Mais de um mês após o assassinato da liderança indígena Eusébio Ka’apor, outras lideranças Ka’apor têm relatado um recrudescimento das ameaças de morte e intimidações que estão recebendo por madeireiros devido às denúncias de exploração madeireira dentro da Terra Indígena (TI) Alto Turiaçu no Estado do Maranhão. Atividades madeireiras ilegais aparentemente recomeçaram no território indígena nas últimas semanas, enquanto até a data, não houve nenhuma investigação efetiva realizada pela polícia sobre o assassinato de Eusébio Ka’apor.
Mais recentemente, no dia 29 de maio de 2015, uma das lideranças encarregadas do Conselho de Gestão do povo – a instância administrativa organizada pelos indígenas que monitora a educação, saúde e proteção territorial – foi perseguida por um caminhonete e um carro na estrada de acesso à aldeia Ximborendá, à qual pertencia Eusébio Ka’apor, no município de Santa Luzia do Paruá. O carro onde estava a liderança, junto com mais duas pessoas, foi perseguido pelos veículos até a aldeia, onde as pessoas desconhecidas começaram a disparar tiros. A liderança indígena conseguiu escapar no carro. Na mesma semana, dois indígenas foram abordados por três homens armados perto do lugar onde Eusébio Ka’apor foi morto. Os homens teriam dito que trabalhavam com madeireiros que estão desmatando uma área dentro da Terra Indígena, e que se eles reportaram isso para as lideranças indígenas quem estão denunciando a exploração ilegal da madeira, eles iriam invadir sua aldeia e ”matar todos os índios”.
Nos últimos dois anos, as lideranças indígenas Ka’apor têm fortalecido o processo de autofiscalização e vigilância territorial, inclusive sobre a presência de madeireiros ilegais dentro da Terra Indígena. Eles têm criado várias aldeias em pontos estratégicos para proteger o território da invasão de madeireiros. Em março de 2015, as lideranças indígenas conseguiram o fechamento de todos as operações ilegais madeireiras na região. Contudo, nas últimas semanas, após o assassinato de Eusébio Ka’apor, no dia 26 de abril, dois ramais foram abertas por madeireiros, e três das aldeias de proteção tiveram que ser abandonadas pelos indígenas, devido ao aumento das ameaças de morte e intimidações contra eles.
Estas ameaças foram relatadas ao Ministério Público Federal (MPF) e à Polícia civil, porém, até a data, a comunidade Ka’apor afirma que eles não receberam nenhuma proteção do Estado. A polícia federal ainda não abriu inquérito para investigar a morte do Eusébio Ka’apor, nem as ameaças crescentes contra as outras lideranças. Representantes da polícia federal aparentemente continuam a afirmar que a morte de Eusébio Ka’apor não tinha nenhuma relação com a exploração madeireira, e que trata-se de uma tentativa de roubo, apesar de que nenhum dos pertences pessoais, nem a motocicleta que a liderança estava usando, foram roubados.
No seu depoimento ao MPF, um dos filhos de Eusébio contou que foi diretamente abordado por um madeireiro logo após a morte do pai, quando estava chegando ao município de Santa Luzia do Paruá. O homen teria mandado que parasse o carro, no qual transportava o corpo de Eusébio de volta pra aldeia, e disse que ”quem era para morrer era duas outras lideranças (citando os nomes deles)”. No momento, o filho de Eusébio contou que poucas pessoas já sabiam da morte do seu pai. Várias outras lideranças Ka’apor também manifestaram preocupação que nenhum dos madeireiros identificados e citados nos seus depoimentos à polícia, ainda foram interrogados sobre as ameaças.
Front Line Defenders reitera a sua profunda preocupação sobre a falta de uma investigação efetiva pela polícia sobre o assassinato de Eusébio Ka’apor e sobre as graves ameaças e intimidações contra as outras lideranças indígenas da comunidade. Front Line Defenders crê firmemente que a impunidade persistente no caso de Eusébio Ka’apor aumenta ainda os riscos a vida das outras lideranças indígenas Ka’apor.
Front Line Defenders insta as autoridades brasileiras a:
1. Realizar uma investigação imediata, completa e imparcial sobre o assassinato de Eusébio Ka’apor, assim como sobre as ameaças e intimidações contra as outras lideranças Ka’apor, com vistas à publicação dos resultados e a levar os responsáveis à Justiça, de acordo com as normas internacionais;
2. Garantir em todas as circunstâncias que os defensores dos direitos dos povos indígenas no Brasil sejam capazes de realizar as suas atividades legítimas de defesa dos direitos humanos sem medo de represálias e livres de quaisquer restrições.