Em consulta prévia no Vale do Javari realizada dentro de igreja evangélica, o Ministério da Saúde aprovou a criação de instituto sob crítica de lideranças e protestos por todo o Brasil
por Felipe Milanez, na CartaCapital
“O Estado é laico, mas feliz é a nação cujo Deus é o senhor…” declarou a presidenta Dilma ao participar da inauguração do Templo de Salomão, em São Paulo, mês passado. Do sudeste do país a determinação bíblica parece ter alcançado o noroeste da Amazônia. Ao invés de utilizar algum espaço público como uma escola ou a própria Universidade Federal do Amazonas, no município vizinho de Benjamin Constant, para apresentar um novo programa que impacta diretamente a vida das comunidades indígenas, a criação do Instituto Nacional de Saúde (INSI), o governo preferiu um espaço de culto evangélico — religião cuja ação proselitista de missionários é uma das principais causas de conflito com comunidades indígenas na região — e esse tornou-se um espaço político desse Estado que é laico, “mas”…
No sábado 30 de agosto, em Atalaia do Norte (AM), o governo federal realizou uma “consulta prévia” à população indígena do Vale do Javari, representada pelo Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi). O local foi uma igreja da Assembléia de Deus. O tema é de direto interesse da população indígena, e por isso deveriam ser consultados: a criação do Instituto Nacional de Saúde Indígena, proposta da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) para a execução das ações da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI). Essa consulta pública que presenciei é o último ato de um processo que levou alguns dias ali. Há 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) no Brasil, e este processo de consulta aos conselhos (cada Condisi tem representações de indígenas, ongs e do governo) está acontecendo em todos eles. Segundo relatos que tenho recebido, as votações sobre a criação do INSI tem sido criticadas pelos indígenas, assim como aconteceu em Atalaia, envolvendo manipulações e pressa para se legitimar a decisão tomada em Brasília. Ao menos, é o que acusam as diversas cartas e protestos do movimento indígena.