Tudo começou com um simples registro de vacinação dos índios. Mas o projeto de Claudia Andujar cresceu e ganhou vida própria.
O Salão Arte Pará de 2010 já definiu o nome de uma das convidadas deste ano: trata-se da artista Claudia Andujar, que tem o maior acervo brasileiro de fotos sobre os índios Yanomami. Ela vai trazer, para o Salão, parte de seus trabalhos, que são reconhecidos internacionalmente.
As fotos dos índios, feitas nos Estados de Roraima e Amazonas, abrangem décadas – vão de 1971 até o ano de 2000. Tudo começou quando Claudia, na época repórter fotográfica da revista Realidade, da Editora Abril, teve contato com os Yanomami, tribo que começou a fotografar desde então. Era a época do Milagre Brasileiro e a região estava sendo rasgada por duas grandes estradas, a Perimetral Norte e a Transamazônica.
Na época, Claudia Andujar percebeu que essas estradas representavam uma grande ameaça para a sobrevivência dos índios, pois junto com os desbravadores – a maioria dos peões vinha do Nordeste – chegavam doenças de brancos e que começaram a dizimar as tribos. Até então, vivendo exclusivamente num relacionamento intertribal – tanto que os índios nem nome tinham, mas chamavam entre si pelo grau de parentesco -, a cultura Yanomami passou a ser ameaçada. Claudia viu também a morte de muitos operários, por acidentes de trabalho e por doenças que, com cuidados médicos, seriam facilmente tratáveis.
Já apaixonada pelos índios e pela cultura deles, em 1978 Claudia criou, em São Paulo, a ONG Comissão Pro Yanomami, da qual se tornou a coordenadora. Mas, antes disso, ela já fazia trabalhos para proteger os índios. A fotógrafa conta que até 1975, sua produção fotográfica entre a tribo era exclusivamente cultural e ligada às manifestações espirituais dos índios. Mas, com a ameaça de que a tribo fosse dizimada e pudesse desaparecer da região, o trabalho dela passou a ser mais político. ‘’Da necessidade de lutar pelo respeito à terra e a cultura indígenas surgiu a ONG’’, ressalta ela.
E Claudia mergulhou no trabalho. Viajou com dois médicos de aldeia em aldeia para levar vacinas aos indígenas, ela com o objetivo de documentar o trabalho. E, como os Yanomami não tinham nome, Claudia passou a fotografá-los com números pendurados no pescoço, que cada um recebia quando era vacinado, para completar, dessa forma, a ficha de saúde de cada um. Mais tarde, ela passou a chamar esses índios de ‘’marcados para viver’’, porque para eles a vacina significava vida e esperança de dias melhores, sem as doenças que tão facilmente poderiam acabar com a tribo. As fichas, ressalta Claudia, existem até hoje e representam um rico acervo sobre a vida e a cultura Yanomami.
PASSADO
Essa história de marcados para viver’’ tem um apelo muito forte na vida de Claudia Andujar. Ela contrapõe a eles os ‘’marcados para morrer’’ que transformaram sua vida nos anos 40. E a fotógrafa explica: ela nasceu na Suíca, mas passou a infência na Transilvânia, região que fica entre a Hungria e a Romênia. Filha de pai judeu, viveu situações difíceis já que a Hungria era aliada dos alemães. Por conta disso, toda a família usava pregada na roupa uma enorme estrela de David, o que os alijava da convivência com os conterrâneos não judeus. Nessa época, aos 13 anos, Claudia se apaixonou por um garoto da escola, de 14 anos, e que era judeu e também usava a estrela de David. Um dia, saiu com ele pela primeira vez, para um passeio às margens do rio. No dia seguinte ele foi capturado e mandado para o campo de concentração de Auschwitz, onde morreu no mesmo ano. A família paterna de Claudia também foi toda mandada para o campo de concentração e ninguém sobreviveu. Para ela, a partir desse momento, a estrela de David passou a significar a marca da morte.
Fonte: Amigos da Amazônia