Estudo sobre população de rua mostra perfil masculino, envelhecido e disposto a trabalhar

São várias as causas que levam pessoas a viver ao relento, como este grupo que ocupa calçada na Avenida do Contorno
São várias as causas que levam pessoas a viver ao relento, como este grupo que ocupa calçada na Avenida do Contorno

Dados foram coletados pela UFMG e vão ajudar os agentes públicos a traçar plano para lidar com o cenário

Por Jefferson da Fonseca Coutinho, no Estado de Minas

É delicado e não há quem dê conta do assunto. A população de rua está envelhecendo sob as marquises e ao relento. Os números do último censo, detalhados nessa quarta-feira pela Prefeitura de Belo Horizonte e Pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), apontam um perfil masculino, envelhecido e disposto a deixar as ruas por meio do trabalho. Com a diversidade de dados coletados e a identificação de 1.827 pessoas em situação de rua em mãos, agentes públicos, voluntários e representantes da sociedade civil vão traçar um plano de medidas efetivas para lidar com o problema social.

Para Gladston Figueiredo, de 40, da Pastoral Nacional do Povo da Rua, trata-se de um fenômeno de muitas causas e que requer a atenção de todos. “Não existe solução que não seja de políticas multissetoriais”, ressalta. Soraya Romina, coordenadora do Comitê de Acompanhamento e Monitoramento da Política Municipal para a População de Rua, fala em grupos de trabalho para a análise cuidadosa de cada caso, “com respeito à dignidade” do indivíduo, levando em conta que “ninguém pode se estabelecer no espaço público”.

De acordo com os especialistas, a pesquisa dá indicativos “absolutamente relevantes” para novas ações de políticas públicas. Fatores como a vontade de deixar as marquises; o aumento da violência contra a pessoa em situação de rua – alto índice de abuso sexual contra as mulheres –; questões familiares; a relação com as drogas e o histórico de trabalho dos entrevistados podem traçar novos caminhos de empenho e engajamento.

Outro fator corroborado pelos pesquisadores foi em relação aos abrigos: a maioria dos entrevistados prefere à rua às unidades de acolhimento institucional. Para muitos, o motivo é a existência de um conjunto de regras de convivência, com horários controlados e proibições. Soraya Romina, da PBH, admite avaliar a questão em grupo, dentro do que poderia ser razoável.

AINDA HÁ SONHOS

Na Região Centro-Sul, o casal J., de 28, e M., de 29, esperam por dias melhores. Os dois sonham vida melhor longe das marquises. “Meu sonho, tem hora que sim, tem hora que não, é voltar para a minha família em Montes Claros”, diz J. O moço, que já foi funcionário da Fiat e teve “conforto de gente normal”, tem todo o apoio da mulher para tentar vida nova. “Não tenho nada, mas sou feliz. Só tenho a minha esposa, minha roupa e meus 17 cachorros”, sorri.

No barraco improvisado, um colchão de casal, três cadeiras de escritório e muita ração para os cães. M., vinda de Caeté, está nas ruas há seis anos. Embora admire os sonhos do companheiro e até sonhe – “tem dia” –, ela diz não ser de muita esperança. “As pessoas vêm aqui, falam que vão ajudar, anotam um monte de coisa e não voltam mais…” A moradora de rua está apreensiva com as novas ações da fiscalização. “Eles tomam tudo da gente”, lamenta.

Sem perspectivas, A., de 48, de São Pedro do Havaí, em Manhuaçu, Zona da Mata Mineira, desabafa: “Não estou aqui por escolha. O que eu mais queria era ter um barracão para morar com as minhas filhas”, emociona-se. A. conta ter perdido a mulher, vítima de infarto, há seis anos. Do amor do casal, as gêmeas L. e L., de 10, que estão morando com uma tia em Vespasiano, na Região Metropolitana. “De vez em quando a tia traz as duas para me ver”, sorri.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.

 

 

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