Por Raquel Rolnik
Na semana passada, o Estadão publicou um editorial intitulado “A demagogia da mobilidade”. Em linhas gerais, o texto critica a instalação de corredores de ônibus e acusa o executivo municipal de “má vontade com o transporte individual”. Diz o editorial: “Não se discute a necessidade de dar prioridade ao transporte público e, no caso dos ônibus, de aumentar sua velocidade. Mas não é preciso fazer isso criando dificuldades para os que usam o carro como instrumento de trabalho. Especialmente para aqueles – como médicos e enfermeiros, para citar dois exemplos – cuja profissão tem exigências que o transporte público não consegue atender.”
No mesmo dia, o projeto “Cidades para pessoas” publicou uma “Resposta aberta ao editorial do Estado de S. Paulo”. O texto lembra que a maior parte das viagens feitas na cidade de São Paulo não são por meio do carro: “Quando medimos as viagens diárias feitas na cidade, percebemos que os carros são minoria: 38,42% dos deslocamentos são coletivos (transportes públicos), 30,78% individuais (carros e motos) e 30,80% não motorizados (a pé e de bicicleta). Esses dados da pesquisa Origem e Destino foram a base do estudo do engenheiro de transportes Horácio Figueira que concluiu que 20% dos paulistanos se locomove de carro, mas ocupam 80% das vias da cidade.” E critica, portanto, o que o Estadão chama de “má vontade com o transporte individual”: “Na verdade é exatamente o oposto: a priorização do carro como transporte de massa é que passou as últimas décadas prejudicando a cidade. E é isso que pode ser revertido nesse processo de reequilíbrio de suas vias.”
No fim de semana, o engenheiro e sociólogo Eduardo Vasconcellos publicou, no site da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), um artigo intitulado “O Estadão e a demagogia dos corredores”. Diz o texto: “Por mais voltas que dê no seu raciocínio, o que está por trás do editorial é o descontentamento pela redução do espaço viário hoje ocupado pelos automóveis. Embora o editorial reconheça a necessidade de melhorar o transporte público o que se percebe nele é uma visão claramente elitista e irritada, ecoando os protestos que alguns usuários de automóvel vêm manifestando por meio da mídia.”.