Após décadas de luta, Justiça Federal anulou processo de demarcação de território explorado pela Aracruz Celulose
Any Cometti, Século Diário
As ações da comunidade quilombola de São Domingos, localizado entre os municípios de São Mateus e Conceição da Barra (norte do Estado), que serão adotadas a partir da decisão da Justiça Federal de anular o processo de reconhecimento desse território, após décadas de luta, serão discutidas em reunião entre as lideranças quilombolas e a Procuradoria do Ministério Público Federal (MPF) em São Mateus, nesta quarta-feira (17).
A anulação do processo de titulação do território quilombola foi decisão do juiz federal Nivaldo Luiz Dias, que considerou inconstitucional o decreto que regulamenta o procedimento para a titulação do território, porque os componentes da demarcação devem se autodeclarar quilombolas, o que não aconteceu no caso de 13 proprietários locais.
Tanto o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) como o MPF ainda não foram notificados sobre o caso. O Incra afirmou que, por ser uma decisão de primeira instância da Justiça, cabe recurso para reverter a anulação do processo administrativo de reconhecimento do território quilombola, o que será feito assim que a notificação for recebida.
Já o MPF, pela falta da notificação, ainda não tem conhecimento das consequências que a anulação desse processo pode acarretar aos demais. No entanto, já adianta que uma das ações civis públicas ajuizadas para agilizar o processo de regularização de territórios quilombolas em todo o País, entre eles de São Domingos, não é automaticamente cancelada com a decisão, que foi emitida sobre outro processo. Somente a partir da notificação, o MPF saberá das consequências dessa decisão sobre a ação civil.
No caso do território de São Domingos, classificado como um dos exemplos mais claros de descaso em relação aos territórios quilombolas no País, os promotores constataram uma série de medidas tomadas pelos órgãos competentes para praticamente paralisar o processo de reconhecimento das terras. A área é explorada pela Aracruz Celulose (Fibria) desde a ditadura militar e por fazendeiros reunidos no Movimento Paz no Campo (MPC), além de empresas de álcool e cana-de-açúcar.
No antigo território de Sapê do Norte, as famílias quilombolas enfrentam fome e miséria, sem possibilidades de produzir alimentos para subsistência e sequer manter sua cultura tradicional. Ilhados pelos eucaliptais, sofrem os impactos sociais e ambientais gerados por esta monocultora, que exige intenso uso de agrotóxicos, além de provocar empobrecimento e desertificação do solo.