Por Elaíze Farias, no Amazônia Real
O terceiro laudo do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), órgão vinculado ao Ministério de Minas e Energia, sobre o aterro na maior área de lazer de Manaus, a praia da Ponta Negra, diz que a superfície da beira do rio continua irregular, com desníveis abruptos e depressões (buracos), colocando em risco a vida dos milhares de banhistas que frequentam o local.
O aterro em 600 metros dos 2 quilômetros da praia da Ponta Negra fez parte do projeto de revitalização do balneário, iniciado na administração do ex-prefeito Amazonino Mendes (PDT). A ideia da gestão era tornar a praia perene o ano todo, mesmo no período da enchente.
Mas, a superfície irregular da areia, com crateras com mais de 6 metros de profundidade, provocou 16 mortes por afogamentos entre os meses de julho e novembro do ano passado, logo após a reabertura da praia. O aterro custou aos cofres públicos R$ 12 milhões.
A CPRM fez dois laudos sobre a área. Um em novembro de 2012 e outro em fevereiro de 2013. Elaborado em novembro de 2013, o terceiro laudo da CPRM, o qual o portal Amazônia Real teve acesso, diz que nenhuma alteração no método de aterramento da praia da Ponta Negra foi adotada pela atual Prefeitura de Manaus, comandada pelo prefeito Arthur Virgílio Neto (PSDB).
Segundo o novo documento, o leito do rio Negro na parte aterrada permanece com superfície irregular. A areia que é depositada na praia, vinda de outras áreas do Amazonas, continua sendo apenas lançada no leito do rio por meio de balsas, sem o bloqueio de um muro de contenção – obra que chegou a ser anunciada quando a praia perene ainda estava apenas na maquete.
O terceiro laudo da CPRM reúne informações do levantamento batimétrico. O estudo foi executado entre os dias 06 e 18 de novembro deste ano na praia da Ponta Negra, a pedido da Prefeitura de Manaus, por meio da Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seminf), conforme acordo de um termo de ajuste de conduta do Ministério Público do Amazonas. O laudo foi entregue no final do mês passado à administração municipal.
Vazante
E por que nenhum afogamento foi registrado de julho a novembro de 2013? Para a “sorte” dos banhistas, além das medidas de segurança na parte terrestre da praia adotadas pela prefeitura em 2013, a vazante (descida das águas) deste ano não foi significativa. O nível mínimo das águas do rio Negro no local foi de 19,35 metros, registrado no dia 04 de novembro desde ano. Essa marca é considerada alta já que a média da vazante na localidade é de 17,52 metros.
O superintendente da CPRM, Marco Antônio Oliveira, disse ao Amazônia Real que o nivelamento do leito continua superficial e que, portanto, “a situação não mudou” em relação a 2012. Segundo ele, da forma como está sendo construída a praia perene, será preciso “um monitoramento eterno”, com necessidade de se redobrar a atenção todos os anos no período da vazante.
Em 2012, o nível mínimo do rio Negro na vazante foi de 15,96 metros, registrado no dia 27 de novembro. Em 2011, a cota mínima chegou a 17,30, ocorrida no dia 14 de novembro. Em 2010, ano da maior vazante, o rio Negro chegou a marca mais baixa no dia 24 de outubro com 13,63 metros.
“O que aconteceu em 2013 é que o nível das águas rio não desceu tanto como em 2012. Os banhistas não conseguiram chegar onde estão os buracos da praia aterrada. Os buracos estavam mais longe e não havia como ter acesso a eles. Tudo vai depender da variação do rio daqui para frente. Se o rio atingir um valor (cota) abaixo da média, chegará ao nível crítico”, afirma Marco Antônio Oliveira.
Segundo o laudo da CPRM, nos anos em que a cota do rio Negro atingir a marca crítica de 17 metros, será preciso maior atenção às medidas de segurança. “Na presença de depressões e desníveis abruptos na praia, a situação de risco para o banhista é condicionada pela variação sazonal do nível do rio. No período crítico de vazante, principalmente aquelas que atingem valores abaixo da média de 17,52m, é preciso maior atenção às medidas de segurança, dentre elas, a delimitação da faixa de balneabilidade dada pela marcação das boias do Corpo de Bombeiros”, diz o laudo.
Procurada, a Seminf respondeu por meio da assessoria de imprensa que a Prefeitura de Manaus, de posse do laudo, busca adequações na estrutura da praia perene, conforme recomendações do documento. Segundo a Seminf, uma equipe de engenheiros e outros profissionais técnicos está analisando as especificidades da área com o objetivo de sanar o problema de relevo e evitar problemas futuros. Após a conclusão deste estudo, a CPRM voltará a ser consultada.
