Como é impossível postar aqui o texto inteiro, porque ele só está disponível em pdf, brechtianamente socializo a maravilhosa conclusão, esperando que ela incentive à ida até o Taqui Pra Ti e à leitura do artigo inteiro. E agradeço a Stéphen Bry pelo envio. (Tania Pacheco)
“Vou concluir lembrando um fato real que me foi contado pelo escritor português Antônio Alçada. Ele estava fazendo turismo na Grécia com um grupo de amigos portugueses, lá numa daquelas ilhas gregas. Estava em pé, parado, conversando com esses amigos, quando passou um grupo de turistas japoneses, carregados de máquinas fotográficas. Até aí nada demais, porque tem turista japonês em qualquer biboca do mundo. Enquanto os turistas japoneses prosseguiram seu caminho, um deles parou diante do grupo lusitano, ficou olhando e ouvindo os portugueses por alguns minutos, depois se aproximou e perguntou num perfeito português com sotaque paulista: “Desculpa. Eu sou brasileiro. Vocês são portugueses?” O Antônio Alçada respondeu: “Somos”. O “japonesinho” de São Paulo, então, deu um longo e estridente assobio para o grupo dele que havia se distanciado. Todo mundo virou a cabeça para trás e ele gritou: “Ei, pessoal! Venham aqui que eu encontrei um grupo dos nossos antepassados”. O escritor português contou que sentiu uma sensação estranha e pensou: “Eu? Antepassado desses japoneses? Como? Se os pais deles deviam estar numa ilha, lá no Japão, na geração anterior, e não têm nada que ver comigo”.
Acontece que tem, porque nesse caso o imigrante que chega aqui no Brasil acabou assumindo a cultura e a história do país, embora muitos deles mantenham suas ‘pátrias chicas’. Desta forma, assumiu um passado que não é dele individualmente, nem de sua família, mas é coletivo, da nação, do povo ao qual ele agora pertence, mesmo mantendo algumas das particularidades da cultura de origem. Nesse sentido, é claro que o imigrante, muitas vezes bilíngüe, que fala a língua de seus pais, mas aprendeu o português e se tornou brasileiro, pode ver num português o seu antepassado histórico. A questão que se coloca é se esse mesmo “japonesinho de São Paulo” teria a mesma reação diante de um grupo de índios ou de negros. Ele costuma reivindicar apenas a matriz européia, que nos deu a língua que falamos e que marcou inapelavelmente nossa cultura, e da qual temos motivos para nos orgulhar. No entanto, seria recomendável que ele conhecesse e tivesse orgulho da contribuição dos povos indígenas e das diferentes culturas africanas que também e tão bem marcaram a nossa forma de ser. Mas ele está marcado pelo discurso dominante, ignorante e boçal, como o de Paulo de Frontin, que se envergonha dessas matrizes e pretende eliminá-las. O que deve ser eliminado é esse tipo de discurso.
Esses não são os únicos equívocos que cometemos em relação aos índios e a nós mesmos, mas talvez sejam aqueles que mereçam urgentemente ser discutidos”.
Excelente texto !!!