Karol Dias – comunicadora popular da ASA
No dia 30 de julho, uma audiência no Fórum de Carnaubal/CE deu desfecho ao conflito agrário que demoliu brutalmente seis residências e uma casa de farinha na comunidade Lagoa do Américo, no início de setembro de 2013.
As famílias que ali moravam, estavam participando dos festejos da padroeira da cidade, no momento em que tudo aconteceu, há quase um ano.
A ação violenta foi executada por dois advogados que pretendiam vender a terra para uma empresa do mercado de energia eólica. Os mesmos foram presos junto com os operadores de máquina enquanto fugiam do local, graças a ligações de vizinhos que ouviram o barulho das máquinas. No entanto, pagaram fiança e logo saíram. Segundo Valdinar Brito, presidente da associação, ainda na delegacia eles disseram que, se as casas fossem reerguidas, derrubariam de novo.
Um detalhe importante no relato dessas famílias, posseiras há mais de trinta anos, é que faltava uma semana para receberem o resultado de um pedido de usucapião.
Solidariedade
No dia seguinte à destruição das casas, muitas organizações da sociedade civil foram à comunidade prestar apoio e pensar estratégias de resistência. Realizaram uma reunião na sede da associação na qual Valdinar Brito contou toda a história, uma vez que as vítimas, ainda em estado de choque e comoção, não conseguiam falar.
Neste dia, visitando o local do conflito, todas/os se indignavam com o cenário de destruição que soterrava bens materiais e memórias de uma história de vida e trabalho na terra.
Como encaminhamentos frente à situação, planejaram realizar uma campanha de arrecadação de recursos com o objetivo de reconstruir as casas e providenciar assessoria jurídica para as famílias.
Desdobramentos
Nos dias que se seguiram um advogado que prestava serviços de procurador à prefeitura municipal e já era conhecido das famílias, se propôs ajudar. Processaram a empresa e de início ela foi condenada a pagar um salário mínimo para cada uma, enquanto durasse o processo. O valor recebido no primeiro mês foi repassado a ele e nos meses seguintes, embolsava a metade.
Nesse meio tempo, um representante da empresa fez algumas tentativas de negociação. A princípio ofereceu uma área de 30 hectares próximo aos 17 hectares que eram das famílias. Não houve concordância, pois, de acordo com um dos moradores, se tratava de um terreno pedregoso com poucas condições de ser cultivado.
Em outra oportunidade, sugeriu que aceitassem a posse da terra e uma indenização de R$ 30.000,00 cada, encerrando assim o processo na justiça. Pensaram em aceitar, mas, não deram resposta definitiva, levando a empresa a aumentar a oferta.
Recentemente propôs a posse, uma indenização de R$ 37.500 para reconstrução das casas e R$ 40.000, 00 para escavação de um poço profundo. As famílias aceitaram o acordo mesmo sabendo que o valor não corresponde ao dano material e emocional causado. Valdinar explica ainda que “os danos morais foi de R$ 75 mil, mas, esse valor ficou pro judiciário, pros cofres públicos”.
Porém, para elas o que realmente importa é ter sua terra de volta e poder cultivá-la novamente.
Sentimentos e reflexões
O desfecho dessa história é motivo de grande alegria! “Estamos muito felizes, porque nós ficamos com nosso terreno, vão dar o documento tudo em mãos para cada um, vamos receber um poço no nosso terreno, a gente está se sentindo feliz e esperando que tudo dê certo”, conta Raimunda Nonata, uma das moradoras da área.
Voltando para sua terra já começaram os alicerces das novas casas e vasculham os escombros a fim de aproveitar a madeira das que foram derrubadas. Animadas/os, planejam fazer uma inauguração convidando a todas/os que apoiaram sua luta.
Certamente se não tivessem aceitado o acordo, o processo poderia demorar anos e elas continuariam impedidas de trabalhar no local. No entanto, o que é conquista para as famílias representa também vitória para a empresa, uma vez que favorece a possibilidade de avançar em seus empreendimentos na região e quem sabe, prejudicar muitas outras famílias agricultoras.