Porto do Açu, o lugar em que quase tudo é “quase”

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Por Marcos Pedlowski

Tem gente que acha que eu implico com o Porto do Açu, mas a verdade é que não me opus ao empreendimento, apenas à forma adotada por Eike Batista e pela CODIN para instalá-lo no V Distrito de São João da Barra. É que na forma adotada, centenas de famílias de trabalhadores rurais tiveram suas terras subtraídas e muitas ainda esperam o pagamento dos valores miseráveis que o (des) governo de Sérgio Cabral/Pezão decidiu que elas valiam.

Agora uma matéria do Jornal Folha da Manhã me fez aumentar a minha impressão pessoal de que nem os novos donos estadunidenses estão conseguindo dar forma a um empreendimento que Eike Batista lhes entregou totalmente torto. Começando pela manchete e indo pela matéria adentro, o que se vê são repetições de promessas antigas e indicações de novas direções para ver se o Porto do Açu não afunda.

À primeira vista, a mudança de vocação apontada na manchete não seria um problema, mas dado o tamanho inicial do projeto e tudo o que prometia em sua retroárea, o que se subentende é que o empreendimento realmente vai encolher brutalmente, já que a área de petróleo a que a matéria se refere provavelmente não se coloca no filé mignon do refino. Mas afora a informação de que os terminais continuam inconclusos e que a linha de transmissão de energia só deverá ficar pronta no final de 2016 indica que os custos da Prumo continuarão sendo muito altos para tocar o pouco que foi instalado. Este fato deve, ou pelo menos deveria, estar ligando os sinais de alerta na sede do Grupo EIG em Washington DC, visto que a Prumo acumulou só em 2013 prejuízos na ordem de US$ 60 milhões. 

Mas um dado precioso e que merece atenção é a informação inserida na matéria é que dos 7.000 hectares desapropriados pela CODIN para beneficiar o Grupo EBX, apenas 1.000 estariam tendo algum uso até o momento. O fato é que este dado não me parece real, e o mapa abaixo pode ajudar aos leitores a entenderem o porquê do meu ceticismo.

mapa porto do açu

É que em minha andanças na região do Açu, apenas verifiquei o uso de parte da área que está no interior do circulo vermelho, próximo da área oceânica. Já para o resto da área desapropriada, não há efetivamente nada feito, ficando a região ocupada apenas por torres de transmissão de energia, as quais se encontram como aponta a matéria da Folha da Manhã, sem os cabos! Em outras palavras, toda essa terra desapropriada se encontra literalmente improdutiva! E como as empresas anunciadas na matéria são velhas promessas, questiono se sua instalação (seja lá quando isso for acontecer) vá mudar o cenário de terra improdutiva que o Porto do Açu gerou no V Distrito de São João da Barra. 

Para piorar o cenário do “quase” no Porto do Açu, outra matéria que eu encontrei hoje, só que no Jornal O Globo, onde o tema é a escolha preferencial de grandes mineradoras como a Rio Tinto e a BHP Hilliton pelas grandes jazidas de minério de ferro existentes na Austrália para abastecer o mercado chinês.

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É que enquanto a viagem do Brasil (do Porto do Açu incluso) leva em torno de 45 dias, o percurso da Austrália é de apenas 15 dias. Dai não é preciso ser grande analista de mercado para estimar que a concorrência com o ferro australiano se tornará praticamente inviável, o que deverá repercutir diretamente no projeto da Anglo American em Conceição de Mato Dentro que, por sua vez, ainda é um dos alicerces reais do Porto do Açu. Em outras palavras, a mudança de vocação é fruto de realidades que extrapolam o contexto imediato de São João da Barra. Resta saber se a Prumo vai conseguir operar essa mudança ou vai ficar no “quase”.

Enquanto isso, no que realmente me interessa, as centenas de famílias que foram desapropriadas estão privadas desse meio de sobrevivência e nós todos dos alimentos que eles produziam. E esse é a única coisa que não é “quase” no Porto do Açu.

[Enviada para Combate Racismo Ambiental por Ruben Siqueira]

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