[Unisinos] –
A reportagem é de Steffanie Schmidt, publicada no jornal A Gazeta, de Cuiabá, e reproduzida por EcoDebate, 27-04-2010.
De acordo com o coordenador do Instituto Centro de Vida (ICV) de Mato Grosso, Sérgio Guimarães, 99% dos autuados no Estado não pagam suas multas junto aos órgãos fiscalizadores como IBAMA e Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema). Dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) revelam que somente 1% de R$ 324 milhões, valor correspondente a 421 multas emitidas pelos dois órgãos entre 2005 e 2006, foram pagos até o mês de março de 2008. Todas se referem à operação Curupira, realizada em 2005 e que resultou na prisão de 80 pessoas.
Na Sema, em 2009, o valor total arrecadado com multas, infrações e prestações de serviços como emissão de guias, autorizações, licenças e carteiras de pescador atingiram a cifra de R$ 31.623,095. Os dados sobre multas aplicadas não foram finalizados.
Entretanto, o relatório de 2008 da Superintendência de Fiscalização da Sema, aponta que o total de multas aplicadas durante o ano atingiu a cifra astronômica de R$ 1.280.834.060, totalizando 5.560 autos de infração. Para se ter uma ideia, esse valor é bem maior que o orçamento da Sema nesse mesmo ano, de R$ 76.103,375.
A maioria das multas aplicadas em 2008 é em decorrência de queimadas, num total de R$ 962.902.161,88, seguido da falta de licenciamento, com R$ 66.769.049,90 e do transporte e comercialização ilegal de madeira que registrou R$ 5.231.785,32 em infrações. O desmatamento é o último colocado, com R$ 224.939,32.
Além do âmbito administrativo, no quesito criminal, os vários fóruns de competência permitem a postergação da sentença final. “O maior problema é que não são responsabilizados pela multa, ou seja, não pagam por haver várias instâncias onde se podem recorrer. Mesmo quando as sanções são aplicadas, o infrator não é responsabilizado efetivamente”, enfatiza Guimarães.
A fiscalização, na sua opinião, ainda consegue atingir seus objetivos. O IBAMA, por exemplo, que está em greve há duas semanas, paralisou 60 operações em todo país, segundo dados do comando nacional de greve. Apenas duas continuaram e uma delas está justamente em Mato Grosso. A operação “Soja Pirata” já estava em andamento antes da greve.
A última apreensão, ocorrida final de março, totalizou 66 mil sacas do produto num total de 5,2 mil hectares, quase 6 mil campos de futebol. A soja ilegal era plantada em uma fazenda embargada no município de Bom Jesus do Araguaia (1 mil km a nordeste de Cuiabá). Boa parte dessa área está dentro da Terra Indígena Maraiwatsede, pertencente à etnia Xavante.
De acordo com o IBAMA, o cultivo foi feito em áreas que já estavam embargadas por conta do desmatamento ilegal da floresta. A área faz parte do grupo Fazendas Unidas Capim Fino, que reúne 7 fazendas na região. As fazendas do grupo Capim Fino são campeãs de autuações do IBAMA. Além de mais de R$ 58 milhões em multas, a maioria delas por desmatamento, queima e dificuldade de regeneração da floresta, todas as propriedades possuem áreas que foram embargadas pelo órgão ambiental federal em 2008.
Boicote
A adesão de produtores rurais ao programa de regularização da atividade produtiva no Estado, o MT Legal, vem sendo boicotada por sindicatos e associações representativas da classe, segundo Sérgio Guimarães. “O programa dá oportunidade ao produtor rural de se cadastrar sem ter que pagar multas pelo seu passivo ambiental. Entretanto, não tem tido muita resposta por parte dos produtores do Estado porque algumas lideranças ruralistas estão orientando os produtores a não se cadastrarem dizendo que haverá mudanças no Código Florestal”.
O projeto de alteração do Código Florestal está em trâmite no Congresso Nacional.
Para o ambientalista, esse tipo de posicionamento é um equivocado. “Eventuais mudanças no Código Florestal serão automaticamente incorporadas por quem estiver cadastrado no MT Legal”.
A ideia é que os produtores recuperem seus passivos ambientais por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).
A reportagem entrou em contato com a administração da fazenda pelo número divulgado na lista telefônica, mas não obteve sucesso.
A Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (Famato) e a Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja) foram procurados, mas não se manifestaram sobre o assunto.
As mais de 100 mil propriedades voltadas à pecuária no Estado serão cadastradas no MT Legal até o mês de novembro, segundo informações divulgadas pela Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat).
Arrecadação
De acordo com o superintendente de procedimentos administrativos e autos de infração da Sema, Jânio Moraes, o problema com a arrecadação é uma realidade inerente a todo país. Os vários recursos admitidos são um dos principais pontos para esse resultado, segundo ele. Responsável pelo julgamento de 300 a 400 processos por mês, Jânio explica que a partir desse ponto, o infrator pode recorrer ao Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), que se reúne uma vez por mês para julgar todos os processos. Depois dessa instância, existe ainda a prerrogativa de se recorrer ao Pleno do Consema, que também toma ciência dos processos durante a única reunião mensal. Somente depois disso é que se pode realizar a execução fiscal do infrator, que é um procedimento da Procuradoria Geral do Estado (PGE).
A maior parte desse caminho é percorrido, segundo ele, por proprietários rurais que são autuados em grandes somas. “O decreto federal 6.514/08, tornou esse tipo de multa astronômica”.
As pequenas infrações, normalmente, são parceladas em até 36 vezes, segundo Moraes.
Além disso, os focos de desmatamento e queimada vêm reduzindo anualmente, segundo o secretário adjunto de Qualidade Ambiental da Sema, Salatiel Araújo. “Acredito na eficiência da fiscalização por que ela vem mostrando a queda nos índices de desmatamento e focos de queimada no Estado”.
De 1999 a 2006, os focos de calor passaram de 46% para 20%.
Todo procedimento é feito a partir da fiscalização in loco da área degrada. “Mesmo nos casos em que o fogo atingiu a área de reserva da propriedade, de fora para dentro, o proprietário rural é obrigado a recuperar a área. Ele nunca deixa de ser punido”, afirmou Jânio Moraes.
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=31859