“Terra pra plantar, café pra colher, o negro trabalha, pra sobreviver”.
(Realidade Negra)
Após inúmeras citações em documentos oficiais do Brasil escravocrata, seguidas de exatamente cem anos de esquecimento, período que vai da Lei Áurea em 1888 à nova Constituição Federal em 1988 (o que corresponde ao primeiro século do Brasil Republicano), o tema Quilombo volta para a pauta do Estado brasileiro, não mais tratando-se de grupos marginais que violam a ordem política e econômica e ameaçam a estabilidade do país, mas como sujeito de direito passível de reparação daquilo que foi o crime da escravidão.
Com o objetivo de diminuir os danos causados aos negros e negras no Brasil, durante o período de escravidão e formal e pós-escravidão, a CF de 1988 assegurou o Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT, promulgado da nova Constituição Federal. Junto com o artigo 68 do ADCT, um conjunto de novos direitos foram assegurados aos negros e negras e a outros grupos que submetidos ao descaso do Estado, para que estes pudessem acessar políticas públicas instituídas, dando-lhes dignidade e condições de reprodução plena de suas vidas.
Mais de 5.000 (cinco mil) quilombos no Brasil resultantes de uma história de séculos de escravidão e resistência a ela são atores legítimos(as) e interessados(as) diretos na efetivação, consolidação e avanços do ponto de vista dessa construção de direitos, a começar pela regularização e segurança de seus territórios historicamente ocupados, pois trata-se de um espaço necessário para a reprodução física, cultural, espiritual e econômica desses grupos, passando por outras dimensões do direito como à saúde, à educação, ao acesso, à moradia adequada, entre outros direitos igualmente relevantes.
Na perspectiva desses avanços, surge há quase duas décadas a CONAQ – Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas, organização presente em 25 (vinte e cinco) Unidades da Federação, prestes a realizar o seu quinto Encontro Nacional, indiscutivelmente, uma das organizações negras de maior expressão na América Latina.
A CONAQ esteve presente em praticamente todos os momentos em que se discutiu a vida dos quilombos nas últimas décadas, seja junto a outros movimentos sociais ou órgãos governamentais, inclusive na construção do decreto 4887/03, já em sua adolescência, é pra nós um filho que marca a nossa história, pois define com clareza os procedimentos para a regularização dos territórios em questão e institui pela primeira vez no país, uma política de Estado voltada especificamente para as comunidades quilombolas, que nada mais é do que a previsão de um conjunto de medidas “coordenadas” para promover dignidade e qualidade de vida para o povo quilombola.
Todavia, na medida em que o país avança e com ele grupos excluídos asseguram direitos, concomitantemente, grupos reacionários emergem da obscuridade. O modelo de desenvolvimento econômico do país pautado na produção de commodities para exportação força a expansão da fronteira agrícola, consequentemente amplia a grilagem no campo, tornando a vida nesse espaço muito mais tensa e insegura e colocando as comunidades tradicionais muito mais expostas às várias formas de violência impostas por um conjunto de forças conservadoras articuladas entre si, representadas majoritariamente pelo agronegócio e seus interesses.
Essa violência vai desde o enfrentamento às armas dos jagunços e milícias ao conservadorismo dos tribunais Brasil afora, onde a todo instante nossos direitos estão sendo violados e nossos parentes violentados.
Nesse histórico dia 19 de março de 2015 a suprema corte do nosso judiciário tem a oportunidade de avançar na luta por reparação ao julgar constitucional em sua integralidade o decreto 4887/03, portanto, improcedente a ADI 3239/04, ação direta de inconstitucionalidade impetrada pelo DEM (Partido Democratas, ex-PFL – Partido da Frente Liberal, representação clássica da direita brasileira) e é isso que em nossa defesa incondicional ao decreto, esperamos das Senhoras Ministras e dos Senhores Ministros do STF – Supremo Tribunal Federal.