“A Prefeitura de Manaus busca aprimorar a segurança dos frequentadores da praia da Ponta Negra, conforme acordo estabelecido entre o Poder Público Municipal e demais instituições envolvidas no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) selado junto ao Ministério Público do Estado (MPE/AM) no primeiro semestre deste ano”, conclui a nota.
Dezesseis morreram
Entre julho e novembro de 2012, 16 pessoas morreram afogadas na praia da Ponta Negra, segundo dados da Polícia Civil do Amazonas. A maioria dos óbitos foi registrada no 6º Distrito Integrado de Polícia (DIP), na zona Norte de Manaus.
Os familiares das vítimas relataram em depoimentos que os corpos das vítimas foram encontrados em “buracos”. Segundo parentes, as vítimas nadavam ou apenas se deslocavam nas proximidades e, subitamente, eram “sugadas” para as crateras.
Com a repercussão das primeiras mortes (ocorridas em julho e agosto), a praia foi interditada em setembro de 2012. Ao ser reaberta em outubro, novos afogamentos foram registrados.
O elevado número de vítimas fatais levou a Câmara dos Vereadores a pedir do Serviço Geológico do Brasil um laudo técnico para caracterizar a situação de risco da praia. No primeiro levantamento, a vistoria já havia apontado desnível abruto e irregularidades no aterro, com profundidades que variavam de 0,5 metros a mais de 6 metros.
Conforme consta no primeiro laudo, a distância entre a linha de praia, na cota de 16,87m do dia 13 de novembro de 2012 e a frente do aterro e depressões submersas formavam faixas estreitas com no máximo 30 metros de extensão em direção ao rio, na área de areia do aterro.
O laudo dizia ainda que, com o mínimo de descuido, o banhista podia alcançar as depressões presentes no relevo, já que a passagem das áreas rasas para as partes mais profundas ocorre de forma abrupta em toda a extensão frontal da área aterrada.
Um segundo laudo emitido em fevereiro de 2013 diz que, com a elevação contínua do nível do rio, não haveria risco do banhista cair no desnível. Um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi assinado entre a Prefeitura e o Ministério Público Estadual para se estabelecer medidas de segurança de prevenção contra afogamentos. Meses depois, a praia foi reaberta. Atualmente, ela voltou a ficar fechada aos banhistas devido as obras de continuação da praia perene.
Processo na justiça
No início de 2013, algumas famílias de vítimas de afogamentos iniciaram um processo de pedido de indenização e de criminalização contra a Prefeitura de Manaus. A reportagem do Amazônia Real encontrou uma destas pessoas. Andréia Nóbrega, mãe de Maurício Nóbrega Ribeiro, que morreu aos 11 anos, disse que entrou com pedido de indenização por danos morais e coletivos por meio da Defensoria Pública Estadual. Andréia ficou marcada não apenas pela morte do filho, mas também pela suspeita de ela ter sido negligente com a segurança do menino, fato que ela sempre negou.
“Foi muito triste. Eu e meu filho estávamos nos arrumando para sairmos da praia quando ele rapidamente sumiu na areia. Fui acusada e até hoje é ruim escutar que a culpa foi minha”, conta Andréia, que está grávida de quatro meses de uma menina. “Estou me recuperando, trabalhando e casada novamente. Casei de novo com o pai do Maurício. Mas continuo brigando na justiça”, diz Andréia.
Eu acho que nessa questão é fundamental para a segurança dos banhista, fechar a praia por um tempo e construir uma forma de barragem antes do trecho da praia e após ele, com vazão do curso do rio através de tubulação de um ponto de barragem a outro, de modo a possibilitar a secagem temporária do trecho da praia de Ponta Negra para a pavimentação com concreto apenas nesse trecho do rio, de modo a evitar que a areia esburaque e provoque novos acidentes. Tal medida, à primeira vista mirabolante e até anti-ecológica, não impactaria o restante do curso e do leito do rio, pois a vazão continuaria após o trecho da praia de Ponta Negra durante as obras, graças ao sistema de tubulação da água de um ponto a outro de barragem e o leito de concreto existiria apenas nesse trecho do rio. Logo após as obras prontas, as barragens poderiam ser retiradas sem nenhum problema e deixariam de existir, o rio fluiria normalmente como sempre, sem alteração na paisagem, no curso, volume e fluxo. Fica a sugestão.