Por Luciana Gaffrée, em Rel-UITA
Políticas desenvolvimentistas atraem a indústria de celulose, emperram a demarcação de terras e ameaçam a biodiversidade do Brasil. Em sua publicidade, a empresa Suzano Celulose Papel afirma “Para quem ainda não sabe, nós da Suzano Papel e Celulose escolhemos a cidade de Imperatriz para a construção de nossa nova fábrica de celulose”. A Rel-UITA resolveu dialogar com Mayron Borges, jornalista e assessor de comunicação do Fórum Carajás, uma articulação de entidades, associações e movimentos sociais que atuam com o propósito de acompanhar a implantação de grandes projetos na região de influência da estrada de ferro Carajás.
-Por que o Fórum Carajás está hoje focado na questão da implementação da Suzano Papel e Celulose?
-Todas essas cadeias, da madeira, do carvão, do ferro gusa, do eucalipto e do agronegócio, em algum momento elas se tocam e se imbricam. Então, no caso da Suzano Papel Celulose temos que saber que nos anos 90 a Vale do Rio Doce começou um projeto de plantio de eucaliptos na região de Imperatriz com financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Só que esse projeto não foi adiante porque as condições técnicas do projeto não eram ambientalmente favoráveis.
-O BNDES financia essas cadeias, mesmo sabendo que envolvem trabalho escravo?
-Não posso te responder. Porém, é sabido que a indústria de ferro gusa no Maranhão, que está instalada no município de Açailândia, e que começou nos anos 80 com investimentos do BNDES, usa de trabalho escravo desde aquela época, para alimentar a indústria do ferro gusa, para manter a competitividade.
Essas indústrias já estavam saindo de seus países de origem e era preciso continuar fornecendo matéria prima a um preço competitivo para, por exemplo, os Estados Unidos, que é maior consumidor de ferro gusa do mundo.
-E por que as indústrias estavam saindo de seus países de origem?
-Porque tanto a indústria de ferro gusa como a de celulose são altamente poluentes e ofensivas aos recursos naturais, isto é, ao meio ambiente.
A vantagem é que aqui há florestas, sendo que muitas vezes os títulos dos proprietários de terras são duvidosos, conta-se com o apoio do governo, em seu plano desenvolvimentista e, portanto é fácil criar aqui essa cadeia completa, que vai desde o desmatamento para as carvoarias, passando pelas siderurgias, para gerarmos a maior indústria de ferro gusa do mundo e pelo desmatamento para a plantação de eucaliptos para as indústrias de celulose.
-É por isso que as terras indígenas são invadidas?
-Sim. As terras indígenas da região centro-oeste do Maranhão são invadidas pelos madeireiros e carvoeiros, que alimentam a indústria de ferro gusa, bem como pelos agricultores e latifundiários, muitos deles com documentos ilegais, os grileiros.
-E qual será a consequência para o Maranhão com a entrada da Suzano Papel Celulose?
-A Suzano planeja usar uma área total que abrange esses três estados: Maranhão, Piauí e Tocantins, aproximadamente uns 600 mil hectares para área de plantio de eucaliptos.
São as áreas mais importantes do ponto de vista da biodiversidade, porque são as áreas do cerrado, as áreas da transição do cerrado e áreas de floresta amazônica propriamente dita, tudo isso será simplesmente destruído para a plantação de eucaliptos. Além disso, essas áreas são áreas de recarga para o lençol freático.
Sem falar que serão desmatadas árvores como o Pequi, que é a maior espécie de árvores protegida, o Bacuri, que é uma espécie muito utilizada no Maranhão, tem também a Mangaba, tem a Fava, a Faveira, tem Cagaita, tem Murici, Jatobá, etc. Muitíssimas delas com mais de cem anos.
–Quem serão os atingidos?
-As pequenas comunidades que vivem nessas zonas, que são os quilombolas, as comunidades extrativistas e os povos indígenas. Então quando você desmata essas áreas só para plantar eucaliptos, você está afetando também a questão dos recursos hídricos, a biodiversidade, você está perdendo conhecimento genético e está também afetando a vida de milhares de pessoas.
-E como isso atinge as políticas de demarcação de terras indígenas?
-Nesse momento temos vários processos de ampliação e de demarcação de terras indígenas aqui no Maranhão que estão parados. Não posso dizer que é a Suzano que “pede” para que os processos fiquem parados, mas há setores que possuem interesses na ampliação do plantio de eucaliptos, que estão interessados em “parar” o processo de ampliação e demarcação de terras indígenas.
–Quais são esses setores?
-No governo do estado do Maranhão, posso dizer claramente que a família Sarney tem interesse em paralisar essas ampliações e demarcações das terras indígenas porque os setores do agronegócio apoiam o grupo Sarney.
Além disso, dentro do governo há também políticos do setor do agronegócio, cujo interesse na paralisação é pessoal. Posso citar o secretário Claudio Azevedo da Secretaria de Agricultura, bem como inúmeros deputados do Maranhão do Legislativo e deputados federais.
-Então, você está me dizendo que intencionalmente o governo paralisa as demarcações das terras indígenas no Brasil inteiro para poderem então usá-las em projetos vinculados com o desmatamento?
-É exatamente isso. Aqui no Maranhão temos vários processos de ampliação de áreas indígenas, que estão parados por conta de pedido de políticos da bancada que apoia a família Sarney aqui no Maranhão, para que os seus projetos não sejam barrados por conta dessas demarcações ou ampliações.
-E como o Fórum Carajás se posiciona com relação a tudo isto que você nos contou?
-O nosso grande objetivo no momento é fazer com que esses projetos que estão vindo aqui para o Maranhão não sejam implantados, mas caso sejam implantados, que obedeçam rigorosamente a legislação ambiental e a legislação dos direitos trabalhistas.
Na questão trabalhista temos os inúmeros casos de denúncias de terceirização ilegal, não pagamento de direitos trabalhistas aos trabalhadores, e aí eu posso citar o caso da Suzano Papel Celulose, que além de tudo, ao se instalar, terceiriza os serviços. E, por conta dessa terceirização, os trabalhadores não recebem seus direitos de acordo com a lei.
-E com relação aos índios e comunidades quilombolas?
-Lutar para que se respeitem também os direitos indígenas garantidos pela constituição, bem como dos quilombolas, e das comunidades tradicionais como um todo.