Uma semana depois da reintegração de posse, realizada nas terras da antiga fábrica de Cotonifício, em Moreno, as famílias de trabalhadores sem teto encontram-se indignadas e relatam total abandono e descaso por parte da prefeitura do município e do Estado. Parte destas famílias foi acolhida pelos trabalhadores rurais ligados ao MST que ocupam o Engenho Una, bem como os próprios sitiantes do local, que também está localizado no município de Moreno. Estas encontram-se atualmente alojadas de maneira improvisada na Casa Grande e no Galpão do Engenho.
As famílias, entrevistadas pela CPT, relataram as violações de direitos ocorridas no momento da reintegração de posse. Lucicleide Maria da Silva, de 33 anos, auxiliar de cozinha, classificou a ação do Estado como desumana. A trabalhadora sem teto, mãe de cinco filhas, comenta que no momento do despejo, cerca de 300 famílias encontravam-se no local. Muitas crianças e jovens portadores de deficiência foram colocados na rua sem ter para onde ir. “Todas estas famílias não tem pra onde ir, não tem casa, não tem terra, não tem nada. A gente vivia de aluguel e não tinha condições de pagar. Não vou botar minhas filhas na rua. Se não fosse isso aqui [solidariedade dos trabalhadores rurais], não sei onde a gente estaria agora”.
O auxiliar de pedreiro, mas atualmente desempregado, Damião Cabral de Araújo, 46, conseguiu com dificuldade, assim como as outras famílias, evitar que seus poucos móveis e pertences fossem perdidos ou destruídos no momento do despejo. Damião também está vivendo há uma semana de maneira improvisada em um comodo da Casa Grande, juntamente com seu filho de 23 anos, portador de deficiência. Vivendo de aluguel há mais de 20 anos, Damião conta que nasceu no Engenho Cumaru, em Moreno e que, sem condições de permanência no campo decidiu tentar a vida na cidade, mas relata que nunca teve condições de morar de aluguel. “Hoje a gente vê esse mundo de terra parada, tudo parado, e a gente sem nada, nem uma casa”, denuncia.
A ação de reintegração de posse foi realizada por aproximadamente 500 homens do Batalhão de Choque, juntamente com o canil. Trabalhadores sem teto e sem terras também denunciam a presença de Policiais disfarçados na ocupação antes do despejo, além de relatarem que alguns deles cobriram os rostos no momento da ação. Estas famílias ocupavam as terras da antiga fábrica de Cotonifício há quatro meses e reivindicam a desapropriação da área para garantir moradia às famílias sem teto e terra, para os agricultores e agricultoras. A área, segundo informações, possui aproximadamente 1.409 hectares e a reintegração de posse foi movida, pelo proprietário da imóvel, no Poder Judiciário/Comarca de Moreno.
Os trabalhadores e trabalhadoras Sem teto e o MST denunciam ainda que recaí sob o proprietário do imóvel uma série de dívidas públicas e exigem, além da desapropriação da área, que seja realizada investigação e esclarecimento sobre o montante das dívidas. Em setembro do ano passado, uma pequena parte do imóvel, cerca de 4 hectares, foi desapropriada pelo Governo do Estado para a construção de uma escola técnica. O restante do imóvel vinha servindo, para os proprietários, para especulação imobiliária. A Fábrica de Cotonifício foi fundada em 1910, com o nome de Societè Cotonniere Belge-brasiliense por empresários belgas e está desativada desde 2001. De acordo com lideranças da ocupação e do MST, as famílias pretendem continuar mobilizadas e permanecerão reivindicando a desapropriação do imóvel. Uma audiência pública para tratar sobre a questão está sendo planejada e deverá ser realizada nas próximas semanas.
Outras informações:
Comissão Pastoral da Terra – Regional Nordeste II
Renata Albuquerque
Fone: (81) 9663.2716