Justiça manda Incra publicar estudo que reconhece Rio dos Macacos como território quilombola

somos-quilombo-rio-dos-macacos-300x228Relatório sobre “Rio dos Macacos” deve ser divulgado em 30 dias. Documento deve ser usado para processo de demarcação de terras

Do G1 BA

A Justiça determinou prazo de 30 dias para a divulgação do relatório técnico que considerou a comunidade do Rio dos Macacos, perto da Base Naval de Aratu da Barragem, em Simões Filho, território quilombola. O estudo, que foi concluído no ano de 2012 pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), ainda não foi publicado oficialmente em edital.

A decisão da juíza federal Arali Duarte, da 1ª Vara Federal de Salvador, divulgada nesta quinta-feira (5), foi motivada por uma ação civil pública ajuizada em conjunto pela Defensoria Pública da União na Bahia (DPU-BA) e pelo Ministério Público Federal. A DPU informa que a União não foi notificada até o momento. O G1 não conseguiu contato com o Incra nesta noite de quinta-feira.

A comunidade disputa posse de terra com a Marinha. De acordo com o DPU, que defende os moradores do quilombo, a publicação do estudo é necessária para a análise de órgãos como Fundação Palmares, Instituto do Patrimônio Histórico e Nacional (Iphan) e Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Na avaliação da Defensoria, não há motivo que justifique a paralisação do processo por tempo indefinido, tendo em vista o tempo longo que ainda vai levar o processo administrativo para depois ser feita a delimitação, demarcação e a titulação das terras.

O defensor Átila Ribeiro Dias afirma que a paralisação do processo contribui para acirrar os conflitos entre a Marinha e a comunidade. A DPU explica que o relatório é indispensável e foi solicitada pelo Rio dos Macacos em novembro de 2011.

Na pesquisa de campo, realizada por uma equipe multidisciplinar, ocorreram etapas como reuniões, visitas e entrevistas com moradores, reconhecimento e mapeamento dos lugares relevantes para vida passada e presente da população dentro do território.

A DPU ainda diz que o relatório já deveria ter sido enviado para publicação em edital por duas vezes consecutivas, o que não aconteceu. “Se o relatório tivesse sido publicado logo após a sua conclusão em 2012 e todos os outros atos tivessem sido realizados nos prazos determinados, o processo poderia já ter sido concluído. Se decidido pela titularidade das terras à comunidade, os títulos de propriedade já teriam sido emitidos”, disse Dias.

Em maio, o MPF/BA intermediou nova rodada de negociação entre a comunidade quilombola Rio dos Macacos e o Governo Federal, terminou mais uma vez sem acordo.

Conflito e tentativa de negociação
Os quilombolas reivindicam a integração da comunidade, a preservação dos sítios sagrados, como os terreiros de Candomblé, além de maior número de terras para o desenvolvimento da agricultura e o uso compartilhado da barragem de água existente no local, sob administração da Marinha.

Em relação ao território de 300 hectares ocupado pela comunidade, os representantes disseram estar dispostos a abrir mão de cerca de 22 hectares, localizados no entorno da Vila Militar, e da barragem. Os quilombolas reforçaram a impossibilidade de se adequar à proposta feita pelo Governo, que reduziria a área para 86 hectares.

Após a rejeição da proposta apresentada pelo Governo, o assessor da Secretaria Geral da Presidência da República, Silas Cardoso, apresentou uma versão aperfeioçoada da proposta em março, aumentando o território de 86 para 104 hectares. Ele afirmou que não existe a possibilidade de uso compartilhado da barragem, mas garantiu a construção de um açude para atender às necessidade da população local.

O MPF defende a suspensão do processo judicial que tenta remover a comunidade da área da União, para que as negociações entre as partes tenha seguimento sem a pressão sofrida pelos quilombolas. Para Deborah Duprat, subprocuradora-geral da República e coordenadora da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF (6ª CCR), a comunidade não tem como  continuar negociando com a pressão de um processo judicial e de uma medida liminar favoráveis à Marinha.

Em função do posicionamento adotado pelo MPF, o advogado Geral da União, Bruno Cardoso, se comprometeu a interpor recursos pedindo a suspensão do processo judicial e da liminar assinada no final de março, que impede a reforma das casas da comunidade. O chefe do gabinete do ministro da Defesa, Antônio Lessa, se comprometeu a levar a contraproposta da comunidade ao ministro e ao comando da Marinha, na tentativa de prosseguir com as negociações. 

Histórico
As negociações da demarcação do território foram iniciadas em audiência pública em 2013 e a comunidade quer permanecer na terra que já é ocupada pelo quilombo há mais de 100 anos.

Desde 2009, membros da comunidade e da Marinha disputam na Justiça Federal a área conhecida como Barragem Rio dos Macacos, localizada na Base Naval de Aratu, Região Metropolitana de Salvador. Uma decisão liminar proferida em novembro de 2010 foi favorável ao pedido da ação reivindicatória proposta pela Marinha e ordenou o despejo das famílias.

Há um ano, o juiz Evandro Reimão dos Reis, titular da 10ª Vara Federal, manteve a sentença, sem suspender seus efeitos até o pronunciamento da instância superior, e ordenou o despejo dos quilombolas, mas até agora nenhuma medida de execução foi tomada.

O governo federal tenta acordo para transferir os moradores para outro terreno da União, mas os quilombolas, que há várias gerações ocupam a área, resistem em sair do local. Estudo técnico realizado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) apurou detalhes sobre a ocupação e  reconheceu a área como terreno quilombola.

O conflito com a Marinha começou na década de 70, depois que a Base Naval de Aratu foi construída e a União pediu a desocupação da área. Com isso, em 2009 os moradores do quilombo solicitaram uma intervenção do MPF que agora atua junto à Justiça para provar que eles são remanescentes de escravos e têm o direito de posse.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Mayron Borges.

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.