Relatório dos representantes dos Povos Indígenas no GT destinado a debater a questão das Terras Indígenas

"GT Destinado a Debater a Questão das Terras Indígenas" - Comissão de Legislação Participativa - Câmara dos Deputados. NÃO à PEC-215! Foto de Luiz Fernandes
GT Destinado a Debater a Questão das Terras Indígenas – Comissão de Legislação Participativa – Câmara dos Deputados. NÃO à PEC-215! – Foto de Luiz Fernandes

Os representantes dos Povos Indígenas no Grupo de Trabalho destinado a debater a questão das terras indígenas, incluídos em aditamento ao Ato de criação do Grupo de Trabalho do Presidente da Câmara dos Deputados, vem respeitosamente apresentar relatório complementar pelos motivos de fato e de direito que passam a expor.

Considerando que os representantes dos Povos Indígenas dispõem do direito paritário de voz e voto com os demais membros do Grupo de Trabalho;

Considerando todas as mesas de trabalho e audiências realizadas pelo Grupo de Trabalho e a posição contundente de juristas reconhecidos como Dalmo Dallari e Carlos Frederico Marés;

Considerando o importante relatório apresentado pelo Deputado Mediador Lincoln Portela, mas que não apresenta uma conclusão de acordo com os posicionamentos dos juristas na defesa dos direitos indígenas, bem como pelo fato de não refletir a posição do movimento indígena;

Resolvem apresentar relatório complementar com as seguintes considerações:

A histórica ocupação do plenário Ulisses Guimarães, da Câmara dos Deputados, realizada por cerca de 700 indígenas em abril deste ano, reflete a posição unificada do movimento indígena pela defesa dos seus direitos Constitucionais, principalmente sobre os territórios originários e seus modos de vida.

Contudo, cumprindo compromissos assumidos com os ruralistas, o Presidente da Câmara anunciou, recentemente, a instalação da Comissão Especial referente à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215. A instalação desta Comissão foi justamente o que levou os indígenas a fazerem a ocupação do plenário, já que esta proposta inclui entre as competências exclusivas do Congresso Nacional a aprovação de demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas. A matéria só poderá ir ao plenário depois de passar pela Comissão.

Se a PEC for aprovada, deputados e senadores teriam o poder de, inclusive, reverter demarcações já homologadas. A titulação de terras quilombolas e a criação de unidades de conservação ambiental também passariam a ser atribuição exclusiva do Legislativo.

Nas reuniões e audiências,, os membros indígenas do Grupo de Trabalho reiteraram inúmeras vezes ser contrários às proposições da PEC 215/00 e à instalação da comissão especial destinada a analisá-la.

Nas audiências públicas, promovidas pelo Grupo de Trabalho, os juristas contestaram esta proposta com veemência e ameaçam ir ao Supremo Tribunal Federal (STF) caso a PEC 215/2000 seja aprovada.

Para o jurista Dalmo de Abreu Dallari, “a PEC 215 afeta uma regra jurídica fundamental: a divisão dos poderes. Demarcar é um ato administrativo, ou seja, compete ao Executivo (…) vamos ao Supremo se for preciso para combater essa proposta aviltante”. O jurista declarou ainda que “o direito dos índios não depende da demarcação, a Constituição diz que eles índios já têm o direito à terra. A demarcação é apenas um ato administrativo para traçar os limites da terra”.

O ex-procurador estadual do Paraná e ex-presidente da Funai, Carlos Frederico Marés, frisa que ato administrativo é um conceito jurídico e ato único. “O Legislativo não tem que dizer qual é a terra dos povos indígenas, mas que os povos têm direito a ela”, disse. Conforme o jurista, a Constituição de 1988 garantiu o direito originário dos povos indígenas sobre suas culturas, sociedades e terras e a demarcação é só um ato formal de reconhecimento do direito originário dos povos indígenas.

A demarcação consiste em ato administrativo, por intermédio do qual a administração pública federal explicita os limites das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, baseado em elementos de prova documental, testemunhal e pericial, fixando marcos oficiais, sinalizadores do limite da terra demarcada.

Esse ato administrativo tem natureza declaratória dos limites da terra tradicionalmente ocupada pelos índios, que consiste em um bem da União, por força do que estabelece o inciso XI do art. 20 da CF e sobre a qual os índios exercem a posse permanente e o usufruto exclusivo das riquezas naturais existentes no solo, nos rios e nos lagos. A Constituição também determinou que os direitos á terra, dos índios, são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.

Nesse sentido, os representantes dos povos indígenas no Grupo de trabalho propõem:

a) A inclusão no relatório do entendimento jurídico-constitucional dos eminentes juristas Dalmo de Abreu Dallari e Carlo Frederico Marés;

b) A Conclusão pelo arquivamento de a PEC 215/2000 e de todas as proposições em curso no Congresso Nacional tendentes a retirar ou restringir direitos dos povos indígenas;

c) Que se faça referência, no relatório, reconhecendo a autonomia Constitucional dos povos indígenas nos territórios originários;

d) Seja encaminhado recomendação a Presidente Dilma Rosseff para as demarcações de todas as terras indígenas, nos termos da Constituição Federal, como forma de garantir a segurança jurídica;

e) Finalmente, a bancada indígena lamenta o fato de outros assuntos não terem sido debatidos o suficientemente pelo Grupo de Trabalho, em razão do tempo limitado. Destacam-se, entre outros, os temas do Relatório Figueiredo, da proposta governamental de participação da Embrapa nos processos de demarcação e de muitos outros requerimentos que ficaram sem resposta.

Brasília, 04 de setembro de 2013.
Lideranças Indígenas do Grupo de Trabalho destinado a debater a questão das terras indígenas, objeto do Ato da Presidência da Câmara dos Deputados de 17 de abril de 2013:

Sonia Bone de Souza Silva Santos / Guajajara
José Carmélio Alberto Nunes / Ninawá
Aurivan dos Santos Barros / Truká
Paulo Henrique Vicente Oliveira / Tupiniquim
Antonio Fernandes de Jesus / Tuxá
Marciano Rodrigues / Guarani Nhandewa
Rildo Mendes / Kaingang
Lindomar Ferreira / Terena
Otoniel Ricardo / Guarani
Avani Florentino de Oliveira / Fulni-ô

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