Instituição é contra ação judicial movida para anular procedimento de demarcação de terras das Comunidades Quilombolas de São Domingos e Santana
O Ministério Público Federal em São Mateus (ES) manifestou-se contrário a uma ação judicial que pretende anular o procedimento de demarcação de terras das Comunidades Quilombolas de São Domingos e de Santana, localizadas entre os municípios de São Mateus e Conceição da Barra, no Norte do Estado. A ação está sendo movida por 14 produtores rurais contra o Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra).
Os autores afirmam que, além de não terem sido notificados do início dos trabalhos de identificação da área, os moradores da localidade de São Domingos e Santana não são remanescentes de quilombolas e que a região demarcada nunca foi um quilombo. Além disso, alegam a suposta inconstitucionalidade do Decreto 4887/2003, que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos.
Para o MPF, não há qualquer nulidade a ser declarada, pois a fase do procedimento de demarcação contestada pelos autores tem como objetivo, justamente, identificar a terra, seus limites e seus habitantes. Além disso, os autores foram notificados posteriormente, na época da publicação do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID).
O MPF também contesta a alegação dos produtores rurais de que a área nunca foi quilombo ou habitada por quilombolas. De acordo com o parecer do órgão, a definição de quilombolas como escravos fugidos e de quilombos como os espaços utilizados como esconderijo por esses escravos durante o período escravocrata não corresponde à compreensão mais adequada e recente das ciências humanas e jurídicas sobre o assunto. Pelo contrário, a correta conceituação de comunidades remanescentes de quilombos e das terras por elas ocupadas segue determinação do Decreto 4887/2003, segundo o qual são considerados remanescentes das comunidades dos quilombos os grupos étnicos-raciais com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida.
Para o MPF/ES, “uma das características essenciais da cultura quilombola é a territorialidade. A preservação da cultura quilombola objetivada pelo constituinte só se torna efetiva na medida em que se assegura à comunidade étnica o território necessário à sua reprodução física, social, econômica e cultural, exatamente como consagrado no art. 3º, § 2º, do Decreto 4.887/03.”
Em relação à suposta inconstitucionalidade do Decreto 4887/2003, o MPF sustenta que, embora exista uma ação direta de inconstitucionalidade sobre a questão tramitando no Supremo Tribunal Federal, ainda não houve qualquer decisão a respeito da questão. Dessa forma, sob a ótica do princípio da presunção da constitucionalidade das leis, a legislação atual permanece válida e eficaz.
Intervenção do MPF – A intervenção do MPF nas ações em que se busca anular processos de demarcação é uma exigência legal. De acordo com o Código de Processo Civil, compete ao Ministério Público Federal intervir nas ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais causas em que há interesse público. Além disso, é atribuição da instituição garantir os direitos dos povos e comunidades tradicionais, incluindo os quilombolas.
Assessoria de Comunicação Social
Procuradoria da República no Espírito Santo