“Terra titulada liberdade conquistada e nenhum direito a menos”.
Brasília – DF, 17 de março de 2015.
Assinam esta carta:
- Acteur Sdans Le Monde Agricole et Rural – AMAR – França.
- Articulação de Mulheres Brasileiras – AMB.
- Associação Brasileira dos Pesquisadores Negros – ABPN.
- Associação Coletivista Dom Helder Câmara.
- Associação Cultural Aspiral do Reggae – BA.
- Associação Cultural de Mulheres Negras – ACMUN.
- Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo de Serra do Juá – Caucaia –CE.
- Associação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Maranhão – ACONERUQ/MA.
- Associação das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio de Janeiro – ACQUILERJ.
- Associação das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio de Janeiro – RJ.
- Associação de Afro desenvolvimento Casa Preta.
- Associação de Lavradores da Fazenda Bucoco.
- Associação dos Pequenos Agricultores de Cangurito.
- Associação dos Remanescentes de Quilombo de Nazaré – ARQNA.
- Associação dos Remanescentes de Quilombolas de Santa Rita do Bracuí – Angra dos Reis –RJ.
- Associação dos Trabalhadores em Call Center.
- Associação Nacional das Baianas de Acarajé, Mingau, Receptivos e Similares.
- Associação Quilombola dos Fornos – Conde – BA.
- Associação Remanescente de Quilombolas de Armada.
- Associação Urucungo – Ponto de Cultura Orquestra Sertão de Arcoverde – PE.
- CEDEFES
- Centro de Assessoria Popular Mariana Criola.
- Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis.
- Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará – CEDENPA.
- Centro de Estudos Sociais América Latina – CES – AL.
- Centro de Referência em Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba – CRDH/UFPB.
- Centro Feminista de Estudos e Assessoria – CFEMEA.
- Centro Social Quilombo Maria Conga – Magé – RJ.
- Comissão Espírito-santense de Folclore.
- Comissão Estadual de Articulação das Comunidades Quilombolas de Pernambuco.
- Comissão Estadual dos Quilombos da Paraíba.
- Comissão Estadual dos Quilombos de Pernambuco;
- Comissão Pró-Índio de São Paulo.
- Comunidade Quilombola de Cachoeira – Conde – BA.
- Comunidade Quilombola de Colônia Coqueiro – Esplanada – BA.
- Comunidade Quilombola de Coqueiro – Conde – BA
- Comunidade Quilombola Jurema – Araçás – BA.
- Conselho das Associações Quilombolas do Território Sudoeste do Estado da Bahia.
- Conselho Estadual das Comunidades Quilombolas do Estado da Bahia.
- Conselho Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de Campinas.
- Coordenação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Amapá – CONERQ/AP.
- Coordenação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Mato Grosso do Sul CONERQ/MS.
- Coordenação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Mato Grosso CONERQ/MT.
- Coordenação Estadual das Comunidades Negras de São Paulo;
- Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas – PI – CECOQ.
- Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas de Tocantins.
- Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Espírito Santo “Zacimba Gaba”.
- Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Estado de Alagoas;
- Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Estado de Goiás.
- Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Paraná.
- Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins.
- Coordenação Estadual das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Estado do Ceará – CERQUICE.
- Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE.
- CRIOLA
- Departamento de Sociologia – DS.
- Dignitatis – Assessoria Técnica Popular
- Diosmar Marcelino de Santana Filho (pesquisador e ativista)
- EDUCAFRO
- FASE
- Federação das Comunidades Quilombolas “N’ Golo” de Minas Gerais.
- Federação das Comunidades Quilombolas do Estado do Paraná – FECOQUI/PR.
- Federação das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio Grande do Sul. FACQ – RS.
- Fernando Francisco de Almeida – Conselho de comunidades Quilombolas de Ubatuba-SP.
- Fórum de Mulheres da Amazônia Paraense – FMAP.
