Terras quilombolas são demarcadas a passos lentos durante os três últimos governos

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Adital*

Às vésperas do Dia da Consciência Negra, comemorado na última quinta-feira, 20 de novembro, o Governo de São Paulo anunciou o reconhecimento das comunidades quilombolas de Abobral da Margem Esquerda, Engenho, Bombas e Aldeia, no Vale do rio Ribeira, no sul do Estado. Abobral da Margem Esquerda e Engenho ficam no município de Eldorado, Aldeia, no município de Iguape e Bombas, no município de Iporanga e abrigam 86 famílias no total.

De acordo com o Instituto Socioambiental (ISA), o reconhecimento territorial é um passo importante na luta pela titulação da terra, quando o Estado reconhece que o território existe e que a comunidade que lá vive tradicionalmente ocupa e usa o espaço territorial, ligado às suas tradições e ancestralidade. Tanto pode ser feito por meio da Portaria de Reconhecimento do Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] ou do Relatório Técnico Científico (RTC) no caso do Itesp [Instituto de Terras de São Paulo]. Esse status garante aos quilombolas assistência técnica do Itesp e benefícios como obras de infraestrutura, recebimento de insumos e materiais para fomentar a produção. “No entanto, os processos fundiários para reconhecimento e posterior titulação têm sido cada vez mais lentos. Das quatro comunidades reconhecidas no último domingo, o caso mais ilustrativo de demora e de conflitos de sobreposição com unidades de conservação é a comunidade quilombola de Bombas”, destaca a entidade.

A falta e a demora na regularização fundiária continuam sendo as demandas principais das comunidades quilombolas que, muitas vezes, têm suas práticas tradicionais, como os plantios de roça e as atividades de renda limitadas em função da ocupação por terceiros (fazendeiros, posseiros que ainda não foram indenizados); e da sobreposição com Unidades de Conservação. Atualmente, o Estado de São Paulo tem 32 comunidades remanescentes de quilombos reconhecidas, sendo 25 no Vale do Ribeira. Destas, seis foram tituladas em terras públicas estaduais. Segundo dados do Itesp 66 comunidades identificadas no Estado aguardam reconhecimento.

No Brasil

Em nível nacional, o primeiro mandato da presidenta Dilma Rousseff [do Partido dos Trabalhadores – PT] está chegando ao seu fim sem que se registre qualquer mudança no ritmo lento de titulações de terras quilombolas, que marcou também a gestão de seus antecessores, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Fernando Henrique Cardoso (Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB). Até 13 de novembro, Dilma havia titulado apenas nove terras, todas parcialmente. No Incra, aguardam por conclusão mais de 1.400 processos.

Mais um governo que pouco avançou na efetividade do direito dos quilombolas às suas terras. Atualmente, 140 terras quilombolas, onde vivem 229 comunidades, estão tituladas, sendo que parte delas apenas parcialmente. Nas áreas regularizadas, encontram-se 12.428 famílias, o que representa 5,8% das 214.000 famílias que a SEPPIR [Secretaria de Políticas Públicas para a Igualdade Racial da Presidência da República] estima ser a população quilombola no Brasil.

Os estados com maior número de territórios quilombolas titulados são o Pará (54 terras) e Maranhão (52). O Instituto de Terras do Pará (Iterpa) titulou 46 terras e no Maranhão todas foram regularizadas pelo Instituto de Colonização e Terras do Maranhão (Iterma).

Entenda os procedimentos da titulação das terras quilombolas.

Os complexos caminhos que envolvem a desapropriação de imóveis incidentes nos territórios quilombolas explicam em parte a demora na finalização dos processos e também a emissão de títulos parciais outorgados à medida que os acordos com os diferentes proprietários ocorrem (em uma mesma terra quilombola podem incidir diferentes imóveis). As crescentes contestações judiciais dos processos em diferentes fases também constituem outro obstáculo na efetivação das titulações.

Mas esses fatores por si só não explicam porque 88% dos 1.462 processos em curso no Incra ainda não ultrapassaram a fase inicial de identificação do território a ser titulado, a partir da qual se abre o período de contestação.

A agilização dos estudos e dos levantamentos necessários à identificação dos territórios quilombolas demanda uma estrutura muito maior do que a atual. Embora seja inegável que nos últimos anos houve um fortalecimento do “setor quilombola” do Incra, com contratação de profissionais, este ainda está muito aquém do necessário para impulsionar o andamento dos processos.

E não se pode deixar de lembrar dos processos cujo os relatórios de identificação estão prontos, tecnicamente aprovados, mas que não são publicados – algo semelhante ao que ocorre com as terras indígenas. Questões políticas de diferentes ordens vêm emperrando essas publicações.

É o que ocorre com relatórios das comunidades de Oriximiná, no Pará, que não são publicados pois as áreas de tais comunidades estão sobrepostas à Unidades de Conservação. Contrariando a norma que estabelece que os relatórios devem ser publicados e depois então consultados os demais órgãos, há mais de um ano o Incra segura a publicação em busca de um entendimento com o Ministério do Meio Ambiente.

Mais informações na Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP).

*Com informações do ISA e da CPI-SP.

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