Não está provado que a fé mova montanhas, mas o poder de bloquear a criminalização da homofobia ela já demonstrou. A mobilização de grupos religiosos e de parlamentares ligados à causa, com destaque para os evangélicos, mantém há oito anos no limbo do Congresso o Projeto de Lei 122, que poderia ser aplicado em casos como o do incêndio criminoso de Santana do Livramento
Itamar Melo – Zero Hora
Apresentada em 2006 na Câmara dos Deputados, a proposta prevê pena de até cinco anos de prisão para quem cometer atos diretos ou indiretos de discriminação ou preconceito motivado pela orientação sexual. O texto chegou a ser aprovado na Câmara dos Deputados, mas não foi adiante no Senado. Em sua última encarnação, ficou sob os cuidados do senador gaúcho Paulo Paim.
– Quando o projeto veio para o Senado, ninguém queria relatar. Acabei pegando. Fiz um trabalho de costura e articulação com os evangélicos, com a Igreja Católica, com a comunidade LGBT, em busca de uma redação de entendimento. Estávamos quase chegando a um acordo – conta o senador.
Depois de um amplo acerto, o termo homofobia foi excluído. A ideia era enquadrar o delito como crime de ódio, motivado pela orientação sexual. Aplicavam-se as regras válidas para o racismo no que diz respeito às penas e ao caráter inafiançável e imprescritível. Se o projeto tivesse sido aprovado, além de responder pelo crime contra o patrimônio, os incendiários de Livramento poderiam ser enquadrados na legislação, caso se comprovasse que o fogo teve como causa a discriminação contra a união gay. O projeto, no entanto, não chegou à votação.
– De repente, os grupos religiosos começaram a dizer: “Paim, o 122 está demonizado. O texto é razoável, mas tem de mudar o número”. Estávamos perto do entendimento, mas voltaram atrás dizendo que o número estava demonizado. É complicado – afirma o senador.
Em seguida, foi apresentado e aprovado um requerimento para que o assunto fosse encaminhando à Comissão de Constituição e Justiça, para ser anexado à discussão sobre a reformulação do Código Penal. O trabalho de Paim foi para o cesto de lixo. Como seu texto não havia sido votado, o projeto que veio da Câmara é que foi encaminhado.