Natasha Pitts – Adital
No último dia 10 de setembro, foi encontrado em um terreno baldio, na cidade de Inhumas, Região Metropolitana de Goiânia (Estado de Goiás), o corpo de João Antônio Donati, jovem homossexual de 18 anos. O assassinato teria ocorrido com requintes de crueldade. Seu corpo foi encontrado com o pescoço e as duas pernas quebradas, a boca estava cheia de papel. Essa bola de papel conteria um recado homofóbico: “Vamos acabar com essa praga”. A polícia ainda está investigando se o caso é realmente um crime de ódio contra a população LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais).
Este caso trágico, que ganhou repercussão na mídia e nas redes sociais no Brasil esta semana, comprova que não está longe de ser raro o aparecimento de notícias envolvendo casos de homofobia. Alguns desses episódios terminam, inclusive, com o assassinato das vítimas. Outro exemplo disso aconteceu há poucos dias, em Curitiba, no Paraná, quando um jovem gay foi espancado por taxistas que o acusaram de assédio. No atual período eleitoral, o assunto tem extrapolado as organizações e movimentos LGBT e sendo explorado por alguns candidatos em busca de votos.
“Estamos vivendo um processo de fundamentalismo arraigado no Brasil. Avançamos em políticas públicas, mas a homofobia ainda é muito forte. O que aconteceu com o jovem de Goiânia é um retrato fiel do que a população LGBT sofre. Em nome desse fundamentalismo temos perdido muitas vítimas”, denuncia Marcelle Esteves, vice-presidente do grupo Arco-Íris, do Rio de Janeiro, e coordenadora de política nacional da Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL), em entrevista à Adital.
A ativista aponta que o atual governo, comandado pela presidente Dilma Rousseff (Partido dos Trabalhadores – PT), contribuiu com alguns pontos favoráveis relacionados à visibilidade e direitos civis LGBT, mas ainda é preciso avançar bastante.
“Hoje, mais do que nunca, ter um candidato comprometido com os direitos humanos é fundamental. Precisamos de um candidato que assuma a defesa não só dos direitos das pessoas LGBT, mas esteja também atento à questão do preconceito racial, entre outras causas; uma pessoa que assuma os direitos humanos como uma pauta fiel e respeite a vida”, destaca Marcelle.
Há poucos dias, a população brasileira acompanhou o “erro técnico” da candidata a presidenta pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) Marina Silva, que divulgou em suas propostas de campanha apoio à união de casais homoafetivos, mas, em apenas 24 horas, voltou atrás e sob pressão de grupos fundamentalistas amenizou o ponto em questão, defendendo que se comprometeria apenas em garantir os direitos oriundos da união civil entre pessoas do mesmo sexo. Apesar das justificativas de “erro de diagramação”, a substituta de Eduardo Campos foi acusada de ceder às pressões de grupos evangélicos. Marina também é acusada de ter posições conservadoras por ser evangélica.
“O que aconteceu demonstra a força que o fundamentalismo tem. Política e religião não deveriam nunca estar atreladas, mas sabemos que isso acontece no Brasil e vimos isso no posicionamento de Marina. A candidata percebeu que a pauta LGBT poderia ser muito cara para ela e, assim, contatamos que não há comprometimento. Uma candidata que lança um programa de governo e, um dia depois, diz que se enganou não é séria e não vai governar para todos”, critica a ativista da Articulação Brasileira de Lésbica.
Para que a população conheça candidatos que assumem abertamente propostas voltadas para a defesa dos direitos civis de gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros, um movimento social suprapartidário criou o site colaborativo http://www.votelgbt.org/. A iniciativa tem como marco, justamente, a polêmica envolvendo Marina Silva. O site já catalogou mais de 100 candidatos de diferentes partidos.
“Queremos um país em que todo mundo tenha seus direitos garantidos e suas vidas respeitadas. Para isso, precisamos escolher políticos verdadeiramente comprometidos com os direitos humanos”, declara um dos textos publicados no site.
O suspeito de assassinar Donati, o lavrador Andrie Ferreira da Silva, de 20 anos, confessou o crime à polícias. Ele contou que manteve relação sexual com a vítima no mesmo terreno onde o corpo foi encontrado. Alegando não ser homossexual, Silva afirmou que a motivação para o crime não teria sido homofobia. Após a relação sexual, os dois teriam se desentendido e entrado em luta corporal. Em depoimento, o suspeito alegou ter usado apenas as próprias mãos para matar João, sem a utilização de nenhum objeto.
Segundo o delegado responsável pelo caso, Humberto Teófilo, o suspeito esqueceu os documentos pessoais no local do crime, levando a polícia ao seu paradeiro. Silva foi detido em uma plantação de tomates, onde trabalhava, e não resistiu à prisão.De acordo com Humberto Teófilo, o laudo do Instituto Médico Legal (IML) apontou que a vítima lutou com o agressor antes de morrer. Donati morreu asfixiado e, ao contrário do foi informado inicialmente, não houve nenhuma fratura em seu corpo. O exame também apontou que a vítima foi encontrada com papéis de picolé e sacolas plásticas na boca, o que causou o sufocamento.O delegado falou ainda que não havia nenhum bilhete na boca dele com insinuações homofóbicas, como foi noticiado. “Não sei de onde tiraram isso.”