Por Najla Passos
Da Carta Maior
Responsável por 23% de toda a riqueza gerada no país, o setor do agronegócio sabe que seu apoio pode ser decisivo tanto na eleição quanto na governabilidade de um presidente. Por isso, na última quarta-feira (6), a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) convocou os três candidatos melhores posicionados nas pesquisas para uma espécie de sabatina.
Ao final, cada um deles recebeu o documento “O que esperamos do próximo presidente 2015-2018”, que condensa as expectativas dos grandes produtores rurais para o próximo mandato. O setor reconhece que, na última década, o agronegócio cresceu como nunca. A produção, hoje, é 70% maior do que na época em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o poder. As commodities agrícolas responderam por 44% das exportações brasileiras nos primeiros quatro meses deste ano.
Mas os grandes produtores querem muito mais. As palavras de ordem deles são competitividade e segurança jurídica. E é em nome delas que reivindicam obras de logística, mais crédito rural, desonerações, investimentos públicos e redução do custo da folha de pagamento. E investem contra as demarcações de terras indígenas e as regularizações fundiárias de áreas quilombolas e de proteção ambiental.
Confira aqui as 8 reivindicações mais polêmicas do setor:
1 – Mais “dinamismo” na concessão de crédito rural:
No último ano do governo Fernando Henrique Cardoso, o volume de crédito para o agronegócio foi de R$ 15,7 bilhões. Em maio passado, a presidenta Dilma Rousseff lançou o maior Plano Safra da história, com a liberação de R$ 156 bilhões e a promessa que, se for necessários, liberará mais recursos para o setor. Agora, os produtores ainda querem menos burocracia para colocar as mãos no dinheiro.
No documento entregue aos presidenciáveis, afirmam o crédito rural é “complexo, com alto custo operacional, com exigência de certidões em papel e fiscalização sem efetividade”. Entre as medidas que apontam para reverter o problema, consta a aprovação, até o final de 2015, de um novo marco legal para a política agrícola, que transforme os grandes investimentos no setor em política de Estado e dinamize sua concessão.
2 – Proteção da renda do produtor
Além de crédito farto e fácil, os produtores também querem seus lucros protegidos da volatilidade da economia capitalista que eles mesmos apoiam. Reivindicam intervenção estatal para assegurar que não saiam no prejuízo, caso ocorra, por exemplo, uma crise que derrube os preços de determinado produto no mercado internacional. Segundo eles, “é inadmissível que no Brasil só 8,74% da área plantada seja segurada”.
3 – Reformulação do Mercosul
Para o setor, a participação do Brasil no Mercosul prejudica negociações bilaterais que podem aumentar o faturamento do agronegócio. Contrários à política que privilegia as relações Sul-Sul como forma de quebrar a hegemonia global, o que os produtores querem é fechar grandes acordos com os ricos, como os Estados Unidos e a União Européia. Conforme o documento, é necessária a “definição de uma estratégia de política comercial clara e objetiva, que resgate a autonomia do Brasil para negociar acordos comerciais independente do Mercosul”.
4 – Redução do “custo do trabalho”:
Como os empresários, os produtores rurais querem reduzir a proteção social dos trabalhadores para obterem mais lucros. No documento entregue aos presidenciáveis, a questão é colocada de forma tão imperativa que soa quase como ameaça: “a saída tem sido a mecanização massiva das operações, reduzindo a mão de obra em atividades que, há bem pouco tempo, eram as que mais geravam empregos no campo”.
Eles reivindicam, por exemplo, a revisão das normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho para a atividade rural. Entre elas está a NR 31, que exige banheiro ou barraca sanitária para atender aos trabalhadores rurais e a proíbe o transporte dos mesmos em pé. E também a NR 15, que normatiza o tempo e o nível de exposição do trabalhador ao sol. Os grandes produtores rurais também se somam aos empresários para exigir a regulamentação total das terceirizações.
5 – Relativização do conceito de “trabalho escravo”
Inconformados com a Lei nº 10.803/2003, que tipifica a condição de trabalho análogo ao escravo no Código Penal, os grandes produtores rurais querem relativizar esse conceito. A justificativa é que não se pode identificar com clareza uma situação de condição análoga a escravo, em razão do que eles classificam como “excessiva subjetividade” dos termos “jornada exaustiva” e “trabalho degradante”.
Entre outras medidas, o setor reivindica a revogação da instrução normativa 91/11, que faz exatamente isso e, a partir daí, compõe a lista suja dos empregadores que praticam trabalho escravo. “É preciso reformular o processo de inclusão de empregadores na lista, de forma a garantir a ampla defesa e evitar que meras irregularidades trabalhistas sejam confundidas com a prática do trabalho escravo “.
6 – Fim das demarcações das terras indígenas e quilombolas
As terras indígenas e quilombolas representam hoje a fronteira agrícola para o avanço do agronegócio. Por isso, o setor investe contra elas com toda a sua força. Na questão indígena, os principais alvos dos ataques são a Funai, que avalia atualmente a criação de 128 novas áreas, e organizações da sociedade civil como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que reivindica as demarcações de outras 339. Na quilombola, as investidas são contra a Fundação Palmares, que estuda o reconhecimento de 220 quilombos.
7 – Criminalização dos movimentos sociais de luta pela terra
Os produtores rurais sabem que, no Brasil, a reforma agrária só avança com luta dos movimentos sociais do campo, que pressupõe a ocupação dos latifúndios improdutivos e terras públicas ilegalmente usurpadas. Por isso, insistem na criminalização dos movimentos sem-terra, exigindo a “exemplar punição dos responsáveis por tais ilícitos”. “É preciso estabelecer, com urgência, que a invasão é e sempre será um ato ilegal. Invasões, como mecanismos de pressão dos ditos movimentos sociais sobre o governo, para realizar a reforma agrária, são atos ilegais e não reivindicatórios”, diz o documento.
8 – Meio Ambiente como modelo de negócio
Na área de Meio Ambiente, os produtores querem a imediata implementação do novo Código Florestal, já amplamente debatido pela sociedade até sua sanção pela presidenta Dilma, em 2012. Mas também pedem uma série de medidas adicionais que ajudem o setor a melhorar seu desempenho. Entre elas a maior margem para emissão de CO2, a adoção de um marco legal que impeça a cobrança pela utilização de recursos genéticos e conhecimentos tradicionais, a regulamentação dos biomas de modo a não frear a atividade produtiva e até a privatização das reservas de água.