Em audiência da Vara de Conflitos Agrários do Estado de Minas Gerais, realizada no Fórum da Comarca de Rio Pardo de Minas, norte do estado, no dia 07 de agosto, o Juiz Octávio de Almeida Neves decidiu pelo deferimento da liminar de “reintegração de posse” requerida pela empresa Estância Lagoa da Pedra, após ocupação em 10 de maio de 2013, por mais de 100 trabalhadores e trabalhadoras de uma área de 6.600 ha.
Em passado recente, o imóvel era utilizado por famílias que, a exemplo de inúmeras outras comunidades tradicionais da região, tiveram seu território expropriado pelo estado para fomentar a implantação de monoculturas de eucalipto. Participaram da audiência, além de representantes dos moradores locais, um representante do Instituto de Terras do estado e a promotora do Ministério Público, representantes da sociedade civil, além do juiz Octávio de Almeida Neves, que presidiu a sessão.
A área em questão constitui-se de terras do estado de Minas Gerais, que foram arrendadas a empresas de plantio de eucalipto, nas décadas de 1970 e 1980 por períodos de aproximadamente 23 anos, cujas promessas de desenvolvimento regional e melhoria da qualidade de vida do povo do lugar não se concretizaram, ao contrário, pioraram. Assim como este, muitos contratos já estão vencidos e essas terras vêm sendo objeto de grilagem e venda a empresas e particulares. As comunidades locais reivindicam a restauração dos ambientes degradados pela monocultura do eucalipto e a criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Nascentes dos Gerais, a fim de fomentar a produção agroecológica e conservação ambiental, geração de trabalho e renda, sobretudo para os jovens e moradores da região.
O juiz agrário iniciou a audiência relatando casos de envolvimento de tráfico de drogas com conflito agrário, em uma tentativa explícita de intimidar, confundir e desqualificar lideranças, além de criminalizar um movimento legítimo e pacífico de povos e comunidades tradicionais que reivindicam o direito à terra, ao território tradicional, ao uso e conservação dos recursos naturais como prerrogativa para um desenvolvimento sustentável, com saúde, transporte, educação e lazer dignos.
Na oportunidade, o juiz apresentou uma relação de processos criminais contra uma liderança local, omitindo, de forma deliberada, que a referida liderança foi absolvida em todas as ações criminais e que mais de noventa por cento dos processos apresentados naquela audiência referem-se a Cartas Precatórias expedidas pelo Juiz da Comarca de Rio Pardo de Minas a dezenas de comarcas de Minas Gerais e outros estados, decorrentes de Ações Populares ajuizadas pela mesma liderança contra empresários e políticos da região do Alto Rio Pardo, que acarretou no bloqueio de bens da ordem de meio bilhão de reais de empresas e pessoas integrantes de organização criminosa que atua na grilagem de terras públicas pertencentes ao Estado de Minas Gerais.
Só então, a partir desta explanação inicial, do incômodo e indignação gerados nos representantes das comunidades que acompanhavam a sessão e após a intervenção dos advogados de defesa do Movimento Geraizeiro é que o juiz deu início ao julgamento objeto da audiência. Assim, apesar de os advogados terem argumentado que o Estado de Minas Gerais reivindica a área ocupada pelo Movimento Geraizeiro, através de um processo judicial que tramita pela Comarca de Rio Pardo de Minas, o juiz, tratando com pouco zelo a proteção de um bem público, deferiu a liminar requerida pela empresa Estância Lagoa da Pedra, determinado que a área seja desocupada no prazo de vinte dias.
Por ter decidido de modo parcial e discriminatório, a assessoria jurídica do Movimento Geraizeiro interpôs Incidente Processual de Exceção de Suspeição contra o Juiz Agrário Octávio de Almeida Neves que se viu obrigado e suspender o processo da Ação de Reintegração de Posse e, consequentemente, os efeitos da liminar concedida em favor de fazendeiros.
Movimento Geraizeiro.
Pela criação da RDS Nascentes dos Gerais.
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por André Alves.