- Fórum Estadual de Juventude Negra do Espírito Santo – FEJUNES.
- Ganga Zumba Alagoas;
- Geledés – Instituto da Mulher Negra
- Grupo de Pesquisa Historicidade do Estado e Direito: interações sociedade e meio ambiente – Universidade Federal da Bahia (UFBA).
- Ile Axé Odé Omim Ewá.
- Instituto Comunidade Praia Verde – COPRAV.
- Instituto de Desenvolvimento Afro Norte Noroeste Fluminense – RJ.
- Instituto Elimu Professor Cléber Maciel – ES.
- Instituto Ganga Zumba.
- Instituto Negra do Ceará.
- Instituto Palmares de Promoção da Igualdade
- Instituto Permanente do Afro-Turismo Cultural.
- Instituto Terramar – CE.
- Intersindical – Central da Classe Trabalhadora
- KOINONIA – Presença Ecumênica e Serviço
- Malungos – Coordenação do Estado do Pará;
- Movimento Articulado de Mulheres da Amazônia – MAMA
- Movimento dos Sem Tetos da Bahia.
- Movimento Enraizados.
- Movimento Ibiapabano de Mulheres – CE.
- NEAB-UFES.
- Neimar Lourenço Nascimento dos Santos – Conselheiro de Educação Escolar Quilombola – Secretaria de Educação do Estado de São Paulo.
- Núcleo contra a Desigualdade Racial da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.
- Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba (NCDH/UFPB)
- Núcleo de Estudos e Pesquisas Afrobrasileiros e Indígenas da Universidade Federal da Paraíba (NEABI/UFPB).
- Núcleo de Estudos e Pesquisas Sociais em Desastres – NEPED.
- Núcleo de Estudos em Populações Quilombolas e Tradicionais.
- Observatório dos Conflitos no Campo (OCCA) – Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).
- Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil.
- Polo de Unidade Camponesa.
- Pontão de Cultura do Jongo/Caxambu – UFF.
- Ponto de Cultura Panella de Expressão.
- Programa do Direito Agrário da UFMG.
- Rebeca Campos Ferreira – Antropóloga do Ministério Publico Federal – RO
- Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA).
- Rede das Mulheres de Terreiro de Pernambuco.
- Rede Fulanas/NAB – Negras da Amazônia Brasileira.
- Rede Mocambos.
- Rede Negras Sapatà.
- Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
- Simone Raquel Batista Ferreira – Geógrafa e professora da UFES.
- Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar de Bom Jesus – RN.
- Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Queimada Nova – PI.
- SOS CORPO – Instituto Feminista para a Democracia.
- Tania Pacheco – blog Combate Racismo Ambiental.
- Terra de Direitos.
- Uiala Mukaji Sociedade das Mulheres Negras de Pernambuco.
- União das Costureiras da Bahia.
- Universidade Federal de São Carlos – UFSCar.
- Zélia Lucas do Patrício – Coordenação Nacional de Entidades Negras – CONEN – SP.
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Em tempo:
“A CONAQ agradece imensamente o carinho e dedicação de todos e todas pelo empenho nestas horas para garantirmos as assinaturas da Carta Aberta. Amanhã é um dia decisivo para nossa luta quilombola, esperamos sair vitoriosos desta batalha.”
– Em defesa de direitos sociais, através de ações afirmativas. Entendemos que o mundo mudou porém uma grande parte da população afro brasileira, ainda tem suas mentes aprisionadas ao modelo escravocrata que deu origem ao nosso país.
Vamos pensar de forma simplista; que ninguém dá nada p/ ninguém, principalmente se o que pleiteamos possui um valor material e real, a ONG Família Brasil só consegue efetivar a defesa de direitos para qualquer família quilombola ou não, que realmente tenham consciência exata de seus valores e por quais direitos na prática esperam ver se cumprir em suas vidas.
contraria a açaõ