Família de vítima está sendo procurada. Corpo está no DPT desde terça. Funai afirma que área ocupada faz parte de aldeia indígena.
Tatiana Maria Dourado, do G1 BA
Um índio da comunidade Tupinambá dos Olivença foi morto em uma fazenda localizada na região da Serra das Trempes, entre as cidades de Una e Ilhéus, sul da Bahia, na noite de terça-feira (3). O caso foi confirmado pela delegada Lívia Rodrigues, da Polícia Federal, e pela coordenação regional da Fundação Nacional dos Índios (Funai) nesta quarta-feira (4).
“A Funai [Fundação Nacional dos Índios] mandou um ofício dizendo que é índio. Ele foi morto a tiros. Ainda não se sabe como ele morreu”, aponta a delegada. A vítima foi encontrada com o rosto e o braço pintados com desenhos típicos de tribos indígenas.
Ednaldimar Barbosa, coordenador regional da Funai, afirma que o rapaz era casado e que os seus parentes estão sendo localizados. Por ser região de disputa de terra, a mobilidade das equipes é dificultada. O corpo do índio está no Departamento de Polícia Técnica (DPT) desde a terça-feira e aguarda o reconhecimento da família para ser liberado.
A Polícia Federal apura a informação de que a morte ocorreu durante uma confusão entre os próprios indígenas e já colhe depoimento de testemunhas.
A Funai ressalta que essa é a versão de um fazendeiro e que os indígenas contam outra, de acordo com informações também iniciais. “Eles alegam que foi feita ação de retomada e a gente sabe que teve um não-índio ferido na região. Vinte e quatro horas depois, o grupo estava na área e foi surpreendido por uma ação de pistoleiros com sete pessoas, a mando de fazendeiros. A partir do relatório da equipe que está em campo, vai ser mais fácil. Mas a conclusão só a partir das investigações policiais”, aponta.
O não-índio ferido é um trabalhador rural que foi baleado, espancado, está internado e corre risco de ficar paraplégico. A família dele acusa agressão por parte dos indígenas. O caso foi realizado na mesma fazenda, a São Pedro, na segunda-feira. A bala ficou alojada na coluna dorsal do homem, que tem 55 anos.
Ambos os casos têm relação com o conflito entre índios e fazendeiros pela disputa de terras na região, que continuam intensos mesmo com a presença da Força Nacional de Segurança. “Tem a ver com os conflitos”, afirma.
O corpo do índio está do Departamento de Polícia Técnica (DPT) desde as 21h de terça e, de acordo com o órgão, até o momento nenhum familiar entrou em contato ou esteve no local. O DPT não tem a identificação da vítima, porque espera uma guia da PF, porém informa que ele aparenta ter cerca de 20 anos.
A equipe do DPT de Ilhéus chegou a Buerarema por volta das 16h30 do dia do crime. De lá, os peritos, a PF e a Força Nacional, que reforça o policiamento da região desde o dia 19 de agosto, saíram em comboio em direção à zona rural.
A polícia encontrou a sede da fazenda arrombada e e destruída. Ao caminhar pela casa, foi possível ver melhor os estragos, conforme averigou a equipe da TV Santa Cruz. Na cozinha, perto do local onde foi encontrado o índio, estava escrita a palavra “tupinambá” na geladeira.
Segundo os trabalhadores rurais, a fazenda, que produz seringa, cacau e café, foi ocupada pelos índios no último fim de semana. Eles afirmam que tinham somente índios na sede da propriedade quando ouviram tiros. Os tupinambás teriam fugido com a chegada da primeira equipe da força nacional ao local.
Justiça
A Justiça Federal suspendeu as nove liminares que favoreciam fazendeiros da região sul da Bahia, o que autorizou a permanência de cerca de 500 famílias da comunidade Tupinambá de Olivença, de acordo com a Advocacia-Geral da União (AGU), confirmadas pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRT-1) no dia 29 de agosto.
A decisão é do presidente do TRT-1, Mário Cesar, e foi tomada na terça-feira (27). De acordo com a AGU, o magistrado considerou que a demarcação da área foi aprovada pela Fundação Nacional do Índio (Funai).
As ações de reintegração de posse foram interpostas por proprietários das fazendas Boa Vista, Conceição, São Gonçalo e Bela Vista, pedindo proibição da presença dos índios nas terras. A AGU informa que a Vara Única da Subseção Judiciária de Ilhéus, na Bahia, concedeu todos os pedidos, autorizando uso de força policial para cumprimento da decisão.
O conflito
A localidade conhecida como Serra do Padeiro, entre Buerarema, Una e Ilhéus, é alvo dedisputa entre índios e fazendeiros. De acordo com a Fundação Nacional do Índio (Funai), indígenas estão ocupando fazendas que se encontram no interior da Terra Indígena Tupinambá de Olivença, que pertence aos índios Tupinambás.
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) afirma que 300 indígenas Tupinambás participam das ações de ocupação das fazendas, que ficam em uma área de 47.376 hectares. Segundo o Cimi, entre o dia 2 e 13, 40 propriedades foram retomadas. O órgão conta que a área foi reconhecida pela Funai e que o processo estaria parado no Ministério da Justiça, o que teria motivado a ocupação das terras.
No entanto, Luis Uaquim, presidente da Associação dos Pequenos Produtores, alega que a área ainda não foi demarcada. “São locais de 2, 3 hectares. Não tem nada homologado. Nada que diga que é uma área indígena”, afirma. Ele conta ainda que os índios estariam sendo violentos durante a ocupação das propriedades.
Eles [os índios] contratam pessoas e elas se vestem de índio, e vão atirando, tocando fogo nas propriedades. Eles [os fazendeiros] estão vivendo um terror. Eles moram lá e não têm pra onde ir. Isso é terror mesmo”, afirma Uaquim.
“Nessa noite [quinta-feira] eles invadiram mais uma, usaram extrema violência, bateram em três pessoas. Também tocaram fogo em um barzinho, em uma garagem”, conta Herman Isensee, membro da direção da associação.
Segundo o Cimi, na noite do dia 14, um caminhão que transportava alunos da Escola Estadual Indígena Tupinambá da Serra do Padeiro, foi alvo de tiros oriundos de um homem que se encontrava em cima de um barranco. Duas pessoas ficaram feridas. Para o órgão, o objetivo do atirador era atingir um homem que seria irmão de um cacique Tupinambá.
A Polícia Federal está na região para investigar o caso, mas ainda não informou o número de propriedades que teriam sido invadidas por índios ou se houve casos de agressão. As polícias Militar e Civil também trabalham na investigação do caso.