Por Sineudo dos Santos*
O lugar onde vivo é uma pequena cidade do interior do Paraná com uma população de apenas 4.664 habitantes. Tamboara é uma cidade construída por mãos de muitos migrantes vindos de vários lugares do Brasil, principalmente de estados do Nordeste. De acordo com um recente levantamento divulgado pelo IBGE, o Paraná está entre os três estados que mais perderam migrantes nos últimos anos. Mas é justamente o contrário disso que se verifica em Tamboara. Nos últimos cinco anos, o município tem recebido um número expressivo de nordestinos vindos dos estados da Bahia, Piauí e Ceará para o corte de cana.
Essa migração que ocorre aqui é a chamada migração temporária, pois os trabalhadores vêm para cá no pico da colheita da cana e depois voltam para seus estados de origem. Esse fato vem gerando polêmica entre a população tamboarense. Há aqueles que veem os novos moradores como intrusos. Argumentam que as empresas da região estão preferindo a mão de obra nordestina, tirando assim, as vagas daqueles “legítimos moradores” que trabalham no corte de cana. Porém, essa opinião não é unânime entre os cidadãos desse lugar.
Muitos tamboarenses acreditam que o aumento da população (mesmo que de forma temporária) representa desenvolvimento econômico para o município, já que esses trabalhadores da cana consomem boa parte do dinheiro que ganham no comércio local. Esse aumento de vendas do comércio é facilmente observado nos mercados, lojas, bares e lanchonetes em dias de pagamento das usinas. Os comerciantes locais afirmam que o movimento de venda tem crescido em torno de 20% de 2007 para cá.
Sou nordestino e sinto na pele essa polêmica. Há dois anos estou em Tamboara e já me considero parte dela. Defendo a ideia de que essa migração é benéfica tanto para os tamboarenses, quanto para nós, nordestinos. Não fossem pelas dificuldades em sobreviver em uma terra tão castigada pela seca, não deixaríamos para trás quem tanto amamos para trabalhar em terras tão distantes.
Há ainda outra preocupação da população com relação ao aumento de gastos nas áreas de educação e saúde por causa da migração. O vereador, e também funcionário da saúde, Ariovaldo Vieira Martinez avalia que o aumento pela procura por consultas tem aumentado em torno de 17% a 20%. Explica ainda, que esses novos moradores não aparecem nos dados do Censo, e por isso, não são contabilizadas no repasse da verba que o município recebe para área da saúde.
Sei que isso é uma realidade. Os trabalhadores nordestinos adoecem mais estando aqui por causa do ritmo intenso de trabalho e do clima mais frio que em seus estados de origem, e por isso, precisam recorrer à saúde pública. Porém, cabe aqui uma pergunta: O atendimento do SUS não é assegurado em todo território nacional? Defendo a ideia de que como brasileiros, temos direito a esse atendimento onde quer que estejamos.
Não sou especialista no assunto, mas penso que a solução para isso está nas mãos do governo federal que deveria prever que mesmo em menor número, as migrações internas no Brasil ainda continuam existindo. Portanto, os municípios brasileiros, que assim como, Tamboara, estão recebendo migrantes temporários deveriam receber verbas condizentes com suas atuais necessidades. Assim, esses trabalhadores deixariam de causar problemas para administração pública local.
Reafirmo que o nordestino é um povo sofredor. Muitas vezes, recebem uma diária de apenas 12 reais enquanto aqui, a diária é de 50. Não deixamos nossa terra porque queremos, mas por necessidade. Moramos em um país democrático. A Constituição nos permite o direito de ir, vir e morar onde são ofertadas melhores condições de trabalho para uma vida mais digna.
Cheguei nessa cidade na condição de migrante temporário. Deixei meus estudos, meus pais, minha história e minhas tradições em busca de um salário mais digno. No entanto, me encantei por esse meu novo lugar. Hoje tenho um coração dividido entre o a cidade de Jardim no Ceará e Tamboara, no Paraná. Posso afirmar com orgulho que sou cidadão tamboarense. Com a força do meu trabalho, quero progredir na vida e fazer progredir também essa terra que tanto amo.
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