Governo do Amazonas é sócio de frigorífico acusado de dano ambiental

A Moratória da Carne quer coibir a produção de gado em área de desmate ilegal (Foto: Alberto César Araújo)
A Moratória da Carne quer coibir a produção de gado em área de desmate ilegal (Foto: Alberto César Araújo)

Kátia Brasil, Amazônia Real

O frigorífico Frisam/Agropam – Agricultura e Pecuária Amazonas S/A, uma empresa que tem como acionista principal o pecuarista amazonense José Lopes, também tesoureiro de campanhas eleitorais locais, está respondendo uma ação civil na Justiça Federal por comercializar matéria-prima bovina de fazendas que exploram o trabalho escravo e promovem o desmatamento ilegal da floresta amazônica.

Um dos sócios do Frisam/Agropam é a Ciama (Companhia de Desenvolvimento do Estado do Amazonas), empresa pública do Governo do Amazonas. A Ciama, que tem entre suas finalidades promover o desenvolvimento ambiental no âmbito estadual, investiu mais de R$ 14 milhões na sociedade com o frigorífico Frisam/Agropam, em 2000.

Na época do investimento no frigorífico o governador do Amazonas era Amazonino Mendes (PDT), que administrou o Estado de 1999 a 2002. Nesse período, o pecuarista José Lopes trabalhou nas campanhas eleitorais de Amazonino. Também atuou nas campanhas do senador Eduardo Braga (PMDB) e do atual governador, Omar Aziz (PSD).

Na ata da assembleia geral ordinária do Frisam/Agropam de 03/06/2013, da qual o portal Amazônia Real teve acesso, consta que o frigorífico tem quatro sócios: José Lopes, seus filhos José Lopes Júnior e Alessandra Ale Lopes, e a Ciama. A sede do frigorífico fica no município de Boca do Acre e a filial em Manaus.

A sociedade entre o Frisam/Agropam e a Ciama causou surpresa ao Ministério Público Federal do Amazonas. “Nós ficamos surpresos (com a sociedade). Na medida em que o governo do Estado do Amazonas vem desenvolvimento um trabalho visando o desenvolvimento sustentável, valorizando o meio ambiente, nos surpreende o fato do poder público investir recursos numa empresa que contribui e que se beneficia do desmatamento”, afirmou Leonardo Macedo, um dos seis procuradores da República que assinam a ação civil pública contra o Frisam/Agropam e mais 22 frigoríficos e abatedouros dos Estados do Amazonas (2), Mato Grosso (16), Rondônia (3) e Tocantins (1).

Segundo o Ministério Público Federal do Amazonas, o pedido de indenização por danos morais coletivos, danos ambientais e sociais causados à sociedade contra o frigorífico Frisam/Agropam é de R$ 262,5 milhões. A ação foi ingressada no mês de abril deste ano, depois que a empresa se recusou a assinar o acordo de regularização socioambiental da cadeia produtiva da pecuária, a chamada Moratória da Carne.

O objetivo da ação, conforme o MPF, é coibir a comercialização de produtos bovinos de frigoríficos e abatedouros irregulares com redes de fast-food e supermercados do país. Para isso, o nome do Frisam/Agropam consta de uma lista de 28 empresas que, comprovadamente, causaram degradação ambiental, enviadas às empresas multinacionais, entre elas, MC Donald´s e Subway. A medida, segundo a ação, é para garantir a origem legal dos insumos das redes, concretizando o compromisso delas com a sustentabilidade socioambiental e com os direitos dos consumidores.

Multas

A peculiaridade na ação contra o Frisam/Agropam, de acordo com o procurador da República, Leonardo Andrade Macedo, é que o frigorífico possuiu inspeção sanitária federal. No entanto, as fazendas de gado com origem irregular pertencem ao pecuarista José Lopes, principal controlador da empresa.

As fazendas de Lopes estão situadas no município de Boca do Acre, a 1.028 quilômetros de distância de Manaus, localizado no sul do Amazonas, região de pressão do desmatamento e de conflitos agrários. Elas têm uma produção de 80 mil cabeças de gado bovino, segundo a investigação do MPF.

Na Justiça Federal, o pecuarista e tesoureiro José Lopes responde a quatro ações por crimes ambientais, impetradas entre os anos de 2004 e 2013, e uma ação penal por crime de trabalho escravo de 2012.

Segundo o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), as multas para os crimes ambientais expedidas em nome do pecuarista somam mais de R$ 3 milhões, resultado da destruição de 955,14 hectares de floresta nativa da Amazônia Legal.

O procurador Leonardo Macedo disse que o pecuarista José Lopes está nas duas pontas da cadeia de gado irregular. Entre os anos de 2009 e 2010, o frigorífico forneceu matéria-prima bovina resultante de abate de 26 mil cabeças de gado de origem irregular.

Nesse período, operações do Ministério Público do Trabalho resgataram trabalhadores nas fazendas de José Lopes em condição análoga à de escravo, o que culminou com a abertura de ação penal por crime contra a liberdade individual contra o empresário e seu filho, José Lopes Júnior.

“Ele (José Lopes) produz o gado e fornece a carne para ele mesmo. Acontece que o senhor José Lopes tem inúmeras autuações por áreas embargadas. Tem ações penais por desmatamento e trabalho escravo”, afirmou.

Capital

Procurado pela reportagem, o presidente da Ciama (Companhia e Desenvolvimento do Estado do Amazonas), Antônio Aluizio Barbosa Ferreira disse, por meio de nota da assessoria de imprensa, que a companhia ingressou na sociedade do frigorífico Frisam/Agropam em novembro de 2000 com um capital de R$ 14.860.994,11.

Com relação a ação civil por danos ambientais e trabalho escravo contra o frigorífico, Barbosa Ferreira afirmou que “a Ciama é sócia minoritária da Agropam, não participando da direção da empresa, nem influenciando em suas decisões”.

Ferreira disse também que a Ciama participa do capital da Agropam, de acordo com a política desenvolvimentista do Governo do Estado de apoiar empresas importantes para o desenvolvimento do interior do Amazonas.

O pecuarista José Lopes não foi encontrado para falar sobre a ação do MPF.  Simone Mendes, que integra o grupo de advogados que defende ele e o frigorífico Frisam/Agropam, disse à reportagem que pediria autorização do escritório de advocacia para responder ao portal Amazônia Real, mas não deu explicações sobre o caso até o momento.

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