João Fellet, da BBC Brasil
A denúncia foi feita na quarta-feira da semana passada (23 de julho) em uma reunião entre líderes kayapós e autoridades na sede da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Tucumã, município vizinho a Ourilândia do Norte.
A região enfrenta um surto de garimpo que tem poluído rios e destruído vastas áreas de floresta em um dos últimos redutos de mata nativa no sudeste do Pará.
“A PM e a Civil vão toda sexta no rio Branco e no rio Fresco para receber um grama e meio (de ouro) por cada balsa”, disse, na reunião, o cacique Niti Kayapó, da aldeia Kikretu.
Segundo a Funai, os garimpeiros operam nos dois rios cerca de 90 balsas. Os equipamentos reviram o solo dos rios em busca do metal.
Levando em conta o preço atual do grama do ouro (R$ 93), a coleta renderia à polícia, segundo a denúncia, R$ 12.510 por semana, ou cerca de R$ 50 mil por mês.
O cacique não informou se o valor era dividido entre as polícias Civil e Militar ou se cada uma arrecadava esses valores individualmente.
Segundo Niti, os agentes chegam até os garimpeiros em viaturas policiais por uma estrada vicinal. Outros índios confirmaram a denúncia no encontro.
Presente na reunião, o primeiro tenente da PM paraense Bruno Gama Pereira disse que a polícia abriria um inquérito para apurar a denúncia.
Pereira afirmou à BBC Brasil que, caso a investigação encontre indícios de que de fato houve pagamento de propina, os agentes serão julgados pela Justiça Militar.
Segundo ele, a corregedoria da PM se encarregaria da ação.
A Corregedoria da Polícia Civil do Pará diz que também apurará o caso. Responsável pelo órgão, a delegada Nima Lima afirmou à BBC Brasil que ainda não foi comunicada da denúncia, mas que procuraria a Funai para obter a ata da reunião e dar início à investigação.
Garimpo descontrolado
A Terra Indígena Kayapó convive com surtos esporádicos de garimpo há décadas. Segundo a Funai, porém, a atividade alcançou níveis sem precedentes nos últimos meses.
A coordenadora-geral de monitoramento territorial da Funai, Thaís Dias Gonçalves, diz que o território é a área indígena do país onde o garimpo está mais descontrolado.
O território – que ocupa cerca de 33 mil quilômetros quadrados, área equivalente à de Alagoas e do Distrito Federal somados – é quase inteiramente coberto por mata nativa, mas a floresta vem sendo destruída rapidamente pelo garimpo.
Segundo a Funai, há cerca de 5 mil garimpeiros na área – o equivalente a quase um terço da população indígena residente (16 mil).
A BBC Brasil acompanhou uma operação contra o garimpo na área na semana passada. De helicóptero ou avião, veem-se as enormes clareiras com lagos artificiais abertos pelas escavadeiras.
Algumas frentes de garimpo têm dezenas de quilômetros quadrados.
Agentes da Funai e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) desceram em alguns pontos e deram prazo de dez dias para que os garimpeiros deixassem a área.
Os órgãos afirmam que, ao fim do prazo, voltarão ao local para destruir equipamentos e expulsar garimpeiros que tenham permanecido.