Marcelo Schneider – CONIC
Ao longo da história recente dos povos indígenas, há diversos tratados, declarações e leis que acabaram definhando na obscuridade ou são simplesmente ignorados.
Num misto de insulto e injúria, governos ao redor do mundo têm dito que a igreja não deve se meter em assuntos políticos. No entanto, elas, atualmente, tem cada vez mais tentado denunciar a privação de direitos dos Povos Indígenas.
O documento final da Conferência Mundial das Nações Unidas sobre os Povos Indígenas está prestes a transformar essa perspectiva. Governos do mundo todo estão, agora, convidando igrejas e outros grupos da sociedade civil para serem vistos e ouvidos quando o assunto é a defesa dos direitos humanos dos povos indígenas.
Para os representantes ecumênicos de comunidades religiosas indígenas que participaram da conferência da ONU, que ocorreu em Nova Iorque, entre 22 e 23 de setembro, o documento de 6 páginas oferece motivação extra aos que que buscam assegurar os direitos dos povos indígenas ao redor do mundo.
O documento foi assinado por todos os países-membro da ONU, no dia 22 de setembro, e reforça a Declaração sobre Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP), de 2007, virando uma página no que toca o papel dos governos.
“Através do documento, as nações do mundo afirmam que o bem-estar dos povos indígenas é essencial para o bem-estar do planeta”, declarou o Bispo Mark MacDonald, da Igreja Anglicana do Canadá. MacDonald é o primeiro Bispo Anglicano indígena do Canadá.
Ele disse ainda que os governos concordaram em estabelecer parcerias com os povos indígenas, e que o documento requer que igrejas ou outros membros da sociedade civil participem destas parcerias e defendam os acordos estabelecidos no documento.
O documento, no qual, essencialmente, governos do mundo falam para si mesmos, para a sociedade civil e para os povos indígenas, cobre uma ampla gama de preocupações, como a garantia dos direitos humanos fundamentais; a consulta e cooperação com os povos indígenas quando decisões econômicas cruciais que são tomadas em suas comunidades; o oferecimento de melhor acesso à educação, à saúde e ao trabalho; o empoderamento da juventude; a abordagem das necessidades sociais; o consentimento livre e informado; e o desenvolvimento de “planos de ação” nacionais que incluam as necessidades dos povos indígenas.
Igrejas e Povos Indígenas
“A igreja tem uma responsabilidade tanto no que tange a sua missão fundamental como órgão, como também em sua relação histórica com os povos indígenas”, declarou MacDonald.
“Esta não é somente uma afirmação da declaração adotada em 2007, mas um novo compromisso dos estados-membro, de que agora irão empreender ações intencionais e sietemáticas”, avaliou o Rev. Tore Johnsen, secretário geral do Conselho de Igrejas Sami, da Noruega. “Pelo menos eles se comprometeram com suas palavras”.
Para Johnsen e seus colegas, quando os Estados afirmam no documento que eles encorajam a sociedade civil a defender esta causa, significa que as igrejas devem “assumir um papel ativo na promoção e proteção dos direitos dos povos indígenas”.
“Para as igrejas, isto também significa assumir um papel ativo na cobrança e vigilância às nações e seus governos”, acrescentou Johnsen.
Ao mesmo tempo, admite, “tudo pode ser apenas um jogo de cena”, referindo-se a algum resultado efetivo do documento. “Mas não precisa ser assim. A igreja tem uma forte voz moral”, declarou.
May Vargas, das Filipinas, membro da delegação ecumênica, deu as boas-vindas a este encorajamento do Estado à igreja e a outros grupos. Em seu contexto, marcado por muitos casos de violência contra populações indígenas por conta da luta pela terra, “a igreja torna-se um santuário para os pobres e oprimidos”.
Tanto Vargas como Johnsen vêem um papel claro para a igreja desempenhar na situação das indústrias extrativistas, como as de mineração, de petróleo e gás, assim como na situação de violência contra as mulheres e crianças indígenas.
Em situações objetivas e diretas como estas, declarou o grupo, com o apoio das igrejas e a boa vontade dos governos em dar seguimento, a implementação do documento pode ter um impacto positivo.
“Também é importante dizer que isto também toca o Conselho Mundial de Igrejas que, em várias instâncias, trouxe à tona e defendeu a questão dos direitos dos povos indígenas”, concluiu Johnsen. Ele sugeriu que o documento também abre portas para o próprio CMI dedicar “especial atenção aos direitos dos povos indígenas”.
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por Ruben Siqueira.