, o conjunto de prédios projetados por Oscar Niemeyer e construído por R$ 1,6 bilhão, no bairro Serra Verde, região Norte de BH, completa dois anos. O complexo foi erguido para concentrar os órgãos públicos estaduais. Segundo o governo do Estado, os investimentos no entorno, nesse período, ultrapassam R$ 20 milhões.

No ano passado, duas praças foram revitalizadas no Serra Verde e sete escolas reformadas. Ao todo, 18 instituições de ensino passaram por reformulações. Em novembro, foi inaugurado o Centro Comunitário Serra Verde, em parceria com a Prefeitura de BH, que atende demandas da região, com cursos de alfabetização, reforço escolar, computação e artesanato, aulas de música e canto. Cerca de 50 quilômetros de ruas e avenidas próximas à Cidade Administrativa foram duplicadas, prolongadas ou recapeadas.

Mas, entre os vizinhos, que moram em bairros de BH, Santa Luzia e Vespasiano, o clima é de frustração. “A promessa era de melhorias urbanas para fortalecer o Vetor Norte. Fizeram muito pouco, que não nos trouxe conforto. Continuamos convivendo com o risco de incêndios provocados por essa fiação irregular”, desabafa o motorista Éder de Souza, de 33 anos.

Ele mora com a mulher e duas filhas pequenas na favela Tijolinho. Bem em frente à sede do governo, do outro lado da MG-010, um bota-fora de entulho de demolição, móveis velhos, pneus e lixo orgânico se formou na avenida Senhor do Bonfim, no bairro São Benedito, em Santa Luzia.

“Nossa expectativa era a de que fossem feitas melhorias na região, valorizando nossas moradias. Mas, quando chove, carro não passa no atoleiro que se forma próximo à nossa casa. Táxi também não vem na porta”, afirma o frentista Gilmar Oliveira dos Santos, de 36 anos. Ele mora com a mulher, a dona de casa Marcilene Dária Luciano, de 42, e três filhos na rua Monte Castelo, no São Benedito, a poucos quarteirões do bota-fora.

“Nossos filhos ficam limitados, pois não há opções de lazer. Só tinha o campo de futebol do Monte Castelo (time de futebol local), que foi desativado no ano passado”, diz Marcilene. Ela acompanha a movimentação no complexo do governo pela área de serviço da residência.

A intendente da Cidade Administrativa, Kênnya Kreppel Dias Duarte, cujas atribuições são as mesmas de uma prefeita, afirma que o Estado tem investido em obras para aumentar a qualidade de vida dos moradores do entorno, em parceria com as prefeituras. “A subestação de energia elétrica trouxe benefícios para a região como um todo. Recebemos retornos diários sobre o quanto melhorou para a população”. Segundo ela, será feita, no primeiro semestre deste ano, mais uma pesquisa de avaliação com a vizinhança.